15 Setembro 2023
O único cardeal católico da Suécia foi aos Estados Unidos para uma breve visita no fim de agosto. Mas não foi sozinho.
A reportagem é de Joshua J. McElwee, publicada por National Catholic Reporter, 13-09-2023. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O cardeal Anders Arborelius, que lidera a pequena comunidade católica na Suécia desde 1998, foi a Washington junto com Karin Johannesson, bispa assistente na Arquidiocese Luterana de Uppsala.
Os dois prelados, que partilham uma devoção à espiritualidade carmelitana, participaram de um diálogo ecumênico sobre Santa Teresinha de Lisieux do século XIX, realizado no Santuário Nacional São João Paulo II.
Em entrevistas realizadas pelo NCR após o evento, Arborelius e Johannesson expressaram esperança de que sua colaboração possa ser um sinal de como os cristãos de denominações diferentes podem trabalhar juntos. Eles também falaram sobre suas expectativas para o próximo Sínodo dos Bispos convocado pelo Papa Francisco, que realizará sua primeira assembleia em Roma no mês que vem.
“O processo sinodal é muito emocionante e é um desenvolvimento importante para a Igreja Católica”, disse Johannesson. Arborelius disse esperar que a assembleia “ajude as pessoas a um encontro mais profundo com Cristo, a segui-lo mais fielmente e a servir os necessitados”.
Por que foi importante que vocês dois viessem juntos para os Estados Unidos? Que testemunho vocês acham que sua colaboração dá sobre a importância das relações ecumênicas?
Anders Arborelius – Na Suécia, o diálogo ecumênico está muito relacionado com a espiritualidade. Nossa experiência nos ensinou que nos aproximamos uns dos outros quando rezamos juntos e tentamos viver na presença de Deus seguindo os passos de Jesus. Se estivermos realmente unidos em Jesus, também nos olharemos com mais carinho e compreensão. Teremos mais respeito uns pelos outros, mesmo que tenhamos pontos de vista dogmáticos e éticos diferentes. Queríamos compartilhar essa atitude com os cristãos estadunidenses.
Karin Johannesson – O cardeal Arborelius e eu nos conhecemos há muitos anos, muito antes de eu ser ordenada presbítera e ser consagrada bispa. Eu acho que a amizade é vital e necessária quando falamos de ecumenismo. A generosidade entre a Igreja Católica e a Igreja Luterana na Suécia é única, e temos muito a aprender uns com os outros, especialmente no que diz respeito à espiritualidade e à vida espiritual.
Muitos católicos estão esperando pela primeira sessão do Sínodo dos Bispos em Roma, neste mês de outubro. Cardeal, o senhor pode descrever um pouco como a Igreja Católica na Suécia tem se preparado para o Sínodo? Bispa, como a comunidade luterana na Suécia tem experienciado o Sínodo?
Anders Arborelius – Temos uma população católica muito diversificada na Suécia, porque a maioria dos fiéis são imigrantes de primeira ou de segunda geração, de diversas nacionalidades. Muitos pertencem às Igrejas Católicas orientais. A maioria dos participantes no diálogo viu a necessidade de uma unidade mais profunda entre os fiéis. Há uma tendência de se reunir apenas com pessoas da mesma língua ou origem nacional. Para nós, seria muito importante mostrar que somos um só corpo em Cristo e dar testemunho desse fato em uma sociedade bastante segregada, onde os suecos nativos e os imigrantes frequentemente vivem separados.
Karin Johannesson – Fui pessoalmente convidada pela comunidade ecumênica de Taizé, na França, para preparar um encontro ecumênico em Roma durante o próximo Sínodo, em outubro. O Sínodo também tem uma dimensão ecumênica e é importante que as várias Igrejas participem. O ecumenismo tem a ver com relacionamentos, por isso uma jornada partilhada muitas vezes dá frutos no aprofundamento da amizade e na cura da comunidade. Sinodalidade é caminhar juntos.
Há alguma questão que vocês, pessoalmente, esperam que o Sínodo possa discutir?
Anders Arborelius – A evangelização em um mundo pós-cristão é um tema muito urgente. Ajudar as pessoas a terem um encontro mais profundo com Cristo, a segui-lo com mais fidelidade e a servir os necessitados.
