09 Janeiro 2025
A data de 20-01-2025 marcará o fim simbólico do neoliberalismo global. Seus dois componentes desapareceram. O globalismo foi transformado em nacionalismo, e o neoliberalismo aplica-se apenas à esfera econômica. Seus elementos sociais — a igualdade racial e de gênero, o livre movimento dos trabalhadores, o multiculturalismo — estão mortos. Restam apenas os baixos impostos, a desregulação e a veneração dos lucros.
O artigo é de Branko Milanovic, economista sérvio-americano especializado em desigualdade econômica, publicado por El Salto, 09-01-2025.
A data de 20-01-2025 marcará o fim simbólico do neoliberalismo global.
As testemunhas dos acontecimentos históricos quase nunca estão conscientes de que estão observando ou participando de um fato que mudará a história. Frequentemente, os próprios protagonistas desses eventos também não têm consciência disso. Mas, em 20-01-2025, presenciaremos um desses acontecimentos enquanto a maioria das pessoas, incluindo os principais atores, não saberá o que está fazendo, alheios ao fato de que são, em essência, ferramentas da história.
O dia 20-01-2025 marcará o fim simbólico do neoliberalismo global. Seus dois componentes desapareceram. O globalismo foi transformado em nacionalismo, e o neoliberalismo aplica-se apenas à esfera econômica. Seus elementos sociais — a igualdade racial e de gênero, o livre movimento dos trabalhadores, o multiculturalismo — estão mortos. Restam apenas os baixos impostos, a desregulação e a veneração dos lucros.
Já escrevi sobre o que penso da maneira como Donald Trump entende o mundo: lucros, neomercantilismo, um nacionalismo americano não imperialista. Cada um desses elementos individuais pode ser facilmente definido e nenhum deles é novo ou desconhecido. Porém, como frequentemente acontece nos pontos de inflexão da história, apenas quando essas visões convergem é que uma nova ideologia se define. Ainda desconhecemos seu nome. O que sabemos, no entanto, é que ela representa uma ruptura com a ideologia que dominou desde os anos 1980, e sem dúvida desde o início dos anos 1990, até os dias de hoje.
O próprio Trump foi um dos beneficiários do neoliberalismo global. Por suas preferências, sua idade e sua nacionalidade, ele participou e se beneficiou plenamente dele. Por razões que provavelmente têm mais a ver com vaidade do que com ideologia, decidiu desafiá-lo. Não esperava fazê-lo com sucesso. Mas, oito anos depois, após sua primeira vitória presidencial totalmente inesperada e depois de quatro anos no deserto, sendo perseguido pela praga de gafanhotos representada pelos processos judiciais, pelo assédio midiático constante, por duas tentativas de assassinato, por livros de revelações que "contavam tudo", por juízes, investigações, falsos amigos, "chuvas douradas" e acusações de traição, ele retornou com 77 milhões de votos e a vitória tanto no voto popular quanto no colégio eleitoral.
Ninguém, nem mesmo ele, sabe para onde essa amálgama de ideias que reuniu levará os Estados Unidos, o Ocidente político e o mundo. Dentro de alguns anos, veremos sua lógica. Talvez quem melhor a represente seja Elon Musk, que chamou à criação de uma elite global, sem amarras ideológicas, sentimentais ou psicológicas ao nacionalismo, mas usando-o para fins políticos a fim de apaziguar as classes inferiores. Trata-se de um cesarismo global: presta tributo às classes inferiores, colhe seus votos e paga suas elevadas faturas de cartões de crédito, mas oferece em troca empregos mal remunerados e as ignora como participantes ativas na política, exceto em intervalos de quatro anos. Faz o mesmo que os democratas e republicanos centristas tradicionais, mas, como seu cinismo é novo, é menos óbvio, menos ressentido e mais acreditado.
Em sua crueza e frescor, representa uma ruptura com a ideologia dominante dos últimos quarenta anos: o domínio desgastado de plutocratas que alegavam combater a pobreza. O neoliberalismo não era uma ideologia de terra e sangue, mas conseguiu matar muita gente. Sai de cena exalando falsidade e desonestidade. Poucas ideologias foram tão mendazes: pregava igualdade enquanto gerava aumentos históricos na desigualdade; clamava por democracia enquanto semeava anarquia, desacordo e caos; criticava as classes dirigentes enquanto criava uma nova aristocracia de riqueza e poder; apelava às normas enquanto as violava; e fundou um sistema de mendacidade acadêmica que tentou transformar mentiras em verdades.
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Trump como ferramenta da história. Artigo de Branko Milanovic - Instituto Humanitas Unisinos - IHU