23 Junho 2022
“Os bispos têm razão em soar o alarme sobre as agromáfias. Não devemos tapar os nossos olhos. O problema existe, devemos identificá-lo e saber enfrentá-lo. Até porque, na agricultura, em relação a outros setores, as máfias não competem entre si, mas dividem os lucros ilícitos, formam um cartel. Por isso, devemos conseguir nos mover juntos apesar das diferenças, porque a situação agrícola é muito mais complexa do que em outros lugares.” Essa é a análise de Luca Raffaele, diretor geral da NeXt-Nuova Economia per Tutti, uma associação que cria redes entre associações, empresas, administrações públicas, escolas, universidades e cidadãos.
A reportagem é de Antonio Maria Mira, publicada em Avvenire, 22-06-2022. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Justamente os cidadãos são convidados pela Igreja italiana a terem um papel ativo na luta contra as agromáfias.
O papel dos consumidores é fundamental. É necessária uma ação de cidadania ativa, mas não basta o gesto individual. É necessária uma coordenação tanto dos cidadãos individuais quanto das organizações. Vemos grandes campanhas de associações com o slogan “Não à contratação ilegal”, mas depois as pessoas pensam que a cadeia de compras não lhes diz respeito. Em vez disso, o verdadeiro desafio é ser um consumidor responsável, mas também ter organizações responsáveis.
Com que instrumentos?
Com a educação do consumidor, porque, se há um preço tão baixo, outra pessoa em outra parte da Itália ou do mundo está pagando por isso. Decomponhamos o preço, façamos os cálculos e mostremo-los, porque só assim os cidadãos entendem. Caso contrário, contamos um modo ideal que favorece apenas alguns.
Os bispos também chamam as instituições a apoiarem as empresas virtuosas. Não é uma distorção do mercado?
O incentivo por si só vicia o mercado, mas serve para ativar um processo. O pedido é legítimo, porque, se essas empresas que têm mais custos não tiverem também uma parte de conveniência para agirem, então fica difícil falar em grandes números. Assim, teremos apenas os casos mais virtuosos. Mas, com poucos casos virtuosos, não mudamos o sistema.
Mas quem ajudar?
Conhecemos bem o modelo errado que provoca a exploração, mas ainda não se criou o modo para apoiar de modo constante e não episódico as empresas que trabalham bem. Em primeiro lugar, devemos identificar aquelas que não só se opõem à contratação ilegal no campo, mas que também são sustentáveis. São necessários indicadores para entender efetivamente os pontos fortes daqueles que trabalham bem, mas também as áreas de melhoria. Não existem apenas os bons e os maus.
Como fazer com que não haja apenas uma elite de pessoas boas e éticas? Só o pequeno é bom ou o grande também?
O pequeno é bom se estiver em rede. Não devemos forçar a mão para que os pequenos se tornem grandes, porque algumas realidades não têm a estrutura para se sustentar. Mas devemos deixar claro que podemos trabalhar no mercado, não permanecendo como oásis de felicidade para poucos clientes que não mudam o sistema. Portanto, são necessários contratos de rede, de cadeia produtiva, pactos de colaboração, fórmulas que permitam que as empresas não se desnaturalizem. Os grandes não devem ser demonizados, porém, devemos favorecer processos em rede, porque, sozinhos, não vamos a lugar nenhum. A lógica do duro e do puro não funciona.
E, juntos, combatem-se melhor as agromáfias...
Exatamente. A ilegalidade na agricultura não é mais apenas material, não diz respeito apenas ao produto. Por isso, devemos fazer com que todas as atividades da cadeia produtiva sejam rastreadas e analisadas, porque senão contamos apenas a última milha, e isso é um problema. Precisamos prestar atenção a todo o caminho e fazer isso juntos, porque o assunto é tão complexo que não pode ser enfrentado por navegadores solitários. Quando falamos de agricultura e de luta à contratação ilegal no campo, falamos da nossa vida, dos nossos territórios. Isso diz respeito a todos nós.
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Agromáfias: ilegalidade e crime na agricultura. Entrevista com Luca Raffaele - Instituto Humanitas Unisinos - IHU