06 Dezembro 2023
Na primeira metade dos anos 1990, a Itália foi o primeiro país em que over 65 ultrapassaram os under 15. Atualmente, os italianos com 65 anos ou mais atingiram a percentagem que o mundo terá no final do século e a presença dos jovens está em níveis que o planeta verá no século XXII.
A reportagem é de Andrea Rossi, publicada por La Stampa, 03-12-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
A Itália perdeu os seus jovens. A fotografia tirada pelo La Giovane Italia, livro publicado pela editora Il Mulino, é aquela de uma geração que os curadores – os sociólogos da Universidade de Turim, Francesco Ramella e Sonia Bertolini – definem como uma “policrise”: crescida num mundo que enfrenta declínio econômico, precarização do mercado de trabalho, crise climática, pandemias, retorno da guerra e do risco atômico na Europa. São condições que afligem os jovens do Ocidente, mas as muitas contribuições contidas no livro descrevem a Itália como um caso extremo. Único.
Para o professor da Universidade Católica de Milão Alessandro Rosina, embora o inverno demográfico seja um fenômeno europeu, alguns países conseguiram adotar contramedidas e hoje têm gerações entrando na idade de trabalho “com uma consistência semelhante àqueles que estão no centro da vida adulta ativa”.
A Itália, por outro lado, “caminha para uma queda da força de trabalho potencial”. Mas o que a diferencia é o número de filhos efetivos, não o desejado”, explica Rosina. “A Itália conheceu nas últimas décadas, uma espiral de ‘desjuvenescimento’ quantitativo e qualitativo sem precedentes e difícil de encontrar no resto da Europa. É difícil encontrar um país em que os jovens se encontrem com uma combinação tão desequilibrada, além que de peso, entre velhas e novas gerações, de dívida pública no PIB e de níveis de emprego (e renda) em comparação com over 55”.
É assim que se afirma a “post-poned generation”, a geração postergada. Como explica Alessandro Cavalli, professor em Pavia, 38% dos jovens entre 26 e 34 anos moram na casa dos pais. O desemprego juvenil é de 19% (em comparação com 9,5% da população). Além disso, os jovens entre 15 e 34 anos que têm emprego permanente representam, do total empregado, 15,7% entre os garotos e 17,3% entre garotas. E também há os nem-nem, aqueles que não estudam nem trabalham: são 2 milhões, 23,1% da população entre os 15 e os 29 anos. A condição de trabalho instável gera o fenômeno descrito pela socióloga de Turim Loredana Sciolla: “Não só se tornam adultos mais tarde, mas o próprio percurso perde a sua linearidade, torna-se mais flexível e tem formas de reversibilidade das escolhas”. De fato, explica o sociólogo da Universidade de Bolonha Roberto Rizza, “não é improvável que o estudo e o trabalho estejam entrelaçados, que o nascimento de um filho preceda o casamento, ou que a saída de casa seja interrompida por um novo retorno à família”.
Se até recentemente a convivência entre os jovens, como modalidade de saída de casa, era mais difundida entre os jovens de classe social mais elevada e o casamento entre aqueles de classe mais baixa, hoje - explica Manuela Naldini – nascem “também novas desigualdades e ‘destinos divergentes’ nas formas de ‘construir’ uma família entre os jovens em função da sua origem social”.
Mesmo assim, esta época de extrema incerteza deu origem a uma reação. Embora de forma embrionária, explicam Moreno Mancosu e Francesco Ramella, “parece que estamos assistindo ao nascimento de uma nova geração política” diferente da politização ideológica dos anos 1960-70 e do privatismo apático dos anos 1980-90. “Os under 35 anos herdaram dos pais uma certa rejeição pela política institucional, mas dos avós o gosto pela contestação, através do relançamento de formas de participação não convencional. Juntamente com um forte apego à democracia e aos direitos civis, essa nova geração compartilha uma profunda consciência da incerteza do futuro”.
É claro que a abstenção entre os under 35 anos é cerca do dobro daquela entre os acima de 64 anos. No entanto, há muito mais participação: manifestações públicas, iniciativas pelo meio ambiente ou de bairro, voluntariado. E o empenho público também se manifesta através das escolhas de vida cotidiana: consumos, transportes, alimentação. Silvia Mazzucotelli Salice e Emanuela Mora explicam: “Assistimos à reativação de sensibilidades – éticas, críticas e ambientais – que reafirmem o papel da compra (ou não compra) como campo de ação e participação política, uma forma de empenho mais imediata e tangível, mas não necessariamente alternativa à mobilização coletiva”.
Nessa perspectiva, a relação com o trabalho também é redefinida: “Diante da eventualidade de deixar um emprego permanente por um precário – desde que seja mais interessante – quase um terço dos jovens dos 18 aos 34 anos concorda, enquanto menos de um adulto em cada cinco a compartilha", é a análise de Sonia Bertolini e Valentina Goglio. Não significa não almejar a estabilidade do trabalho ou da carreira, mas considerar também outros fatores: a realização na profissão ou a conciliação com a vida privada.
Os under 35 anos também se caracterizam por uma nova forma de viver a esfera pessoal, analisam Nicole Braida e Raffaella Ferrero Camoletto, “que questiona o binarismo de gênero e sexual e as suas expressões normativas”.
Uma geração estruturada na instabilidade. Mas que, conta o livro, experimenta novas formas de democracia.
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A juventude diferente - Instituto Humanitas Unisinos - IHU