21 Abril 2022
"Pedimos nesta Páscoa que o Senhor nos coloque novamente em caminho, aliás, que nos faça voltar a correr. Se chegamos a esta Páscoa com todo o cansaço dos anos difíceis que nos viram encerrados dentro das casas, perdidos e impotentes diante do mal, da violência e da guerra, agora podemos voltar a correr. A vida não acabou, está sempre no começo", escreve Antonio Torresin, pároco da Igreja de San Vito al Giambellino, em Milão, em artigo publicado por Settimana News, 17-04-2022. A tradução de Luisa Rabolini.
Antes do sol nascer, algo já está se movendo, de fato, aliás, há gente que corre. As mulheres correm para trazer os unguentos, corre Maria de Magdala, correm também Pedro e o discípulo amado a quem Maria chama; todo mundo está correndo, mas onde eles estão indo com tanta pressa?
Justamente eles, que antes estavam observando de longe – como as mulheres – ou haviam fugido – como os discípulos, agora correm. Qual é a pressa? O que os tirou do seu torpor?
Eles correm enquanto ainda está escuro, a luz ainda não nasceu no horizonte; parecem querer "despertar a aurora" como diz o salmo. Belo paradoxo: deveria ser o sol que nos desperta! Ainda assim, nada teria acontecido se eles não tivessem se mexido para ir ao encontro da luz. Só quem procura pode encontrar, e só quem corre ao seu encontro recebe o anúncio da ressurreição.
Maria Madalena e Jesus (churchofjesuschrist.org)
Mas o que leva essas mulheres (porque são elas as primeiras) a desafiar a noite? Não está tudo acabado? Não está certo quem pensa que agora não há mais nada a fazer, que afinal um cadáver não pode fugir e, portanto, não há pressa se for apenas uma questão de elaborar um luto e uma perda definitiva?
Nesta urgência que move as mulheres, que impele Maria a correr, talvez exista um presságio? Uma intuição típica de quem ama e não desiste da perda do amado? Uma intuição de amor sem conteúdo: não sabem o que esperar, o que encontrarão, mas procuram e esperam porque o seu coração não para de bater, porque o amor não se extinguiu completamente.
Elas correm para não perder o contato com aquele corpo - onde o colocaram? - com aquela história de amor, porque sem aquele corpo não podem viver, não poderiam continuar em frente.
A surpresa inesperada é que encontram um túmulo vazio esperando por elas. Aquele corpo que procuravam não está mais lá, e em seu lugar um vazio que a princípio assusta as mulheres, deixa Maria desorientada. O que significa? No início apenas isto: aconteceu mesmo, levaram o seu Senhor, o seu amado.
E o primeiro ato de fé consiste em permanecer diante daquele vazio, entrar - como fazem Pedro e o discípulo amado, mesmo sem entender – tomar conhecimento, aceitar uma perda. Maria o faz com o coração tomado de amargura: fica diante do túmulo vazio, não aceita ir embora, não consegue se afastar daquele vazio.
É difícil ficar diante do túmulo vazio. Para Maria o olhar é velado pelas lágrimas: ela só vê a sua dor, mas terá que atravessar aquele lago de lágrimas como se atravessa o mar para entrar na terra prometida, como se atravessa a morte para entrar na vida. Terá de ver melhor porque no início não reconhece no jardineiro senão um estranho: mas o Senhor sempre se aproxima sem ser conhecido, como um estranho. E como o povo no deserto, diante daquele vazio, as mulheres são dominadas pelo medo.
Por isso, o anúncio da Páscoa é precedido por uma palavra que convida à coragem: “não tenhais medo”, diz o anjo às mulheres.
Atravessar o medo, aguentar o vazio, ver além das lágrimas, além da dor: para que aquele vazio possa falar, possa lhes dirigir uma inesperada e surpreendente palavra de esperança. Da sepultura um bom anúncio, um Evangelho. E eis que justamente daquele túmulo que chega às mulheres uma palavra, um Evangelho, um anúncio.
Essa palavra pascal tem a ver com um passado e um futuro: dá um novo sentido àquela história que parecia ter acabado e que, ao contrário, as aguarda diante delas, as aguarda em um futuro que se abre.
Assim é para as mulheres no sepulcro: a pedra é removida, um anjo - um mensageiro que lhes traz um anúncio, um Evangelho - dirige-lhes estas palavras: “sei que procurais Jesus, que foi crucificado. Ele não está aqui, ressuscitou dos mortos e vai a vossa frente para a Galileia”.
Procurais Jesus, aquele Mestre que vos amou, que encontraste nas estradas da Galileia e que morreu. Não vos parece possível que aquele homem tão único que vos curou, vos deu tanta vida, seja agora aquele crucifixo derrotado sobre o qual a violência parece ter prevalecido. Não está aqui. Ele não é prisioneiro da morte, porque seu fim não foi a negação de sua vida, mas o dom total daquele amor com o qual tudo começou.
E um amor tão completo não termina, não pode ser retido pela morte. Ele vos espera por na Galileia: deveis voltar para onde tudo começou, deveis retomar os primeiros passos de vossa história com ele, deveis entender de novo o que aconteceu e que não é falso. Podereis encontrá-lo na memória de suas palavras e obras, aquelas que, enquanto aconteciam, não conseguíeis entender completamente, mas que agora podeis reencontrar e reviver, porque o Senhor está vivo e vos ainda vivereis com ele para sempre.
Também para Maria de Magdala, o passado deve ser reconectado com o futuro. Ela se sente chamada pelo nome, como da primeira vez, como ninguém a havia chamado com aquela voz, com aquele amor. O início do encontro com o Ressuscitado está escrito na memória viva da sua voz, daquela primeira palavra que deu início a tudo.
Uma memória viva que desperta o amor, que permite atravessar o lago de lágrimas, sair da dor e ver de uma nova forma. Assim reconhece naquele estranho seu Mestre - Rabi - seu amado.
Assim as mulheres correm para a Galileia, com os discípulos, e Maria corre para seus irmãos para levar o anúncio de uma nova vida. Voltar a correr, com um novo coração, com uma nova esperança. Aqueles discípulos, destroçados pelo cansaço, abatidos no sono na noite da provação, fugiram com medo, agora voltam a correr.
Aquelas mulheres desorientadas que seguiam o crucifixo de longe, voltam a correr. Maria de Magdala, que parecia petrificada diante do túmulo, incapaz de se mover, paralisada pela perda de seu Senhor, volta a correr.
Pedimos nesta Páscoa que o Senhor nos coloque novamente em caminho, aliás, que nos faça voltar a correr. Se chegamos a esta Páscoa com todo o cansaço dos anos difíceis que nos viram encerrados dentro das casas, perdidos e impotentes diante do mal, da violência e da guerra, agora podemos voltar a correr. A vida não acabou, está sempre no começo.
A memória do Senhor, das suas palavras e obras, a voz amorosa com que nos chamou da primeira vez, não é falsa: espera-nos à frente, espera-nos num futuro que não conhecemos, mas que é certo e mais forte do que a morte. Podemos correr para o futuro na certeza de que nos espera o Ressuscitado, a vida nova, os irmãos e irmãs que o Senhor sempre reúne de todos os lugares onde estamos dispersos.
Voltar a correr, voltar a amar, voltar a ter esperança, porque o Senhor venceu a morte. O futuro não é mais assustador.
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