10 Mai 2023
"A justiça é a chave com a qual o protestantismo hoje pode falar de trabalho e de ética do trabalho", escreve Paolo Naso, sociólogo italiano da Comissão de Estudos da Federação das Igrejas Evangélicas na Itália e professor da Universidade de Roma “La Sapienza”, em artigo publicado por Riforma, semanário das Igrejas Evangélicas Batistas Metodistas e Valdenses, 12-05-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
No último dia 1º de maio, a Itália comemorou o Dia do Trabalho.
Uma oportunidade para reafirmar o princípio constitucional da centralidade do trabalho. Mas o que significa que a Itália é uma república democrática fundada no trabalho, como lemos no primeiro artigo da Constituição? Quatro palavras extremamente densas em significado: Itália, ou seja, uma comunidade civil com identidade própria e específica, filha de uma história particular. República, para sublinhar a virada em relação ao passado monárquico e as razões pelas quais, juntamente com o fascismo a que ligara seus destinos, com o fim da guerra havia caído também a monarquia dos Saboia. Democrática, para ressaltar que a nova Itália não só pós-fascista, mas também antifascista, quer colocar no centro o povo e a sua soberania, o que se expressa em específicos processos parlamentares. Mas hoje queremos nos deter brevemente na quarta palavra: trabalho.
O motor que anima e move a nova Itália republicana e democrática é o trabalho, considerado o instrumento essencial para garantir a dignidade de homens e mulheres, cidadãos e cidadãs. O trabalho como motor de um país que acredita poder crescer e consolidar-se somente graças à energia, à criatividade, às competências, à determinação de quem desempenha uma função.
O trabalho como um elemento de justiça social que faz uma varredura das riquezas e privilégios das classes abastadas e que coloca todos em condições de melhorar sua condição social.
Essa ideia do trabalho é filha das grandes culturas políticas que se encontraram na elaboração da Carta Constitucional: a católica que se expressava no partido da Democracia Cristã, aquela socialista, aquela comunista e aquela liberal.
No entanto, essa ideia de trabalho tem mais do que alguns pontos de contato com outra tradição, a protestante: absolutamente minoritária na Itália, mas muito sólida em outros países europeus, basta pensar no trabalhismo inglês e na contribuição dos evangélicos metodistas na construção dos primeiros sindicatos; ou nas culturas políticas que, no pós-guerra, orientaram países de tradição protestante como a Alemanha ou os países escandinavos.
Entre os aspectos mais revolucionários da Reforma Protestante do século XVI está uma nova concepção do trabalho, uma nova ética do trabalho, segundo uma conhecida fórmula sociológica. Trabalhar não é uma condenação, mas uma das formas com que o crente, mesmo fora do convento, pode celebrar a glória de Deus, valendo-se dos dons de inteligência, criatividade e habilidade que recebeu. Não mais esforço, portanto, mas vocação, chamado a um serviço ao mesmo tempo mundano e espiritual. A laboriosidade das classes burguesas de Genebra e outras cidades reformadas tornou-se assim o paradigma da ética protestante do trabalho.
E hoje? No tempo dos motoboys e dos call centers, do trabalho precário e da exploração dos migrantes que trabalham dez horas por dia por 20 ou 30 euros, que sentido tem essa ideia, essa ética protestante do trabalho? Tem pouco sentido, convenhamos. Muito trabalho no sistema econômico atual não garante nem dignidade nem abre espaços de crescimento social. É exploração e, para usar um termo obsoleto, alienação.
Então, como o protestantismo pode falar sobre trabalho? Vamos tentar uma resposta ou melhor, vamos tentar indicar um caminho de reflexão: reivindicando justiça.
Justiça nos salários; justiça na segurança de quem sobe em andaimes ou opera uma máquina complexa; justiça em turnos que não destruam a vida de uma família; justiça na proteção de quem perde o emprego; justiça na sustentação das pessoas com deficiência que não podem trabalhar ou podem fazê-lo apenas em determinadas condições; justiça na luta contra a precarização que não permite planejar a própria vida. E quando não há trabalho? Justiça para que quem não tem acesso ao trabalho não seja deixado sozinho, mas seja estimulado a prestar um serviço à comunidade que o sustenta. A justiça é a chave com a qual o protestantismo hoje pode falar de trabalho e de ética do trabalho.
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Ética protestante e precarização. Artigo de Paolo Naso - Instituto Humanitas Unisinos - IHU