04 Novembro 2015
Um ex-funcionário do Vaticano, que foi retirado de seu cargo no começo deste mês após reconhecer publicamente que era gay e que mantinha um relacionamento amoroso, renovou nesta quarta-feira (28 de out.) a sua crítica à Igreja Católica de Roma, acusando-a de homofobia.
A reportagem é de Gaia Pianigianioct, publicada por New York Times, 29-10-2015. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
O funcionário, Rev. Krzysztof Charamsa, tornou pública uma carta enviada ao Papa Francisco, datada de 3 de outubro, na qual denuncia a Igreja, dizendo que ela transformou a vida dos gays e transgêneros “num inferno”. O religioso escreveu que a Igreja persegue os católicos gays e que tem causado a eles e as suas famílias um “sofrimento imensurável”.
“Seja misericordioso – no mínimo deixe-nos em paz, deixe os Estados civis tornarem as nossas vidas mais humanas”, escreveu Charamsa na carta.
O sacerdote, de 43 anos, ex-funcionário polonês na Congregação para a Doutrina da Fé – CDF, já havia feito tais declarações antes. Neste mês, na véspera do Sínodo (assembleia dos bispos de todo o mundo) ele anunciou, na imprensa italiana e polonesa, e depois numa coletiva de imprensa em um restaurante na região central de Roma, que era gay e que tinha um parceiro.
Falou da “homofobia frequentemente paranoica” na Igreja e afirmou que muitos funcionários católicos são gays.
Dentro de horas, o Vaticano emitiu uma nota concisa chamando de “irresponsável” a sua decisão em assumir [a homossexualidade] logo antes do Sínodo. O Vaticano também demitiu, imediatamente, Charamsa da CDF e das universidades pontifícias onde ele lecionava Teologia.
Em seguida, a sua diocese na Polônia o suspendeu indefinidamente de suas funções sacerdotais, instando-o a retornar ao “verdadeiro ensino da Igreja e ao sacerdócio de Cristo”. Os sacerdotes católico-romanos fazem votos de vida celibatária. No documento final produzido pelos bispos no Sínodo, o qual foi apresentado a Francisco para a sua consideração, os bispos reiteraram a postura da Igreja de que os gays devem ser respeitados, evitando “qualquer sinal de discriminação injusta”. Os bispos reiteraram, porém, que o matrimônio homoafetivo não era aceitável e que não possuía, no plano de Deus sobre o matrimônio e a família, nenhum fundamento “remoto”.
O Pe. Charamsa, que está escrevendo um livro sobre os seus anos no Vaticano, disse na quarta-feira também que o Sínodo havia dado um passo para atrás nas questões a respeito dos gays e transgêneros.
“O fechamento homofóbico do Sínodo quanto aos gays ressuscitou a minha paixão por esta batalha em trazer a Igreja para dentro da idade moderna”, disse ele em uma entrevista via Skype direto de Barcelona, onde vive com o seu parceiro. “Foi por isso que tornei pública a minha carta ao Santo Padre, na esperança de que ele possa ir além do Sínodo nesta questão”.
Ao criticar o documento final do Sínodo por repetir os estereótipos em torno da homossexualidade, Charamsa salientou as palavras do Cardeal Robert Sarah, de Guiné, que disse aos bispos: “As ideologias homossexuais e abortistas ocidentais e o fanatismo islâmico são hoje em dia o que o nazifascismo e o comunismo foram no século XX”.
“É por isso que eu renovo o meu apelo ao Santo Padre”, disse Charamsa na entrevista. “Ninguém publicamente disse uma palavra contra estas afirmações difamatórias. Que tipo de respeito algo assim demosntra?”
Charamsa disse ainda que a Igreja deveria garantir a igualdade matrimonial a todos os católicos e revisar o seu ensinamento sobre a homossexualidade. “Se a Igreja não consegue fazer uma reflexão séria, científica sobre a homossexualidade e incluí-la em seus ensinamentos”, disse, “até mesmo as palavras de abertura e calorosas do Santo Padre sobre os gays são vazias”.
Francisco parece ter uma abordagem mais aberta para com a homossexualidade em comparação aos seus antecessores. Ficou famosa a sua fala de que ele não julga as pessoas com base na orientação sexual, e durante a sua recente visita aos Estados Unidos, o pontífice se encontrou em privado com um ex-aluno que é gay e que estava acompanhado de seu parceiro.
Diferentemente do Pe. Charamsa, alguns ativistas gays dizem ver os resultados do Sínodo deste de uma forma mais esperançosa, citando o que consideram como aspectos positivos do documento final.
“Os bispos escreveram que as famílias com membros com tendências homossexuais precisam de um acompanhamento particular, e isso, na linguagem católica, implica uma abertura para se considerar famílias homoafetivas, em que seus membros são homossexuais ou lésbicas”, falou Andrea Rubera, porta-voz em Roma para a Rede Global de Católicos Arco-Íris, organização internacional de associações católicas que contam com lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros.
“Precisamos trabalhar com, e não contra, a Igreja”, acrescentou.
Charamsa, no entanto, rejeitou todo e qualquer compromisso, dizendo que ao ignorar as pessoas gays, lésbicas e transgêneras, a Igreja está pedindo aos fiéis para crerem que a terra ainda é plana.
Perguntado se gostaria de se casar com o seu parceiro, o Pe. Charamsa disse: “Não vejo nenhuma dificuldade em um sacerdote se casar, e isso independentemente de sua orientação sexual”.
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Sacerdote gay que perdeu emprego no Vaticano ataca a Igreja em carta ao Papa Francisco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU