19 Outubro 2017
"A Teologia da Libertação dos 'velhos' e dos novos é como uma semente que representa a 'força dos pequenos', lema do encontro. Essa semente não morreu. Continuará viva enquanto houver um único ser humano oprimido que gritar por liberação" escreve Leonardo Boff, escritor, teólogo e filósofo.
Sempre que se celebra um Foro Social Mundial, três dias antes, acontece também um Foro Mundial da Teologia da Libertação. Participam mais de duas mil pessoas de todos os Continentes (Coreia do Sul, vários países de Africa, dos EUA, da Europa e de toda a América Latina) que praticam em seus trabalhos este tipo de teologia. Ela implica sempre ter um pé na realidade da pobreza e da miséria e outro pé na reflexão teológica e pastoral. Sem esse casamento não existe Teologia da Libertação que mereça esse nome.
De tempos em tempos, fazemos nossas avaliações. A pergunta primeira é: como está o Reino de Deus aqui em nossa realidade contraditória? Onde estão os sinais do Reino em nosso Continente, mas também na China, na África crucificada, especialmente no meio dos pequenos de nossos países? Perguntar pelo Reino não é perguntar como está a Igreja, mas como vai o sonho de Jesus, feito de amor incondicional, de solidariedade, de compaixão, de justiça social, de abertura ao Sagrado e que centralidade se confere aos oprimidos? Esses e outros valores constituem o conteúdo do que chamamos Reino de Deus, a mensagem central de Jesus. O nome é religioso mas seu conteúdo é humanístico e universal. Ele veio nos ensinar a viver esses valores e não simplesmente transmitir-nos doutrinas sobre eles.
Igualmente, quando se pergunta como está a Teologia da Libertação a resposta está contida nesta pergunta: como estão sendo tratados os pobres e os oprimidos, as mulheres, os desempregados, os povos originários, os afro-descendentes e outros excluídos? Como entram na prática libertadora dos cristãos? Releva enfatizar que o importante não é a Teologia da Libertação mas o fato da libertação concreta dos oprimidos. Esta é uma presença do Reino e não a reflexão que se faz.
Entre os dias 12-14 de outubro, em Puebla no México, ocorreu um encontro de uns 50 teólogos e teólogas, vindos de toda a América Latina. Foi organizado por Ameríndia que é uma rede de organizações e de pessoas comprometidas com os processos de transformação e de libertação de nossos povos. Esta diligência, feita em chave cristã e crítica, analisa o momento histórico em que vivemos, numa perspectiva holística, enfatizando os conteúdos místicos/proféticos e metodológicos da Teologia da Libertação, feita a partir dessa realidade.
Aí estavam alguns dos “pais fundadores” deste tipo de teologia (começos dos anos de 1970), todos entre 75-85 anos que se encontravam com a nova geração de jovens teólogos (indígenas entre eles) e teólogas (algumas negras e indígenas). Num sentido profundamente igualitário e fraterno, queríamos identificar novas sensibilidades, novos enfoques e maneiras de processar esse tipo de teologia que dignidade atribuímos aos que não contam e são feitos invisíveis em nossa sociedade de cunho neoliberal e capitalista.
Ao invés de palestras – houve apenas duas introdutórias na abertura – preferiu-se trabalhar em mesas redondas, em pequenos grupos e trocas em mutirão. Desta forma todos podiam participar num enriquecimento fecundo. Havia teólogos/as que trabalham no meio de indígenas, outros nas periferias pobres das cidades, outros a questão de gênero (como superar relações de poder desigual entre homens e mulheres) em toda uma região, outros eram professores e pesquisadores universitários mas organicamente vinculados aos movimentos sociais. Todos vinham de experiências fortes e até perigosas, especialmente na América Central com os cartéis do narcotráfico, os desaparecimentos, os “marras” (crime organizado de jovens violentos) e a violência policial. Todos os trabalhos foram transmitidos pela internet e havia milhares de seguidores em todo o Continente.
Não se pode resumir a densidade reflexiva de três dias de trabalho intenso Mas ficou claro que há varias formas de entender a realidade (epistemologias), seja dos povos originários, seja dos afro-descendentes seja de homens e de mulheres, seja de marginalizados e de integrados. Para todos era evidente que não se pode resolver o problema dos pobres sem a participação dos próprios pobres. Eles devem ser os sujeitos e protagonistas de sua libertação. Nós nos dispomos a ser aliados e força secundária.
A Teologia da Libertação dos “velhos” e dos novos é como uma semente que representa a “força dos pequenos”, lema do encontro. Essa semente não morreu. Continuará viva enquanto houver um único ser humano oprimido que grita por libertação.
Recordamos o poema de Pablo Neruda:”Como sabem as raízes que devem subir à luz e saudar o ar com flores e cores”? Com Dostoievsky e com o Papa Francisco também cremos que, no fundo, é a beleza que salvará o mundo, fruto do amor à vida e àqueles que injustamente menos vida têm.
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A força dos pequenos: a Teologia da Libertação - Instituto Humanitas Unisinos - IHU