16 Março 2018
O vazamento de resíduos tóxicos pela empresa Hydro Alunorte, no município paraense de Barcarena, expõe os enormes riscos socioambientais por trás do projeto de lei 3729/2004, prestes a ser votado pelos deputados, que propõe a flexibilização do processo de licenciamento ambiental. Os graves impactos ambientais causados pelo desastre foram expostos em audiência pública nesta terça (13/3), na Câmara, evidenciando que, se os procedimentos para licenciar empreendimentos forem afrouxados, tragédias como a de Barcarena (PA), Santo Antônio do Gama e Mariana (MG), poderão se multiplicar.
A reportagem é de Bruno Taitson e Warner Bento Filho, publicado por WWF, 13-03-2018.
O deputado federal Arnaldo Jordy (PPS-PA), presente à audiência, lembrou que, somente em Barcarena, foram 11 vazamentos entre 2009 e 2018 e classificou como “retrocesso” o PL 3729/2004. “Nosso desafio é avançar para aperfeiçoar o rigor dos licenciamentos, e não retroagir no sentido de afrouxar ainda mais o processo. Se, do jeito que está a lei, estamos vivenciando situações dessa gravidade, imagine se forem afrouxados os licenciamentos”, criticou.
“Eu estou assustado com a possibilidade de aprovarem esse projeto”, disse o deputado Edmilson Rodrigues (Psol-PA), que organizou a audiência dessa terça. “Esse PL do licenciamento virou uma tara da bancada ruralista. E o presidente Maia assumiu isso sem qualquer discussão com a sociedade, com as instituições ambientais, governamentais ou não governamentais. Dentro do governo há uma guerra, porque o Ministério do Meio Ambiente e o Ibama têm posição muito crítica em relação às medidas que se expressam no relatório do deputado Mauro Pereira”, disse. “Com todo o respeito ao deputado, o que ele propõe é uma violência, um crime contra o futuro do Brasil. Por que destruir esse arcabouço de normas?”, questionou.
O parlamentar negou que haja acordo com a bancada ambientalista para a aprovação do projeto. “Não sei que ambientalista faria um acordo com Rodrigo Maia sobre isso. Tudo tem limite. Essa proposta é tão criminosa que um ambientalista que faça acordo sobre isso perderá totalmente o meu respeito e, tenho certeza, o respeito da sociedade brasileira”, completou.
Durante a audiência, o pesquisador Marcelo Oliveira Lima, do Instituto Evandro Chagas (IEC), cuja equipe chegou ao local horas depois do vazamento, relatou a magnitude dos impactos ambientais. A vistoria feita pelo IEC avaliou efluentes na área da empresa, na saída de um dos tubos que vazou e em cursos d’água a distâncias de até dois quilômetros das instalações e o resultado não deixa dúvida: os resíduos têm em todas as amostras, o mesmo padrão químico, com a presença de metais pesados, dentre eles o chumbo, contaminando vastas áreas.
“São práticas inaceitáveis em qualquer parte do mundo, que atingiram populações que usam os rios para recreação, pesca e como fonte de água. Depois de tudo, deveriam ter pedido desculpas à sociedade paraense e isso não ocorreu”, avaliou Marcelo Lima.
“Nossa legislação é muito benevolente”, disse o promotor de justiça de Barcarena, Laércio Abreu, que participou da audiência pública e criticou o processo de licenciamento da bacia de onde haveria vazado o material tóxico. Abreu defende a necessidade de um novo processo completo de licenciamento, com audiências públicas, estudo de impacto ambiental e relatório de impacto ambiental.
Pelas alterações propostas no PL de Mauro Pereira, essas regras também seriam flexibilizadas, dando ao Estado a possibilidade de simplificar o processo e reduzir as exigências. Outro problema grave constatado na região foi o não-licenciamento do chamado distrito industrial de Barcarena, onde se localiza a planta da Hydro Alunorte. Ronaldo Lima, secretário-adjunto da Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (Semas), admitiu a situação de inconformidade. “Realmente estamos atrasados”, reconheceu. Ainda segundo o representante da Semas, não houve rompimento de barragem em Barcarena, e sim de um duto, bem como a utilização de um canal antigo, sem autorização, procedimentos que geraram aplicação de multas pelo órgão.
Fonte: Revista Espacios
De acordo com a última versão divulgada ao público do substitutivo de Mauro Pereira, seria dispensada do licenciamento a ampliação de empreendimentos já licenciados com previsão de ampliação (art. 7º, V). Isso faria com que as próximas instalações de novos depósitos de rejeitos em empreendimentos minerários já em operação ocorram sem qualquer estudo de impacto ou adoção de medida de mitigação.
A representante do Ibama, Fernanda Perillo, alegou que o processo de licenciamento não estaria sob responsabilidade do governo federal, mas do governo do estado. “A licença desse empreendimento não é do Ibama. Agimos pelo risco de rompimento da barragem. Nossa intenção agora é encerrar nossa participação. Não é nosso papel auditar o licenciamento dado pelo estado”, disse.
O representante da Hydro Alunorte, Sílvio Porto, negou que tenha havido transbordamento das bacias de contenção de rejeito. “Não vazou nada dos depósitos de resíduos sólidos, o que seria realmente muito grave. Houve situações pontuais cujos impactos estamos avaliando”, disse. Porto também responsabilizou a chuva . “Foram chuvas excepcionais”, justificou.
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Desastre no Pará evidencia perigos de flexibilizar licenciamento - Instituto Humanitas Unisinos - IHU