O teto, o arcabouço e o sapo. Artigo de José Luis Fevereiro

Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebon | Agência Brasil

Mais Lidos

  • A luta por território, principal bandeira dos povos indígenas na COP30, é a estratégia mais eficaz para a mitigação da crise ambiental, afirma o entrevistado

    COP30. Dois projetos em disputa: o da floresta que sustenta ou do capital que devora. Entrevista especial com Milton Felipe Pinheiro

    LER MAIS
  • "A ideologia da vergonha e o clero do Brasil": uma conversa com William Castilho Pereira

    LER MAIS
  • O “non expedit” de Francisco: a prisão do “mito” e a vingança da história. Artigo de Thiago Gama

    LER MAIS

Revista ihu on-line

O veneno automático e infinito do ódio e suas atualizações no século XXI

Edição: 557

Leia mais

Um caleidoscópio chamado Rio Grande do Sul

Edição: 556

Leia mais

Entre códigos e consciência: desafios da IA

Edição: 555

Leia mais

17 Abril 2023

"Manter a EC 95 seria a morte súbita do governo. Porém, ao impor uma dieta ao Estado, proposta de Haddad capitula à mesma lógica de “austeridade” em um momento político decisivo. Sem perceber, Lula pode ser cozinhado em fogo brando", escreve José Luis Fevereiro, economista formado pela UFRJ e membro da Direção Nacional do PSOL desde 2007, em artigo publicado por Outras Palavras, 14-04-2023. 

Eis o artigo.  

A proposta de Novo Arcabouço Fiscal (NAF) de Fernando Haddad tem sido o centro dos debates. Posto um falso problema, “a dívida pública”, debate-se a falsa solução.

A esquerda perdeu o debate de fundo sobre o que é déficit publico e dívida pública de um Estado com moeda soberana. A versão dos neoliberais se tornou tão hegemônica que contagia amplos setores da esquerda. Uns que buscam saídas para o falso problema dentro do receituário liberal, outros, com retórica à esquerda, sonham com a reedição de um Plano Collor com nova suspensão do pagamento da dívida. Os liberais, no entanto, sabem exatamente o que querem. Tem completa noção que a dívida não é problema, mas buscam iludir os incautos para obter vantagens. Usam o espantalho da “necessidade de controlar os gastos públicos”, não porque achem necessário reduzir a dívida pública, mas porque lhes é funcional um Estado com baixa capacidade de investimento.

Um governo popular com liberdade de definir seu nível de gastos buscará nivelar estes gastos num patamar capaz de se aproximar do pleno emprego da força de trabalho. Nesta situação, o Trabalho melhora muito seu poder de barganha em relação ao Capital, conseguindo ganhos salariais acima do crescimento da produtividade e consequentemente avançando sobre a parcela da renda do Capital. Um Estado com capacidade de gastos poderá avançar na universalização do atendimento de saúde com qualidade, reduzindo o espaço da saúde privada e dos planos de saúde, portanto limitando um espaço para a reprodução ampliada do Capital. Um Estado com capacidade de gastos poderá universalizar a educação pública em todos os níveis, reduzindo o espaço da educação privada. Um Estado com capacidade de gastos poderá assumir os investimentos necessários em infraestrutura, eliminando o espaço para as Parcerias Público Privadas (PPP).

A ofensiva buscando cercear a capacidade de gastos do Estado foi pesada. Ganharam a opinião pública com a generalização da “economia da dona de casa”, colonizaram parte da esquerda, impuseram uma autolimitação à União, sempre com nomes e adjetivos pomposos: Lei de Responsabilidade Fiscal, austeridade, responsabilidade, dever de casa e, por fim, aplicaram o garrote com a Emenda Constitucional 95 do Teto de Gastos. Face à óbvia falência do Teto, só sustentada até aqui pelo desmonte da gestão pública e pelo brutal arrocho salarial ao funcionalismo, tornou-se necessária a sua revisão. A disputa que se abre agora definirá os rumos políticos dos próximos anos. A proposta de Fernando Haddad é péssima. Ao estabelecer que o gasto da União só poderá crescer até 70% do crescimento da arrecadação, mesmo assim subordinado a um teto de 2,5%, Haddad constrói uma dieta de emagrecimento da União para os próximos anos. Ano a ano, a participação do setor público no PIB diminuirá.

A reforma fiscal do governo Lula em debate