10 Dezembro 2016
Área não virou pasto nem foi usada em agricultura; especialistas denunciam especulação imobiliária.
A reportagem é de Cleide Carvalho, publicada por O Globo, 06-12-2016.
A Amazônia voltou a ser a região do mundo que mais suprime florestas, nos últimos dois anos. O desmatamento ocorre em áreas públicas não destinadas, que pertencem à União, mas não são usadas e nem foram protegidas. A cada 24 horas, 2.160 hectares de florestas são desmatados, o equivalente a 2.160 campos de futebol por dia.
Pior: a área desmatada não tem sido usada para atividades produtivas. Dos quase 762.464 km² já desmatados, apenas 5,9% são usados para agricultura e 49,6% são pastos de ativos de criação de gado, segundo dados do projeto TerraClass, destinado a qualificar o desmatamento na Amazônia Legal. As áreas urbanizadas ou com moradia humana representam menos de 1% dos espaços desmatados, apenas 0,8% do total.
As informações foram divulgadas no Simpósio Amazônia Sustentável, organizado pela Rede Amazônia Sustentável, que reúne cientistas e representantes da sociedade civil nesta terça-feira em Belém, no Pará.
— Entre 2004 e 2014, o Brasil desmatou pelo menos 7 milhões de hectares à toa. Isso significa metade de tudo que foi desmatado no período — afirma Tasso Azevedo, do Observatório do Clima.
Enquanto se desmatava, 14,8 milhões de hectares, as áreas abandonadas, que apresentam crescimento de vegetação rasteira, cresceram em cerca de 7 milhões de hectares entre 2004 e 2014, alcançando 173 mil km². Nada menos do que 13,4% da área desmatada é formada por pastos abandonados ou não usados.
Mauro Lúcio Costa, ex-presidente do Sindicato de Produtores Rurais de Paragominas, um dos municípios verdes do Pará que conseguiu conter o ritmo do desmatamento, afirma que é preciso fiscalizar a manutenção da reserva legal.
— Cheguei ao Pará há 41 anos e até hoje quem não tem reserva legal trabalha normalmente, sem ser incomodado. E são muito mais ricos do que eu, que cumpri a lei. A ilegalidade gera muito dinheiro e é preciso que haja penalidade para quem age ilegalmente — diz Costa.
Azevedo, do Observatório do Clima, lembra também que as terras já usadas pela pecuária são improdutivas, com menos de um boi por hectare. Na agricultura também é preciso conquistar ganhos, já que a maioria dos produtores conseguem fazer apenas uma safra por ano, enquanto em outros estados são duas safras anuais.
— Ninguém desmata para não ganhar nada. Há um ganho imobiliário que precisa ser combatido ou não vamos chegar a lugar algum — diz Costa, que defende a criação de mais áreas protegidas na Amazônia para evitar o avanço do desmatamento.
Costa explica que o desmatamento existe porque ocupar áreas ilegalmente na Amazônia é um excelente negócio, sem qualquer fiscalização.
— Um hectare de floresta nativa custa R$ 200 em São Felix do Xingu, por exemplo. A pessoa gasta R$ 1.200 para desmatar e ocupar e, em dois anos, recupera o gasto e passa a ser dono da área. Todo mundo sabe onde começa a fazenda de um e de outro — conta o pecuarista.
Se fosse comprar um hectare de fazenda regularizada, o preço por hectare chegaria a R$ 5 mil ,25 vezes mais. É a chamada especulação imobiliária que, segundo Justiniano Neto, secretário do Programa Municípios Verdes do Pará, tem sido financiada por grandes capitais e precisa ser contida com ações policiais.
Segundo Tasso Azevedo, no último ano 60% do desmatamento em Rondônia, por exemplo, ocorreu em áreas rurais que não têm Cadastro Ambiental Rural, obrigatório a todos os proprietários rurais,e deveriam simplesmente ser embargadas.
—Temos que ter atitudes impiedosas e mostrar que não é possível compactuar com isso.
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Em 10 anos, Brasil desmatou à toa 7 milhões de hectares de floresta amazônica - Instituto Humanitas Unisinos - IHU