Karin Johannesson – O processo sinodal é muito emocionante e é um desenvolvimento importante para a Igreja Católica. O documento de trabalho do Sínodo é muito interessante e posso reconhecer muitas questões que são comuns a todas as nossas Igrejas. Eu realmente espero que o Sínodo reserve algum tempo para discutir como uma Igreja sinodal pode cumprir sua missão por meio de um compromisso ecumênico renovado. Temos muito em comum e temos que cooperar com a missão da Igreja hoje. Espero também que a teologia sobre o “sacerdócio de todos os fiéis”, que não é desconhecida na teologia católica e é muito cara para nós, luteranos, possa ser utilizada no processo sinodal.
Nos Estados Unidos, há um foco muito grande na possibilidade de algum tipo de reconhecimento ou de papel para as mulheres no ministério ordenado ou talvez na reinstituição de mulheres que atuem como diáconas católicas. Vocês têm alguma opinião ou esperança a esse respeito?
Anders Arborelius – É de extrema importância encontrar mais possibilidades para as mulheres participarem no trabalho de evangelização em vários níveis. Ao mesmo tempo, é importante ver que existem outras formas além do ministério ordenado. Seria muito frustrante se a discussão se limitasse a essa questão, que não pode ir mais longe, uma vez que o ministério sacerdotal está reservado aos homens na doutrina católica e ortodoxa.
Karin Johannesson – Eu fico feliz com tal discussão dentro da Igreja Católica. Na Igreja da Suécia, assim como na maioria das Igrejas luteranas, houve um longo estudo teológico sobre as mulheres no ministério. Há muito tempo, temos mulheres como presbíteras na Igreja da Suécia, e isso já não é mais um problema. Para nós, foi um desenvolvimento natural ter mulheres e homens como diáconos, presbíteros e bispos. A Federação Luterana Mundial tomou uma decisão em 1984 de encorajar todas as Igrejas membros a terem pelo menos 40% de mulheres, 40% de homens e 20% de jovens em todos os órgãos de tomada de decisão. Nem todas as Igrejas luteranas conseguiram alcançar esse objetivo.
Vocês acham que a Igreja Católica poderia aprender algumas coisas ao observar o ministério das mulheres em outras denominações cristãs?
Anders Arborelius – A bispa Johannesson é bispa assistente de Uppsala e uma pessoa muito respeitada, especialmente como líder espiritual e testemunha autêntica do que significa seguir Jesus na nossa sociedade secular da Suécia. É claro que nós, como católicos, podemos nos inspirar muito nela e naquilo que ela está fazendo.
Karin Johannesson – Não é minha tarefa falar sobre como uma outra Igreja deveria decidir, mas, a partir da minha perspectiva, só posso ver que a questão das mulheres no ministério é teológica e antropológica. É claro que não foi fácil para muitos aceitar quando a Igreja da Suécia tomou a decisão, em 1958, de introduzir mulheres como presbíteras, mas hoje apenas pequenos grupos questionariam essa decisão. Somos várias Igrejas que têm mulheres no ministério há décadas, o que enriqueceu a nossa Igreja.
De forma mais ampla, ao olharmos para o ministério do Papa Francisco nos últimos 10 anos e meio, como vocês avaliam seu legado, especialmente no que diz respeito às relações ecumênicas?
Anders Arborelius – O Papa Francisco ajudou-nos a ser mais fiéis a Jesus em sua humildade e pobreza, em sua kénosis. Ele nos inspirou a servir aos necessitados e a não buscar privilégios e influência na sociedade. Ele pode nos ajudar a nos convertermos e a sermos mais humildes e alegres, como foi São Francisco de Assis. Ele recorda-nos a nossa obrigação de viver em diálogo com pessoas de outras comunidades de fé e com os não crentes. Ele mostrou-nos o caminho para permanecermos esperançosos mesmo sendo menos católicos e aceitando viver como uma minoria criativa sem nenhum poder, mas fortes na fé, na esperança e na caridade, próximos de Jesus e de Maria.
Karin Johannesson – Tivemos o privilégio de receber o Papa Francisco em Lund, na Suécia, para a comemoração conjunta católico-luterana do 500º aniversário da Reforma, em outubro de 2016. Isso evidenciou os desenvolvimentos ecumênicos entre católicos e luteranos, e os esforços conjuntos para o diálogo. Hoje, temos um documento importante, “Do Conflito à Comunhão”, que é uma base comum para futuras colaborações ecumênicas. Francisco mostra uma grande abertura ao diálogo e é muito popular até mesmo entre os luteranos na Suécia.