Em conferência dentro do Ciclo de Estudos sobre Saúde Digital, Robert Richter abordará o estresse digital e seus bioindicadores
Em artigo, recentemente publicado pelo IHU, em que reflete sobre a entrada de nossa civilização na era do algoritmo, ao apresentar o livro Entrando na civilização de algoritmos, de Pierre Giorgini e Thierry Magnin (Santuário, 2022), Márcio Fabri dos Anjos, especialista em Bioética, professor emérito da PUC-SP e membro da RedBioética/UNESCO, aponta:
“O que Polanyi dizia do tácito trabalho mental em reunir experiências por categorias ao elaborar conhecimento, agora a máquina o faz em dimensões globais, como num rápido gesto mágico. A robótica na execução de tarefas profissionais vem mostrando crescente superioridade diante da habilidade humana em velocidade, precisão e eficiência”.
Entrando na civilização de algoritmos, de Pierre Giorgini e Thierry Magnin (Santuário, 2022)
A frase em Michael Polanyi está num contexto reflexivo em como a transformação tecnológica repercute drasticamente em nossas vidas, especialmente desde nossas atividades profissionais. Estaria, quem sabe, ele dizendo que a substituição do trabalho humano por máquinas poderia ser um fator gerador de estresse? Bem, isso pode não estar na elaboração de Polanyi, mas, por óbvio que a robotização das fábricas, que não é algo novo, já demonstrou isso. O problema é que agora não estamos mais falando de grandes indústrias, estamos falando de nosso cotidiano e de atividades que exigem um grande esforço intelectual. Pesemos, então, por exemplo, no trabalho acadêmico.
Michael Polanyi (1891-1976) foi um polímata húngaro-britânico que fez contribuições teóricas importantespara a físico-química, economia e filosofia | Foto: Wikipédia
Em outros tempos, discutir um conceito requeria uma boa ida até a biblioteca. E com tempo e disposição para garimpar autores que já trataram do conceito. Depois, horas e horas de pestanas gastas sobre as páginas, muitas anotações e, quando quase soterrados entre livros e anotações, se começava a escrever. Hoje, 20 minutinhos de uma leve navegada no Google se consegue um substancial número de referências. Depois, nada de leitura, é só dar CRTL + F (ou CRTL + L, dependendo do software) que a ferramenta de busca nos salta aos olhos. Digita-se ali o famigerado conceito e se lê somente as frases, talvez o parágrafo, que o circundam. Vendo dessa forma, parece uma facilidade, mas será?
O educador, ex-governador, ex-senador e ex-ministro da Educação Cristovam Buarque, em entrevista concedida em 2015 ao IHU, já dizia: “Entramos em um tempo em que as pessoas ficam lendo pedaços de livros e não leem os livros fundamentais, os chamados canos, o cano da cultura. Ficamos lendo coisas superficiais e em pedaços”. Assim, além de efetivamente não apendermos, não geramos nada efetivamente reflexivo, tecendo apenas uma colcha de retalhos conceituais.
Agora, observe que nem esse tipo de trabalho maquínico tem nos liberado mais tempos para descanso ou deleite de qualquer natureza. Pelo contrário, emendamos um texto no outro, um trabalho no outro, produzindo cada vez mais e mais, fazendo Chaplin em Tempos Modernos parecer brincadeira de criança. O que sobra? Quase nada de conteúdo e muita estafa, estresse.
Esse cenário que trouxemos é apenas um em milhares. Com a experiência do distanciamento social forçado pela pandemia de Covid-19, acabamos introjetando mais horas e horas diante de máquinas, e agindo como muitas delas. Reuniões e encontros presenciais viram algo de extremo luxo, situações especiais e quase raras. Vamos de meets e calls que, como aponta reportagem reproduzida no site do IHU, acaba nos gerando ainda mais estresse.
A questão que fica é: seja pela substituição de nosso trabalho por máquinas, seja pelo aumento da demanda de trabalho em decorrência do ganho de tempo no uso das tecnologias, vivemos em tempos deum estresse digital? A inteligência digital veio para esvaziar nossos corações e mentes? As perguntas são algumas entre tantas que devem pautar o bate-papo com Robert Richter, mestre em Engenharia Médica pela Universidade de Erlangen-Nuremberg, na Alemanha, no próximo dia 15, às 10h. Integrando a programação do Ciclo de Estudos sobre Saúde Digital, ele proferirá a conferência “Estresse Digital e seus Biomarcadores”.
Bacharel e mestre em Engenharia Médica pela Universidade de Erlangen-Nuremberg, foi pesquisador assistente no Massachusetts Institute of Technology, EUA, no grupo de Ambientes Responsivos.
Robert Richter | Foto: portabiles.de
Atualmente, é professor no Laboratório de Psicologia Digital e pesquisador no Laboratório de Aprendizagem da Máquina e Análise de Dados da Universidade de Erlangen-Nuremberg, candidato a doutorado no Departamento de Inteligência Artificial e Engenharia Biomédica da mesma instituição. Tem trabalhado com temas como: reconhecimento de padrões, processamento de imagens e sinais e interação humano-computador na área biomédica.