19 Abril 2023
Perplexidades e preocupações sobre o funcionamento da Pontifícia Comissão para a Tutela dos Menores, também expressas por escrito, às quais, no entanto, nunca recebeu resposta. Contribuições ao debate que, no entanto, foram "interpretadas por alguns como ataques pessoais". Essas são as motivações que levaram o padre Hans Zollner a renunciar ao cargo de membro da Pontifícia Comissão para a Tutela dos Menores, órgão criado pelo Papa em 2014 para combater o flagelo dos abusos do clero.
A reportagem é publicada por Agência SIR, 17-04-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
O próprio padre jesuíta alemão explicou isso na tarde desta segunda-feira, convocando uma entrevista coletiva na Imprensa Estrangeira em Roma. “Para ser sincero, não foi fácil para mim, de forma alguma, deixar a Pontifícia Comissão para a Tutela dos Menores e enfrentar publicamente os problemas existentes”, disse ele.
“Muitas vezes me fiz as seguintes perguntas: esse gesto corresponde ao espírito de equipe e à discrição, necessários a qualquer trabalho em grupo? Prejudico o Santo Padre com a minha decisão? Vivi semanas e meses de tensão interior para encontrar uma resposta certa para essas perguntas. Uma coisa é certa, vários membros deixaram a Pontifícia Comissão antes de mim e não faltaram críticas recentemente expressas publicamente por ex-membros, algumas bastante fortes”.
"As observações de minha parte", explica o padre Zollner, "não têm propósito polêmico e não querem prejudicar a Comissão, mas visam desenvolver e melhorar internamente o trabalho e o funcionamento da Pontifícia Comissão em sintonia com as preocupações das vítimas que foram feridos por abusos dentro da Igreja e de acordo com as preocupações do Santo Padre".
O padre Zollner conta que nos últimos dias recebeu "um grande e comovente encorajamento" de numerosas vítimas, colegas acadêmicos e representantes da Igreja em todo o mundo, mas "não faltaram conselhos de quem em boa-fé sugere não dizer nada em público. Para mim esta não é uma alternativa porque significaria confundir o trabalho de equipe com a cumplicidade, a discrição com o encobrimento, a lealdade com o servilismo”.
O padre Zollner destaca a "enorme importância" da Pontifícia Comissão na luta contra os abusos. Tem um "valor intrínseco" que não pode ser substituído por nada, nem pelo Dicastério para a Doutrina da Fé que é o principal tribunal competente para as acusações de abusos em menores, nem das outras instituições acadêmicas, como o Centro de Proteção dos Menores que desde 2012 o jesuíta dirige na Pontifícia Universidade Gregoriana.
“É com pesar que percebo que as minhas contribuições são interpretadas por alguns como ataques pessoais”, acrescenta. “Essa não era e não é a minha intenção. Se alguém se sentir atingido, sinto muito e gostaria de me desculpar aqui agora." Aos jornalistas, o padre Zollner reiterou repetidamente que quer abster-se de fazer "avaliações sobre as pessoas envolvidas nos processos em questão, sobre suas intenções e motivações", mas "só quer explicar como as coisas aconteceram".
A este propósito, recorda as três questões fundamentais que “são essenciais na luta contra os abusos: transparência, comprometimento e responsabilização”. A partir de maio de 2022, “em 4 ocasiões”, o jesuíta manifestou por escrito à direção da Comissão “preocupações” em relação precisamente a esses princípios. “Não recebi nenhuma resposta”, recorda o jesuíta e continua: “Apresentei a minha demissão ao Papa Francisco” que a recebeu a 12 de janeiro. “O Santo Padre ouviu minhas preocupações, mostrou compreensão e aceitou meu pedido de renúncia. A carta de confirmação assinada pelo card. Parolin com data de 14 de março me foi enviado por e-mail em 29 de março pela Pontifícia Comissão”.
A transparência - explica Zollner - é "a base de uma Igreja sinodal que permite a participação de muitos". O comprometimento é “a base da justiça pela qual as regras se aplicam a todos e da mesma forma e não de forma arbitrária”. A responsabilização é "a base do respeito recíproco e fraterno". “Quando há falta de transparência, comprometimento e responsabilização, abrem-se as portas para abusos e encobrimentos. A Pontifícia Comissão se propôs a combater essas terríveis realidades. Se quiser fazer isso de forma credível, não pode deixar de se orientar por esses mesmos princípios”.
Respondendo às perguntas dos jornalistas, o jesuíta levanta a questão do papel pouco claro, por exemplo, dos membros dentro da Pontifícia Comissão. "Entendo que neste momento há tantas coisas novas para enfrentar - explica - mas se não se sabe pelo que se é responsável, se não se tem clareza sobre as tarefas precisas, sobre o que se deve falar, ser responsável, se não está claro quem avalia e com que critérios”, essa situação “confunde e também cria uma dificuldade para o outro aspecto que é a transparência”.
O jesuíta também vê pouca clareza na nomeação dos membros. “Não questiono a qualidade dos membros”, afirma. Mas é preciso entender com quais “razões e critérios” é levado adiante o processo de seleção de candidatos. Zollner, assim, aponta o Papa Francisco como “um exemplo absoluto de como a Igreja deve ser”. E acrescenta: “Além das regras, além das instituições, além das diretrizes, a Igreja deve cuidar das pessoas e deve escutar e não fugir e defender-se como primeira reação. E muitas pessoas, inclusive eu, não entendem porque é tão difícil sentar à mesa e escutar, sem responder, mas estar com as pessoas e com as suas feridas. Quando me falam, você é a primeira pessoa que me escutou, para mim é uma dor muito grande”.
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Abusos: padre Zollner, “se faltar transparência, comprometimento e responsabilização, as portas se abrem a acobertamentos” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU