12 Abril 2018
Emmanuel Macron frequentou a escola jesuíta, pediu para ser batizado quando tinha doze anos e se formou intelectualmente com o filósofo protestante Paul Ricoeur. Mesmo mantendo-se discreto sobre sua fé, como exige a tradição republicana francesa, tem uma familiaridade com a religião. O Presidente não mantém um ostensivo distanciamento como o seu antecessor, François Hollande, ateu convicto, e nem expressa os impulsos de fervorismo católico de Nicolas Sarkozy.
O comentário é de Anais Ginori, publicado por La Repubblica, 11-04-2018. A tradução é de Luisa Rabolini.
Macron está convencido de que a lei de 1905, que separou a Igreja do Estado, tem sido manipulada nos últimos anos, diante do poderoso retorno do fator religioso nas nossas sociedades secularizadas. O primeiro artigo afirma: “A República garante o livre exercício do culto". E logo especifica: "A República não reconhece ou subsidia qualquer culto". O texto foi usado, dependendo do momento e dos governantes em exercício, tanto por aqueles que pensam que não há lugar no debate público para as instâncias dos crentes e representantes do culto, como por aqueles que exigem um maior reconhecimento dos símbolos e práticas religiosas.
Macron aguardou um tempo para esclarecer a sua posição sobre o secularismo. Seu discurso programático sobre o tema foi várias vezes anunciado, e depois adiado. Desde que foi eleito, ele sugeriu fazer um acordo com o Islã da França, antes de mudar de ideia. O líder francês continuou a refletir, consultar-se com especialistas sobre como aliviar as tensões e atualizar uma lei aprovada mais de um século atrás. Em dezembro último convidou ao Elysée representantes das principais confissões, organizou jantares com intelectuais para falar das fronteiras da bioética, reuniu-se com mulheres que representam uma nova liderança religiosa, como a rabino Delphine Horvilleur ou a imã dinamarquesa Sherin Khankan.
O secularismo segundo Macron finalmente foi um pouco melhor explicado na noite da última segunda-feira, em um longo discurso perante a Conferência Episcopal. "Como chefe de Estado – explicou diante dos bispos - sou o garantidor da liberdade de crer e não crer, mas não sou nem o inventor nem o promotor de uma religião de Estado que substituiria a crença republicana pela transcendência divina".
Macron reconheceu as raízes cristãs da Europa e prometeu, entre outras coisas, "reparar" a relação entre a Igreja e o Estado que, em sua opinião, foi "deteriorada" por causa de "equívocos" e "desconfiança mútua". A referência à esquerda que governou antes dele é por demais evidente, mesmo que não explícita. Os socialistas chegaram ao poder fazendo aprovar a lei sobre o casamento para todos e enfrentando um movimento que levou milhões de católicos às ruas como não se via mais desde os protestos contra as subvenções para as escolas particulares.
Os pontos de atrito com a Igreja foram muitos nos últimos cinco anos, começando com a nomeação do embaixador no Vaticano, cargo deixado vago após as polêmicas em torno da homossexualidade assumida do diplomata proposto por Paris. As fotografias de um Papa Francisco insolitamente sério e mal-humorado ao lado de François Hollande ainda estão na memória de muitos. Macron ainda não organizou a sua primeira visita ao Vaticano, mas está claramente trabalhando para consertar o problema com a Santa Sé. A esquerda chamada diretamente em causa não tive dificuldade em atacar a falta de neutralidade do chefe de Estado que, segundo alguns expoentes, tem "pisado" na famosa lei de 1905.
Provavelmente a iniciativa diante da Conferência Episcopal também tem um intuito eleitoral, afastando a direita e o Front National há tempo competindo pelo voto católico.
Mas, em seu programa está prevista a aprovação ainda este ano da lei sobre procriação assistida para casais homossexuais que ameaça abrir um novo confronto com a Igreja.
Será um equilíbrio difícil de ser encontrado para o líder francês. Quando, durante a homenagem ao cantor Johnny Hallyday, alguém lhe entregou o aspersório com água benta para abençoar o caixão, o presidente começou a fazer o gesto. Foi uma reação automática, logo interrompida. Ele por fim colocou apenas uma mão sobre o caixão, num gesto totalmente republicano.
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O secularismo segundo Macron - Instituto Humanitas Unisinos - IHU