Francisco reivindica o “Façam bagunça” em seu primeiro encontro com a juventude: “Busquem e arrisquem-se”

Jovens se divertem na JMJ 2023, em Portugal (Foto: JMJ Lisboa 2023 | Flickr)

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03 Agosto 2023

  • "Não estamos doentes, mas sim vivos! Preocupemo-nos, ao invés disso, quando estamos dispostos a trocar o caminho a percorrer por nos determos em qualquer oásis, mesmo que essa comodidade seja uma miragem; quando substituímos os rostos pelas telas, o real pelo virtual; quando, em vez das perguntas que nos despedaçam, preferimos as respostas fáceis que nos anestesiam."

  • "Se as sementes se preservassem, desperdiçariam completamente seu poder gerador e nos condenariam à fome; se os invernos se preservassem, não haveria a maravilha da primavera. Portanto, tenham a coragem de substituir os medos pelos sonhos; não sejam administradores de medos, mas empreendedores de sonhos!"

  • "Por favor, não caiam na armadilha das visões parciais. Não se esqueçam de que precisamos de uma ecologia integral; precisamos ouvir o sofrimento do planeta junto com o dos pobres; precisamos colocar o drama da desertificação ao lado do dos refugiados, o tema das migrações junto ao declínio da natalidade; precisamos nos preocupar com a dimensão material da vida dentro de uma dimensão espiritual. Não criar polarizações, mas visões de conjunto."

  • "O cristianismo não pode ser concebido como uma fortaleza cercada por muros, que ergue seus bastiões diante do mundo."

A reportagem é de Jesús Bastante, publicada por Religión Digital, 03-08-2023.

Primeiro encontro do Papa Francisco com a juventude em Portugal. Dez anos após o 'Façam bagunça', um Bergoglio muito mais exausto fisicamente, mas com a mesma força mental, reivindicou novamente o 'espírito do Rio' com uma mensagem clara para mais de dois mil jovens universitários católicos reunidos esta manhã na Universidade Católica Portuguesa: "Busquem e arrisquem-se", "tenham a coragem de substituir os medos pelos sonhos, não sejam administradores de medos, mas empreendedores de sonhos!"

Com citações de Fernando Pessoa, Sophia de Mello e José de Almada Negreiros, e, como ocorrerá ao longo de toda a viagem, em espanhol, o que deu origem a improvisações, Bergoglio traçou um discurso direto, convidando a "deixar de lado a rotina cotidiana e embarcar em uma jornada com um propósito". Assim como os peregrinos que vão a Fátima ou à não tão distante Compostela, o Papa convidou os universitários a unirem o conhecimento científico à busca espiritual.

Não às fórmulas pré-fabricadas

"Desconfiemos das fórmulas pré-fabricadas, das respostas que parecem estar ao alcance da mão, tiradas da cartola como cartas de jogo viciadas; desconfiemos dessas propostas que parecem dar tudo sem pedir nada", clamou o Papa, apontando os verbos dos peregrinos: buscar e arriscar.

"Não nos alarmemos se nos sentimos interiormente sedentos, inquietos, incompletos, desejosos de sentido e de futuro, com saudades do futuro!", explicou Bergoglio. "Não estamos doentes, mas sim vivos! Preocupemo-nos, ao invés disso, quando estamos dispostos a trocar o caminho a percorrer por nos determos em qualquer oásis, mesmo que essa comodidade seja uma ilusão; quando substituímos os rostos pelas telas, o real pelo virtual; quando, em vez das perguntas que nos despedaçam, preferimos as respostas fáceis que nos anestesiam", advertiu.

"Busquem e arrisquem", repetiu Francisco, neste momento histórico em que "os desafios são enormes e os lamentos dolorosos, mas abraçamos o risco de pensar que não estamos em uma agonia, mas sim em um parto; não no fim, mas sim no começo de um grande espetáculo".

Substituir os medos pelos sonhos

"A autopreservação é uma tentação, um reflexo condicionado pelo medo, que nos faz olhar para a existência de forma distorcida", enfatizou o Pontífice, advertindo que "se as sementes se preservassem, desperdiçariam completamente seu poder gerador e nos condenariam à fome; se os invernos se preservassem, não haveria a maravilha da primavera. Portanto, tenham a coragem de substituir os medos pelos sonhos; não sejam administradores de medos, mas sim empreendedores de sonhos!"

