31 Outubro 2024
O caso mais recente é do fazendeiro Claudecy Oliveira Lemes, que devastou o Pantanal e abasteceu alguns dos maiores frigoríficos do mundo, incluindo a JBS.
A reportagem é publicada por ClimaInfo, 31-10-2024.
Desde janeiro de 2023 o governo ampliou o combate ao desmatamento no Brasil. Uma das ferramentas usadas para detectar a devastação são as imagens registradas por satélite. No entanto, uma nova arma vem sendo usada por fazendeiros para enganar essa vigilância: o desmate químico.
O caso mais recente é o do fazendeiro Claudecy Oliveira Lemes, responsável pelo maior dano ambiental da história do Pantanal. Os satélites não detectaram nada alarmante. Mas, no solo, as árvores estavam morrendo. Lentamente, uma faixa de floresta protegida do tamanho da cidade de Nova York [81 mil hectares] estava secando. As folhas caíam das árvores e, à medida que o sol atravessava o dossel em desintegração, pastagens de grama brotavam.
Tudo isso foi intencional, destaca o New York Times, em matéria repercutida por France24, Environmental Health News e Wood Central. Quando as autoridades brasileiras responderam a denúncias anônimas sobre a destruição no ano passado, encontraram pilhas de recipientes vazios de dezenas de agrotóxicos, que foram pulverizados sobre vegetação nativa do Pantanal. O gado pastava em algumas das pastagens recém-crescidas.
Lemes é pecuarista e já forneceu para vários frigoríficos, incluindo JBS, Marfrig e Minerva, mostrou um estudo da organização Mighty Earth em parceria com a Repórter Brasil e a AidEnvironment. E também já recebeu financiamento do Banco do Brasil, mesmo com multas e investigações por crime ambiental.
Lemes se tornou réu, acusado de cometer um dos maiores atos de desmatamento ilegal no Brasil. As autoridades querem quase US$ 1 bilhão em compensação pela devastação ambiental. Ele nega qualquer irregularidade.
“É mais difícil de detectar [o desmate químico], parece um incêndio, e você pode desmatar milhares de hectares em pouco tempo”, explicou Ana Luiza Peterlini, promotora do Ministério Público do Estado do Mato Grosso responsável pelo caso. “Os criminosos estão sempre à nossa frente.”
Segundo as autoridades, fazendeiros usam produtos químicos para secar a floresta e facilitar a queima. O incêndio, então, destrói as evidências do desmate químico. “Não temos dúvidas de que é uma prática muito comum”, disse Rodrigo Agostinho, presidente do IBAMA. “Mas temos uma tremenda dificuldade em provar isso.”
Para piorar, nenhum órgão público brasileiro mantém registros de casos de desmatamento químico. Segundo levantamento da Repórter Brasil, além da área devastada por Lemes, outros 47 mil hectares foram desmatados com o uso de pesticidas no Brasil desde 2010. Um número provavelmente subestimado.
Além de devastar biomas brasileiros, invadir Terras Indígenas e agir com violência contra os Povos Originários, grilar Terras Públicas e utilizar trabalho escravo, o “ogronegócio” brasileiro também financia um lobby para patrulhar livros didáticos e impedir que mostrem o lado nada pop da agropecuária brasileira, mostra a Repórter Brasil. Trata-se do “De Olho no Material Escolar”, ou “Donme”. A entidade tem entre seus líderes Christian Lohbauer, ex-executivo da indústria de agrotóxicos e um dos fundadores do Partido Novo, que nega o impacto do desmatamento da Amazônia causado pela pecuária e vê até poemas de autores como Ferreira Gullar como conteúdos negativos sobre o agro.
O Donme cresceu e vem ganhando espaço em instituições públicas. Já fechou parceria com a USP, tem portas abertas nas secretarias de Educação e de Agricultura do estado [o que não chega a ser surpresa, em se tratando do governador Tarcísio de Freitas] e mantém diálogos com a cúpula do Congresso, em Brasília, na tentativa de influenciar o novo Plano Nacional de Educação (PNE) – que vai estabelecer as diretrizes da educação na próxima década.
Por trás dessa atuação está o financiamento de dezenas de empresários e corporações do agronegócio. A organização declara 70 empresas entre os membros, mas não diz quem são.
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Ruralistas usam desmate químico para devastar biomas sem detecção por satélites - Instituto Humanitas Unisinos - IHU