11 Setembro 2023
Tahar Ben Jelloun passou a manhã ao telefone. Felizmente nem amigos nem parentes estiveram envolvidos no terremoto em Marrocos. Mas muita emoção, como é natural, pelo seu país: “Este desastre atingiu especialmente os pobres”.
A entrevista é de Cesare Martinetti, publicada por La Stampa, 10-09-2023.
O escritor de Fez é o autor árabe mais conhecido em língua francesa. Foi premiado desde 1987 com o "Prix Goncourt", o mais prestigioso dos reconhecimentos literários franceses, por La nuit sacrée, o livro que revelou um retrato profundo e inédito da sociedade marroquina.
Ben Jelloun acaba de regressar à Europa vindo do seu país, onde passou o verão. Ele nos responde de Paris, no final da manhã, quando nos sites da press-marocaine.fr começam a desfilar fotos dos cadáveres enfileirados nas ruas e envoltos em panos coloridos. O número oficial do desastre ainda estava parado em 600 vítimas. Mas se sabia que estava inevitavelmente destinado a subir no decorrer das horas. À noite já eram mais de mil.
Monsieur Ben Jelloun, o que você sabe sobre o terremoto que atingiu a região ao sul de Marraquexe na noite passada?
O que posso dizer, e é o que mais me impressiona, é que a maioria das vítimas desta terrível catástrofe é de pessoas pobres, agricultores, que vivem em moradias muito precárias, feitas em grande parte de terra ou barro. Assim, os verdadeiros afetados, como sempre, são os mais frágeis.
As imagens que chegam da região mostram aldeias pobres, construídas perto de pequenos relevos, com construções da mesma cor marrom-amarelada do terreno e espalhadas na areia. Você conhece a região?
O epicentro do sismo está na aldeia de Djibil, na região de Al-Haouz, região ocupada em grande parte pelo deserto e, pelo menos desse ponto de vista, foi uma sorte. É uma região que conheço bem, tenho muitos amigos que estão todos bem. Não me lembro de ter havido um terremoto na área. Mas não é surpreendente que o desastre tenha ocorrido e que as casas tenham desabado ao primeiro abalo: são prédios construídos pelos próprios habitantes com os materiais pobres da região.
Há muitos feridos, alguns graves, e muitos escombros ainda por remover. O balanço poderia infelizmente piorar.
Temo que no final haverá muitas mortes porque nessas aldeias não existem prédio construídos com materiais e critérios antissísmicos como nas cidades modernas, como Casablanca, Marraquexe ou Agadir. E, além disso, a força do terremoto não foi igual. Choques de 5 a 6 graus foram registrados nas cidades, enquanto naquela área a magnitude foi muito maior do que aquela registrada no Japão ou recentemente no terremoto na China.
Você já experimentou ou relatou um terremoto?
Não, na minha vida só experimentei pequenos abalos, pequenos terremotos que não causaram grandes danos. Não foi nada comparado com o que as populações de Al-Haouz estão passando.
Você se lembra de outros terremotos no Marrocos?
Pelo que sei, a última vez foi em 2004 no norte do país e foi atingida a cidade de Al Hoceima. Depois, claro, lembro-me do grande terramoto de Agadir em 1960. Desta vez foi atingido o sul de Marraquexe.
Em Agadir registaram-se cerca de 12 mil mortos, uma catástrofe ainda presente na memória. Como a cidade está vivenciando o terremoto?
Temem-se novos tremores, as “réplicas”, como infelizmente quase sempre acontece após terremotos de alta intensidade. Esperemos que não ou que sejam leves. Agora, inevitavelmente, em cidades como Marraquexe, a mais próxima do epicentro do terremoto, ou mesmo em Agadir, as pessoas passaram a noite nas ruas e não confiam voltar às casas.
Como reagiu a comunidade nacional?
De uma forma formidável, como lhe dizia, estive ao telefone na noite e pela manhã, falei com amigos e conhecidos, acompanhei as notícias nos sites e vi como se desenvolveu imediatamente uma forte onda de solidariedade, em todo Marrocos e também no exterior. É muito importante porque há muitos feridos para tratar. Mas parece que os socorros chegaram muito rapidamente e isso também é formidável.
Você mora em Paris, mas costuma retornar por longos períodos ao Marrocos. Esteve no país recentemente?
Como de costume passei todo o verão em Tânger, havia muitos turistas, uma boa atmosfera nacional e internacional. Foi uma temporada agradável. Agora essa desgraça está afetando a todos.
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Marrocos. “Casas de barro, agricultores e pobres: como sempre atingidos os mais vulneráveis”. Entrevista com Tahar Ben Jelloun - Instituto Humanitas Unisinos - IHU