31 Outubro 2024
"Para imigrantes mexicanos como eu, a Virgem de Guadalupe simboliza esperança, liberdade e unidade", escreve José Luis Castro Padilla, bacharel em história pela California State Polytechnic University e mestre em história pela California State University, em artigo publicado por National Catholic Reporter, 29-10-2024.
Eu estava indo à missa mês passado para celebrar a Natividade de Nossa Senhora, quando rolei o Instagram e vi o ex-presidente Donald Trump compartilhar uma imagem da Virgem de Guadalupe. Fiquei indignado com essa exploração política de uma imagem sagrada.
Mas este não foi um incidente isolado. Grupos como o Napa Institute abraçaram a imagem da Virgem enquanto elogiavam um candidato cujas políticas são abertamente anti-imigrantes. Na Conservative Political Action Conference, membros católicos do Partido Republicano expressaram sua devoção à Virgem de Guadalupe, mesmo que o evento tenha sido marcado pela retórica anti-imigrante. Na Flórida, conservadores latinos até presentearam Trump com uma imagem da Virgem durante um evento de campanha.
Fui trazido a este país ainda jovem pelos meus pais. Por meio de trabalho duro e dedicação, obtive educação superior, mas minha formação me tornou um alvo para aqueles que discriminam imigrantes.
Sou um católico devoto que vai à missa todo fim de semana. Para imigrantes mexicanos como eu, a Virgem de Guadalupe simboliza esperança, liberdade e unidade. La Morenita del Tepeyac representa uma intercessão divina com Deus. De acordo com a tradição, a Nossa Senhra de Guadalupe, la Madrecita de los Immigrantes, incorpora o espírito de cuidado e proteção para aqueles em jornadas difíceis.
Assim como a história bíblica de como Maria e José emigraram para o Egito para proteger seu filho Jesus, milhares de mexicanos recorreram à sua intercessão enquanto viajavam para os Estados Unidos. Durante o movimento chicano na década de 1970, para os camponeses católicos mexicanos e filipinos, a Virgem simbolizava um alívio contra a opressão e a desigualdade social. O ativista social Cesar Chavez fez de sua imagem uma parte central dos protestos rurais na Califórnia, levando-a à vanguarda de muitas manifestações.
Para muitos imigrantes mexicanos, Nossa Senhora de Guadalupe é um símbolo de luta coletiva e resiliência. Sua imagem não deve ser usada como uma ferramenta política grosseira, mas honrada por suas profundas raízes culturais e espirituais.
A tentativa de cooptar sua imagem para ganho político revela um desrespeito preocupante pelos valores sagrados que ela incorpora e pelas lutas daqueles que a estimam. Nuestra Virgencita simboliza esperança e refúgio para os perseguidos e deslocados. La Morenita, como a chamamos carinhosamente, representa imigrantes como eu — sonhadores que aspiram a uma vida melhor. A Virgem de Guadalupe é a mãe que nos dá compaixão e proteção.
Usar sua imagem para promover a retórica de extrema-direita não é apenas uma traição ao seu verdadeiro significado, mas uma afronta àqueles que recorrem a ela em busca de esperança e orientação em nossa luta.
Os comentários recentes do Papa Francisco pedindo aos eleitores americanos que escolham o candidato que eles consideram o "mal menor" refletem a crescente frustração dos eleitores católicos — muitos dos quais se sentem cada vez mais desconectados dos candidatos nas urnas.
Com 20% da população americana se identificando como católica, de acordo com o censo de 2020, está claro que esse grupo demográfico representa uma parcela significativa do eleitorado. Reconhecendo isso, Trump lançou uma campanha voltada explicitamente para cortejar os eleitores católicos, buscando alinhar sua mensagem com seus valores. Um grupo de católicos republicanos, Catholics for Trump, proclamou em seu site: "O presidente Trump se manteve inabalavelmente em defesa dos valores tradicionais e da santidade da vida humana".
Embora a campanha busque angariar apoio em torno das políticas de Trump, para muitos católicos, a santidade da vida vai além de posições antiaborto e abrange questões como imigração, justiça social e redução da pobreza.
A maioria dos imigrantes são católicos, mas esses imigrantes estão se distanciando cada vez mais da Igreja. De acordo com o Pew Research Center, a porcentagem de adultos hispânicos que se identificam como católicos caiu de 67% em 2010 para apenas 43% em 2022. Um importante elemento contribuinte parece ser os sentimentos anti-imigração expressos por alguns católicos estabelecidos nos EUA.
Quando membros de uma comunidade se sentem indesejados ou marginalizados por aqueles que deveriam ser seus aliados, isso cria uma profunda desconexão. Além disso, a falta de apoio do clero pode deixar famílias imigrantes se sentindo isoladas em suas lutas, levando-as a buscar consolo em outras instituições religiosas que podem oferecer um ambiente mais acolhedor.
Os comentários recentes de Francisco são um lembrete poderoso de que as decisões políticas têm um peso moral significativo. Não podemos permitir que nossa fé seja cooptada como meras ferramentas para ganho político. Símbolos e ensinamentos religiosos devem inspirar compaixão e justiça genuínas, não servir como apelos superficiais aos eleitores.
À medida que nos aproximamos desta eleição crucial, não vamos apenas dar ouvidos às palavras do papa, mas vamos levá-las a sério. Vamos examinar cuidadosamente os valores que desejamos ver em nossos líderes e deixar que esses valores guiem nossas decisões. As escolhas nas urnas devem ressoar com as convicções mais profundas e refletir um compromisso com a criação de uma sociedade que incorpore nossos princípios.
Agora é o momento de reflexão profunda e alinhamento do nosso engajamento político com os valores da nossa fé.
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A cooptação de Guadalupe pela campanha de Trump desconsidera os valores sagrados que ela representa. Artigo de José Luis Castro Padilla - Instituto Humanitas Unisinos - IHU