14 Dezembro 2023
A reportagem é de José Lorenzo, publicada por Religión Digital, 14-12-2023.
Profeta para alguns, santo para outros, o que está claro é que a figura de Leonardo Boff não deixa ninguém indiferente. Primeiro, por sua aparência, apesar de ter deixado o hábito franciscano há décadas, quando Roma o repreendeu precisamente pelo segundo aspecto pelo qual não passou e não passa despercebido: sua reflexão teológica.
Com sua barba e juba brancas, poderia muito bem ser um figurante à maneira de Charlton Heston em "Os Dez Mandamentos", mas também se sairia bem no papel do pregador usado por Vargas Llosa em "A Guerra do Fim do Mundo" para nos mostrar, no mesmo Brasil onde Boff nasceu há 85 anos, as reviravoltas pelas quais o confronto entre a cruz e a espada sempre tem uma inegável epopeia literária.
Mas Leonardo Boff, na realidade, é um personagem que não precisa de assimilações, ele é por si mesmo, por uma vida em que tentou incorporar o que sentia e acreditava, evangelizando a partir do que pensava ser a essência da mensagem, o que o levou a ser um dos principais expoentes da Teologia da Libertação, que foi para a Igreja o maio de 68 que trouxe dores de parto ao planeta.
Aquela década prodigiosa o pegou estudando teologia na Europa e, ao retornar, o encontro com a realidade e com outros teólogos como Gustavo Gutiérrez o transformou, juntamente com o peruano, em uma referência incontestável da Teologia da Libertação, com uma ênfase própria e ramificações mais políticas do que as daquela época.
Aríete do pontificado de João Paulo II, que o condenou ao ostracismo por meio de quem até mesmo o havia ajudado a custear sua tese, o então prefeito Joseph Ratzinger, o processo do Vaticano contra obras suas como "Igreja, carisma e poder" foi vivido pelo brasileiro como uma crueldade inquisitorial e uma fonte de profunda dor, o que o levou a deixar a ordem franciscana em 1992, embora nunca tenha deixado de se considerar um verdadeiro filho do Poverello.
O teólogo Leonardo Boff. (Foto: Reprodução | leonardoboff.org)
Escritor que conseguia vender como um autor de best-sellers, divulgador, palestrante e professor universitário fora da herança católica, onde era um proscrito, também foi pioneiro na reflexão ecológica, à qual soube, na mais pura tradição franciscana, preencher com o misticismo que a perversão religiosa do "domínio da terra" havia completamente deixado de lado.
Nos últimos anos, o teólogo de Petrópolis viveu sua própria conversão pessoal à figura pastoral de um Papa, neste caso a de Francisco, a quem não via como desejável como pontífice no conclave de 2005 e a quem, dez anos depois, enviou – a pedido de Bergoglio – materiais que felizmente seriam incorporados na primeira encíclica ecológica da história da Igreja. Ou seja, sua reflexão, transformada em magistério. Apenas três décadas depois de ter sido silenciado pelo Vaticano.
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Boff, o teólogo maldito que deixa magistério no Vaticano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU