14 Julho 2023
Há um desaparecimento na Igreja sinodal – pelo menos no papel – do matrimônio e dos esposos. Uma “Igreja-família” sem família?
A reflexão é de Simone Sereni, leigo italiano e secretário de redação da revista La Civiltà Cattolica. O artigo foi publicado em Settimana News, 12-07-2023. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Na terça-feira, 20 de junho, foi publicado o documento de trabalho – o Instrumentum laboris – do próximo Sínodo sobre a “sinodalidade”. Eu fiz uma rápida rolagem pelo texto. E tirei algumas primeiras impressões que relato como tais, ainda não aprofundadas.
Registro com satisfação, entre os pontos positivos, a codificação do chamado método da “conversação espiritual”. Uma ótima resposta às fofocas sobre as quais o papa fala frequentemente e uma indicação pastoral a ser conservada para remediar a pouca atenção que, em muitas situações eclesiais, é dada a uma verdadeira escuta, não superficial e protegida.
No entanto, anoto também o desaparecimento, na Igreja sinodal – pelo menos no papel –, do matrimônio e dos esposos. Onde se fala de uma Igreja missionária “toda ministerial” e de corresponsabilidade, soa estranho. Uma “Igreja-família” (muito bem), sem família?
A palavra “casamento” é usada apenas uma única vez, para se referir ao casamento polígamo. A palavra “esposos”, nunca.
A palavra “família” (ou “famílias”) continua sendo utilizada predominantemente como “objeto” de atenção no texto principal, salvo uma referência em forma de pergunta que mencionarei daqui a poucas frases nas fichas de trabalho, enquanto nos outros casos são usadas duas expressões com referência à “família humana” e à “Igreja como família”.
A palavra “casal”, na verdade no plural, é usada em poucas ocorrências, também apenas nas fichas de trabalho, entre os possíveis pontos de oração e de reflexão. Em particular, em um caso com relação ao papel ecumênico dos casais “interconfessionais” (interessante).
No segundo, ela reaparece na nova reformulação de um mantra que procede desde o fim do Concílio, sem até agora ter me pacificado muito: “As sínteses das Conferências Episcopais e das Assembleias continentais apelam fortemente a uma ‘opção preferencial’ pelos jovens e pelas famílias, que os reconheça como sujeitos e não como objetos de cuidado pastoral”.
Não creio que a redução aos termos mínimos do matrimônio e do papel eclesial dos esposos se deva à vontade de não entrar em conflito com a nova e bem-vinda sensibilidade para com as pessoas LGBTQ+.
Penso justamente que seja uma negação constante, na história e na vida da Igreja. Uma dificuldade, talvez um incômodo embaraçoso, em reconhecer ao matrimônio a dignidade eclesiológica que ele merece. Espero que alguém leve essa observação ao Sínodo.
Pessoalmente, continuo com esta "visão" de 10 anos atrás [em italiano], de uma Igreja que “sabe fazer casa”... Serei o último japonês na selva?
Não nos desesperemos! Ainda não chegamos ao fundo da crise do Cristianismo. Mas o renascimento já começou com as mulheres e famílias das nossas comunidades que vivem na periferia do império. O sínodo dos eleitos e sobretudo a oligarquia gerontocrática e machista são o sinal de um velho mundo eclesial que está morrendo. Nascem coisas novas em um Cristianismo ainda bem enraizado na consciência de mulheres e homens livres em Cristo que não devem nada a cardeais e diplomacias vaticanas. Vejo a ternura de Deus nos abraços e beijos de uma mãe e de um pai aos filhos. Vejo-a na alegria de dois namorados de mãos dadas, em um casal de avós que caminham abraçados. Não vejo a ternura de Deus nos frios e insignificantes sinais de paz de bispos e padres concelebrantes, talvez depois de terem pregado e dado tantos bons conselhos a pais e mães. Pregam sobre a família ideal que não existe, como indivíduos, como adolescentes que não querem crescer, como narcisistas incuráveis. Eles têm as chaves, mas não abrem, e o pior é que impedem que outros abram! Maranatha.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Uma Igreja sinodal precisa de esposos e famílias? Artigo de Simone Sereni - Instituto Humanitas Unisinos - IHU