06 Setembro 2023
Entre o que o Santo Padre disse a um grupo de jovens russos em 25 de agosto, por videoconferência, e o que disse ontem no avião que o trouxe de Ulan Bator para Roma, respondendo à pergunta da ANSA sobre as críticas recebidas após o que afirmou sobre o "grande império russo" com a exortação de "nunca renunciar a este legado", criou-se uma nova confusão, o que é muito insidioso quando se trata do magistério papal.
A informação é de Il sismógrafo, 05-09-2023.
Alguns defendem o Papa de críticas nunca feitas. Outros a defendem sem tocar nos temas polêmicos. Há também quem pense que a polêmica diz respeito a dogmas de fé. Não faltam os que temem ataques à pessoa do Bispo de Roma.
Nada disso. Fala-se de opiniões pessoais de Jorge Mario Bergoglio. Nesta discussão, o Pontífice nunca entrou em questões próprias de seu munus petrino. Falou de assuntos historiográficos que ele próprio reconhece ter recordado dos seus tempos de escola, há mais ou menos 70 anos.
O discurso do Papa Francisco de 25 de agosto dirigiu-se aos jovens russos e foi feito de improviso
"Não se esqueça do legado. Vocês são herdeiros da grande Rússia: a grande Rússia dos santos, dos reis, a grande Rússia de Pedro, o Grande, Catarina II, esse grande e culto império russo de tanta cultura, de tanta humanidade. Nunca renuncie a essa herança. Vós sois os herdeiros da grande Mãe Rússia, ide em frente. E obrigado. Obrigado pelo seu jeito de ser, pelo seu jeito de ser russo".
11 pontos da resposta do Papa ontem ao jornalista Fausto Gasparroni
1. Francisco pronunciou as frases criticadas em "uma conversa com jovens russos. No fim da conversa, dei-lhes uma mensagem, uma mensagem que sempre repito: que tomem conta do seu legado. Esta é a primeira".
2. "Um segundo passo, para explicitar o legado: eu disse sobre a grande Rússia, porque a herança russa é muito boa, é muito bonita. Penso no campo das letras, no campo da música, até um Dostoiévski que hoje nos fala de humanismo maduro".
3. "O terceiro [ponto], talvez não tenha sido feliz, mas falando da grande Rússia no sentido não tanto geográfico, mas cultural, lembrei-me do que nos foi ensinado na escola: Pedro I, Catarina II, e veio esse terceiro aspecto, que talvez não seja realmente certo, não sei, que os historiadores nos dizem".
4. Foi "um acréscimo que me veio à cabeça porque eu tinha estudado na escola".
5. O que falei aos jovens russos é para tomar conta de sua herança, tomar sua herança, o que significa não "ir e comprar" em outro lugar, sabe? Assuma sua herança".
6. "E que legado? O da grande Rússia: a cultura russa é de uma beleza, de uma profundidade muito grande, e não deve ser apagada por problemas políticos. Eles tiveram anos sombrios – políticos – na Rússia, mas o legado sempre permaneceu assim, disponível".
7. "Eu não estava pensando em imperialismo quando disse isso, falei de cultura, e a transmissão da cultura nunca é 'imperial', nunca; é sempre um diálogo, e eu estava falando disso".
8. "É verdade que há imperialismos que querem impor a sua ideologia. Vou me deter nisto: quando a cultura é 'destilada' e transformada em ideologia, esse é o veneno. A cultura é usada, mas destilada em ideologia".
9. "Isto deve ser distinguido: quando se trata da cultura de um povo e quando se trata das ideologias que surgem de algum filósofo, de algum político desse povo".
10. "E digo isto para todos, inclusive para a Igreja: colocam-se, por vezes, dentro da Igreja ideologias que a separam da vida que vem da raiz e sobe; desprenda a Igreja da influência do Espírito Santo".
11. "Uma ideologia é incapaz de encarnação, é apenas uma ideia. Mas quando a ideologia ganha força e vira política, geralmente vira ditadura, vira incapacidade de dialogar, de avançar com as culturas. E os imperialismos fazem isso. O imperialismo está sempre consolidado com base em uma ideologia. Devemos também distinguir na Igreja entre doutrina e ideologia: a verdadeira doutrina nunca é ideológica, nunca; está enraizada no santo povo fiel de Deus; ao contrário, a ideologia está descolada da realidade, descolada do povo".
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As opiniões de Francisco são legítimas e úteis, mas não são magistério papal. O exemplo do pensamento de Francisco sobre a “grande Rússia” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU