Donos das big techs na posse de Donald Trump em 20 de janeiro de 2025
Em The Age of Extraction: How Tech Platforms Conquered the Economy and Threaten Our Future Prosperity (A era da extração: como as plataformas tecnológicas conquistaram a economia e ameaçam a nossa prosperidade futura), o professor, advogado e ex-assessor da Casa Branca, Tim Wu, traça a emergência das plataformas tecnológicas, como elas acumularam o poder que exercem hoje e por que devemos combatê-las.
Algoritmos opacos, publicidades intrusivas, fluxos contínuos que prejudicam a nossa saúde mental… A internet está muito longe do que os geeks utópicos da web inicial imaginaram. No entanto, não podemos viver sem ela. Como chegamos a este ponto? É isso que Tim Wu explora em seu novo livro, The Age of Extraction (Penguin Random House).
Professor de direito na Universidade Columbia, ex-conselheiro de Joe Biden e renomado por ter idealizado a neutralidade da rede em 2003, Wu é especialista em monopólios e sua regulamentação e tem acompanhado de perto a lenta transição das principais plataformas que concentram a maior parte da nossa atividade on-line para a Web 2.0. Sua convicção é que as empresas GAFAM não existem mais para servir seus usuários, mas os usarão para expandir seu poder político e econômico o máximo possível. A solução para conter essa expansão assustadora? Implementar medidas antitruste tão agressivas quanto as que estão sendo aplicadas.
A entrevista é de Claire Roussel, publicada por Usbek & Rica, 05-12-2025. A tradução é do Cepat.
No início do seu livro, você relata o otimismo generalizado em torno da tecnologia há 30 anos. Estamos muito longe disso hoje. Por quê?
Esta é uma das perguntas que me motivou a escrever este livro: o que aconteceu com as promessas das décadas de 1990 e 2000? Pensávamos que a internet seria essa força libertadora que permitiria que todos fossem ricos, todas as sociedades fossem democráticas, todos se expressassem criativamente… Isso explica o apelo que as plataformas tiveram: elas surgiram como catalisadoras ou anfitriãs, para fornecer espaços onde as pessoas pudessem se conectar com outras pessoas.
Mas a principal diferença hoje, por exemplo, em relação aos marketplaces na França, que são plataformas públicas, é que, na era da internet, essas plataformas são privadas, gerenciadas por empresas do Vale do Silício. Aos poucos, essas empresas decidiram que precisavam extrair mais dinheiro, dados, tempo e recursos. Nosso erro colossal foi confiar nos fundadores dessas plataformas. Essa é a raiz do problema da nossa época.
Você analisa como essas plataformas passam metodicamente de facilitadoras a extratoras…
De fato, existe uma estratégia identificável. O primeiro passo é se estabelecer como essencial: capturar vendedores e consumidores, tornando-se o intermediário indispensável. O segundo passo é a eliminação dos rivais, através de aquisições (como o Google fez com o Waze, que competia com o Maps) ou desafiando a concorrência com preços baixos. O terceiro passo é replicar o sucesso dos vendedores mais populares em sua plataforma, criando seus próprios produtos e promovendo-os com mais destaque. É o que a Amazon faz. O quarto passo é tornar extremamente difícil deixar a plataforma.
Finalmente, quando todos ficam reféns das plataformas por serem tão práticas e não haver outras opções aparentes, começa a extração: as taxas para os vendedores aumentam, os dados dos usuários são cada vez mais explorados, as assinaturas ficam mais caras… Essa tem sido a história dos últimos dez anos.
Tudo isso é possível graças aos monopólios de certas empresas. No entanto, os Estados Unidos implementaram leis antitruste e o Estado não hesitou em intervir no século XX para impedir a concentração na indústria da tecnologia. Você menciona que o Departamento de Justiça, por exemplo, forçou a IBM a abandonar suas práticas de dissuasão da concorrência no final da década de 1960, permitindo o surgimento de uma indústria que, de outra maneira, teria sido absorvida por aquela única empresa. O que mudou?
