04 Abril 2024
"Usar IAs para efeitos especiais e pirotecnia-lixo de milhões de dólares qualquer um usa. Cineasta de verdade extrai poesia de um lavador de banheiros públicos".
O comentário é de Rodrigo Petronio, publicado em sua página pessoal do Facebook, 30-03-2024.
Escritor e filósofo, Rodrigo Petronio é professor titular da Faculdade de Comunicação da Fundação Armando Álvares Penteado – FAAP. Desenvolve pós-doutorado no Centro de Tecnologias da Inteligência e Design Digital – TIDD/PUC-SP sobre a obra de Alfred North Whitehead e as ontologias e cosmologias contemporâneas. É também doutor em Literatura Comparada pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro – UERJ. Possui dois mestrados: em Ciência da Religião, pela PUC-SP, sobre o filósofo contemporâneo Peter Sloterdijk, e em Literatura Comparada, pela UERJ, sobre literatura e filosofia na Renascença. Entre suas publicações poéticas, destacamos História natural (Gargântua, 2000), Assinatura do sol (Gêmeos R, 2005) e Pedra de luz (A Girafa, 2005). Atualmente divide com Rodrigo Maltez Novaes a coordenação editorial das Obras Completas de Vilém Flusser pela Editora É.
Dias Perfeitos é uma joia narrativa sob qualquer aspecto. Mostra por que Wim Wenders continua sendo um mestre mundial do cinema. Embora não tenha as mesmas dilatações temporais, pode ser visto como uma homenagem a Yasujirō Ozu. Em termos de estrutura, dialoga com o maravilhoso Patterson de Jim Jarmusch. O protagonista pária social relembra outro belo momento do cinema japonês: A Partida de Yojiro Takita. Como outros de Wenders, Dias Perfeitos pertence aos estudos de personagens-anjos. Figuras que flutuam entre o natural e o sobrenatural, a marginalidade, o desprezo coletivo e a invisibilidade. Um Umberto D mais jovem, extraviado para Tokyo. Wenders conseguiu extrair tanta espessura formal e emocional de tantas nuances do cotidiano, que o filme todo pode ser visto como um longo poema narrativo.
Usar IAs para efeitos especiais e pirotecnia-lixo de milhões de dólares qualquer um usa. Cineasta de verdade extrai poesia de um lavador de banheiros públicos. Quem se habilita a dar vida a um protagonista que, em duas horas, deve ter pronunciado vinte frases? As variações de focalização e de angulação são perfeitas. As câmeras subjetivas são maravilhosas. Os devaneios em preto e branco do protagonista, uma beleza. O trabalho cênico, a atuação e a direção de atores são um primor. Não teria mesmo como Kōji Hashimoto não levar melhor ator em Cannes. A trilha sonora é uma coisa à parte, com Lou Reed, Velvet Underground, The Animals. O final com Nina Simone é de chorar. Uma das melhores anatomias atuais de nossa comum, universal e unânime solidão.
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Dias Perfeitos é uma joia narrativa sob qualquer aspecto. Comentário de Rodrigo Petronio - Instituto Humanitas Unisinos - IHU