21 Setembro 2023
"O seu pensamento fraco foi um pensamento consciente de que as próprias posições são o resultado de uma leitura parcial e provisória da realidade em que vivemos", Michela Marzano, filósofa italiana, em artigo publicado por La Stampa, 20-09-2023.
Segundo ela, "É precisamente graças ao profundo respeito pelas diversas visões do mundo que Gianni Vattimo, nos últimos anos, fez do amor ao próximo a sua bússola, com um coração que nunca deixou de bater pela esquerda, sempre do lado dos mais frágeis, sempre ao lado de quem sofre".
Ao contrário da metafísica, pensamento que retorna aos fundamentos, a hermenêutica caracteriza-se mais como pensamento da tradição no sentido de traditum, aquilo que é transmitido. Por essa razão, a hermenêutica parece-me ser uma forma, talvez a única forma, na qual uma experiência religiosa possa sobreviver.” Pensamento fraco, pós-modernismo, hermenêutica: essas são sem dúvida as três palavras-chave que nos falam de Gianni Vattimo, um dos maiores filósofos italianos contemporâneos, um daqueles intelectuais que nunca hesitaram em tomar posição sobre as questões mais controversas e espinhosas da existência, às vezes até mudar radicalmente de opinião. Afinal, ele foi o primeiro, na Itália, a nos explicar que a filosofia não podia mais ser concebida e praticada como uma ciência ontológica do ser, como um saber abrangente e sistematicamente estruturado. Como é possível ter uma concepção unitária da realidade num mundo cada vez mais complexo e, ao mesmo tempo, avançar decentemente ao longo da existência, sem qualquer fio condutor e sem nenhuma guia?
Uma aula de Gianni Vattimo na Piazza Vittorio em Turim. (Foto: Dario Nazzaro)
Inspirado nas posições do filósofo francês Jean-François Lyotard, Vattimo é o teórico italiano do pensamento fraco – não tão fraco quanto o do colega francês, não tão exigente em relação a toda "grande narrativa", mas ainda assim oposto a qualquer forma de sistematicidade estrutural. O ser, para Vattimo, só poderia existir como temporalidade, como uma espécie de transmissão de mensagens linguísticas de uma época para a outra. Para o filósofo, era a única possibilidade de escapar da violência de uma verdade monolítica e, portanto, com “V” maiúsculo; a única forma de dar conta das mil facetas da existência, sem por isso, no entanto, abrir mão de valores como a tolerância, o acolhimento ou a caridade que, para Vattimo, sempre tiveram a capacidade de resistir ao desgaste do tempo. Além disso, para ele não se tratava de justificar formas extremas de relativismo, mas de se opor à violência intrínseca de “toda relação autoritária que se estabelece entre o fundamento e o fundado, entre o ser verdadeiro e a aparência efémera ou, que é o mesmo, nas relações de dominação que se constroem em torno da relação sujeito-objeto”.
O objetivo do professor Vattimo era promover o diálogo e, portanto, dar espaço às dúvidas, às perplexidades e à subjetividade, às vezes contraditória, de cada interlocutor. Que é, afinal, a forma mais bela de dar direito de cidadania não só à multiplicidade de pontos de vista, mas também, e talvez sobretudo, à fragilidade da condição humana, a todas aquelas fraturas que se experimentam pessoalmente, e que às vezes nos levam a gaguejar e a não saber escolher, mas ainda mais frequentemente a respeitar o ponto de vista alheio, mesmo que seja oposto ao nosso. Um pensamento capaz de se tornar fraco, para Gianni Vattimo, nunca foi um pensamento desprovido de espinha dorsal, para ele nunca foi uma questão de rejeitar a objetividade de alguns valores, primeiro entre eles a dignidade da pessoa, como já foi dito algumas vezes, censurando-o por um relativismo absoluto que, no entanto, não lhe pertencia.: “Quem troveja contra o relativismo não se dirige a nós como indivíduos, que não somos nem podemos jamais ser relativistas – pois talvez só Deus o possa realmente ser, desprezando a pluralidade das culturas e das interpretações. O relativismo só pode ser uma característica da sociedade, pois é nela que convivem e muitas vezes se chocam múltiplas visões do mundo.”
E é precisamente graças ao profundo respeito pelas diversas visões do mundo que Gianni Vattimo, nos últimos anos, fez do amor ao próximo a sua bússola, com um coração que nunca deixou de bater pela esquerda, sempre do lado dos mais frágeis, sempre ao lado de quem sofre.
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Para Vattimo a verdade era interpretação, ele buscava o diálogo e adorava a dúvida - Instituto Humanitas Unisinos - IHU