A partir da década de 1980, durante o governo Reagan, os Estados Unidos negligenciaram suas leis antitruste. Na década de 2010, quando eu era consultor do governo, elas estavam muito enfraquecidas. Tão enfraquecidas, aliás, que quando o Facebook adquiriu seu concorrente direto, o Instagram, isso foi permitido! Os Estados Unidos passam por ciclos de poder público e privado, em que o governo é muito agressivo e regula suas empresas, para depois recuar e deixar de agir. Analiso esses ciclos no meu livro anterior, The Curse of Bigness (A maldição do gigantismo), que defende a revitalização das políticas antitruste, algo que tentei promover durante a presidência de Biden.
Para moderar esses monopólios, você acredita especialmente que devemos estabelecer uma separação entre as empresas GAFAM e as empresas que desenvolvem IA.
Acredito que a IA seja uma grande potência da nossa época. Para mim, uma das piores coisas que poderia acontecer seria se a inteligência artificial se tornasse um meio de fortalecer os monopólios existentes. Isso poderia tornar as empresas GAFAM soberanas. Por exemplo, se permitirmos que o Google adquira a OpenAI (a Microsoft quase o fez), isso significaria concentrar um poder imenso em pouquíssimas mãos. Não podemos permitir que isso aconteça.
Isso ecoa o que Montesquieu, cuja obra admiro, defendia: ele acreditava que uma república só pode sobreviver com poderes separados. Ele se referia aos poderes judiciário, executivo e legislativo, é claro, mas hoje também enfrentamos poderes econômicos que devem permanecer separados.
Considerando o contexto político dos Estados Unidos, como você vê a evolução da situação dessas plataformas e de seu poder?
É muito nebuloso… Depende se Trump é realmente um populista ou se apenas alegou querer “enfrentar as elites” para conquistar os menos favorecidos. Em teoria, seu governo tem um sólido programa antitruste. Os democratas começaram isso, mas vamos esperar para ver qual será o desfecho da série de processos em andamento contra Google, Amazon, Facebook e Apple…
Um cínico poderia dizer: “As grandes empresas de tecnologia conseguirão o que querem dando milhões ao presidente para que retire as acusações”. Mas até mesmo Trump está ciente de que a ala populista do Partido Republicano, a ala MAGA, pode se voltar contra ele. Eles já estão fazendo isso com os casos Epstein e podem continuar, caso ele quiser retirar todas as acusações contra as grandes empresas de tecnologia. Penso que isso poderia inspirar uma revolta contra ele.
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Cinco pistas para regular as plataformas, segundo Tim Wu:
1. Reduzir os monopólios, o que, segundo Wu, também permite o surgimento de uma concorrência saudável entre as empresas.
2. O estabelecimento da “neutralidade das plataformas”, proibindo que as plataformas selecionem determinados atores comerciais e lhes deem tratamento preferencial em detrimento de outros.
3. Proteção reforçada dos “poderes de contrapeso”, que Wu distingue em duas categorias: “detentores de informações úteis”, que possuem os dados necessários para a expansão da plataforma (artistas, veículos de mídia plagiados por IA, etc.), e trabalhadores apoiados por sindicatos fortes, essenciais para combater práticas trabalhistas exploratórias.
4. Limites, a serem usados “apenas como último recurso”. Wu propõe que uma plataforma essencial, porém extrativista, seja tratada como um serviço público e sujeita a limites rígidos sobre o que pode extrair do restante da economia. Semelhante às empresas de fornecimento de eletricidade, que seguem tarifas estabelecidas pelo Estado para a cobrança dos consumidores.
5. “Limites de domínio”, o que significa a proibição de determinadas empresas operarem em múltiplos setores. Por exemplo, a Amazon poderia atuar como um marketplace, mas não como uma marca, e não teria mais permissão para competir com outros vendedores vendendo seus próprios produtos em sua plataforma. Outro exemplo, já mencionado, é a proibição de as empresas GAFAM desenvolverem ou adquirirem negócios relacionados à inteligência artificial.