Focando no modelo universitário, Francisco rejeitou o "atual sistema elitista e desigual do mundo, em que o ensino superior é um privilégio para poucos". "Se aquele que recebeu uma instrução superior - que hoje, em Portugal e no mundo, continua sendo um privilégio - não se esforça para retribuir algo do que recebeu, no fundo não compreendeu o que lhe foi oferecido", apontou, referindo-se às perguntas que Deus fez a Caim no Gênesis. "Perguntemo-nos: onde estou? Estou enclausurado em minha bolha ou corro o risco de sair de minhas seguranças para ser um cristão praticante, um artesão da justiça e da beleza? E também: onde está meu irmão?"

"Vocês, queridos estudantes, peregrinos do saber, o que gostariam de ver realizado em Portugal e no mundo? Que mudanças, que transformações? E de que maneira a universidade, especialmente a católica, pode contribuir para isso?", perguntou o Papa, agradecendo os testemunhos de Beatriz, Mahoor, Mariana e Tomás, e sua "carga de entusiasmo realista", que os torna "protagonistas da mudança".

Mestres em compaixão

"Também este velho que vos fala sonha que a vossa geração seja uma geração de mestres: mestres em humanidade, mestres em compaixão, mestres em novas oportunidades para o planeta e seus habitantes, mestres da esperança", enfatizou o 'velho' Bergoglio.

Um dos maiores problemas está na "urgência dramática de assumir a responsabilidade pela casa comum", para o qual é necessária "uma conversão do coração e uma mudança na visão antropológica que está na base da economia e da política".

"Não podemos nos contentar com medidas paliativas simples ou com compromissos tímidos e ambíguos", rejeitou o Papa, citando a Laudato Si', e clamando por "redefinir o que chamamos de progresso e evolução".

Vocês são a geração

"Em nome do progresso, abriu-se caminho para uma grande regressão", denunciou Francisco, insistindo com os jovens: "Vocês são a geração que pode vencer este desafio, têm os instrumentos científicos e tecnológicos mais avançados, mas, por favor, não caiam na armadilha das visões parciais. Não esqueçam que precisamos de uma ecologia integral; precisamos ouvir o sofrimento do planeta junto com o dos pobres; precisamos colocar o drama da desertificação em paralelo ao dos refugiados, o tema das migrações junto ao declínio da natalidade; precisamos nos preocupar com a dimensão material da vida dentro de uma dimensão espiritual. Não criar polarizações, mas sim visões de conjunto".

"Não pode haver futuro em um mundo sem Deus", concluiu Bergoglio, pedindo aos jovens que "tornem a fé credível por meio de suas decisões", sendo convincentes, porque "não basta que um cristão esteja convencido, ele deve ser convincente".

O Pacto Educativo Global e o risco da ideologia

Porque "o cristianismo não pode ser concebido como uma fortaleza rodeada de muros, que ergue seus bastiões diante do mundo", acrescentou, chamando a "recuperar o sentido da encarnação". "Sem a encarnação, o cristianismo se torna uma ideologia; é a encarnação que nos permite maravilhar-nos com a beleza que Cristo revela através de cada irmão e irmã, de cada homem e mulher", delineou, reivindicando que "a contribuição feminina é indispensável", e adotando a iniciativa do "Pacto Educativo Global e os sete princípios que estabelecem sua arquitetura, incluindo muitos desses temas, desde o cuidado com a casa comum até a plena participação das mulheres, a fim de alcançar a necessidade de encontrar novas formas de entender a economia, a política, o desenvolvimento e o progresso".

"Ser uma universidade católica significa, acima de tudo, que cada elemento está em relação com o todo e que o todo se encontra nas partes. Dessa forma, enquanto adquirem competências científicas, amadurecem como pessoas, no conhecimento de si mesmos e no discernimento do próprio caminho", concluiu o Papa, gritando novamente "adiante!" e lembrando a saudação dos peregrinos de ida e volta a Santiago: "Ultreia" e "et Suseia", duas expressões "para continuar a busca e o risco de caminhar, encorajando-se mutuamente: 'Vamos, ânimo, siga em frente!' Isso é o que também lhes desejo, de todo o coração".

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