30 Novembro 2023
"A média das temperaturas globais já ultrapassou o limiar de +1,2°C (1,3°C de acordo com as estimativas mais atualizadas) em comparação com a era pré-industrial. Desde que queimamos petróleo, gás e carvão, a concentração de dióxido de carbono (o infame CO2 que gera o efeito estufa) na atmosfera atingiu níveis nunca vistos na história da civilização humana: mais de 420 partes por milhão (+40 % em comparação com os níveis máximos alcançados nos últimos 800.000 anos)", escreve Nicolas Lozito, jornalista, em artigo publicado por La Stampa, 29-11-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
Hoje começa em Dubai o encontro de diplomacia climática mais importante do ano, a COP28 – onde COP significa “Conferência das Partes”, organizado pelas Nações Unidas, e 28 é o número da edição, uma por ano desde 1995 (excluindo 2020). Como o mundo chega ao evento? Como as crianças no primeiro dia de aula: distraídas pelo verão e sem terem feito as tarefas de casa das férias.
Metáforas à parte: o mundo está em ebulição, guerras e crises atraem as principais atenções e os Estados estão muito longe de resultados concretos, apesar de anos de solenes promessas. Além da falta de progressos, ontem chegou outra má notícia. O Papa Francisco anunciou que não poderia comparecer ao evento por motivos de saúde. Ele teria sido o primeiro pontífice a participar de uma COP. Nos últimos meses ele publicou a atualização de sua encíclica ambiental Laudato Si' pedindo progressos globais em matéria de justiça climática. Não é o único ausente ilustre: Biden e Xi não estarão presentes (enquanto o rei Charles III continua confirmado). A Cop começa ainda mais complicada do que o esperado.
Vamos analisar o contexto. 2023 será o ano mais quente desde sempre segundo as projeções do ente europeu Copernicus. A média das temperaturas globais já ultrapassou o limiar de +1,2°C (1,3°C de acordo com as estimativas mais atualizadas) em comparação com a era pré-industrial. Desde que queimamos petróleo, gás e carvão, a concentração de dióxido de carbono (o infame CO2 que gera o efeito estufa) na atmosfera atingiu níveis nunca vistos na história da civilização humana: mais de 420 partes por milhão (+40 % em comparação com os níveis máximos alcançados nos últimos 800.000 anos). O indicador do CO2 é ainda mais importante que a temperatura. Para fazer outra comparação, é como ajustar a potência do forno: a temperatura se regula mais lentamente. Com os Acordos de Paris (COP 21), os estados haviam chegado ao acordo para limitar o aquecimento global a +2°C e possivelmente em torno de +1,5°C, o único limite considerado seguro pelos cientistas.
O órgão da ONU que organiza as COP, a UNFCCC, quantificou a diferença entre promessas e realidade.
A ONU tomou como referência as emissões de 2019: para desacelerar o aquecimento global e reduzir pela metade as possibilidades de ultrapassar +1,5°C, os países deveriam reduzir as emissões globais em 43% até 2030. Mas da forma como estamos nos comportando até agora, estamos destinados a uma redução de apenas 2%. Um fracasso total. Nas próximas duas semanas de negociações, o objetivo é voltar ao trilho. Esse é um dos primeiros objetivos do Dubai: aceitar que o “Global Stocktake”, o balanço a ser feito a cada 5 anos sobre os objetivos alcançados ou esquecidos, se torne uma ferramenta não só de mero estudo, mas um roteiro para corrigir os erros.
Nos Emirados Árabes Unidos estarão presentes 70 mil delegados de todo o mundo. Na primeira semana esperamos anúncios de estados individuais ou grupos de países: novos projetos e promessas “verdes”.
Na segunda semana, se entrará no cerne do acordo final. Dirigindo as longuíssimas negociações, em busca de um documento aprovado por unanimidade, estará Sultan Al-Jaber, ministro do país e CEO da empresa petrolífera Abu Dhabi National Oil Company.
Durante o último ano ele tentou convencer o mundo da sua boa-fé, mas justamente dois dias arás uma investigação jornalística revelou os seus planos secretos para assinar novos acordos de extração durante o evento.
Justamente sobre a questão dos combustíveis fósseis realiza-se o jogo mais importante. A Agência Internacional para a Energia afirma que não podem mais ser iniciados novos projetos de extração, mas os países ricos em ouro negro e hidrocarbonetos esperam que as negociações possam permitir exceções. O empenho global de triplicar a produção de energia renovável até 2030 será muito provavelmente colocado preto no branco, talvez o resultado mais importante na agenda (mas os países "mais verdes", incluindo o bloco UE, não querem que isso justifique os estados mais poluidores).
O ano passado a COP27 terminou com um resultado histórico: foi reconhecido o princípio da justiça climática (quem poluiu mais, ou seja, o Ocidente é responsável e deve sustentar os países mais vulneráveis). Foi aprovado o fundo Perdas e Danos, mas o debate estagnou sobre o funcionamento e a gestão dos fluxos de dinheiro. O mesmo pode ser dito das finanças verdes, grande mito e grande promessa da COP, mas com mecanismos de funcionamento ainda lentos.
É por isso que as COP são como o primeiro dia de aula: chegamos despreparados, cheios de grandes esperanças para o novo ano. Firmes com as nossas promessas de estudo, conscientes de que uma parte não será cumprida. Esperamos que não todas.
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Clima: acordo impossível. Artigo de Nicolas Lozito - Instituto Humanitas Unisinos - IHU