“Vocês estão loucos”: manifesto pacifista do Papa Francisco

Povoado de Krasylivka, na Ucrânia, depois de um bombardeio. (Foto: Vatican Media)

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28 Março 2022

 

Do lado de lá, a OTAN, deste lado, o Papa. Lá, os governos, como o de Draghi, definidos como "loucos" em sua ideia de um aumento dos gastos militares, deste lado um manifesto pacifista integral, como pode ser lido no discurso que o Papa Francisco proferiu ontem no Congresso do Centro feminino italiano em Roma (1).

 

A reportagem é de Stefano Cannavò, publicada por Il Fatto Quotidiano, 25-03-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.

 

"Fiquei envergonhado - disse o Pontífice - quando li que um grupo de Estados se comprometeu a gastar dois por cento, creio, ou dois por mil do PIB na compra de armas, como resposta ao que está acontecendo agora. Loucura! A verdadeira resposta, como disse, não são outras armas, outras sanções, outras alianças político-militares, mas outra abordagem, uma forma diferente de governar o mundo”.

As palavras do Papa cortam também as distinções que já nos últimos dias haviam sido apresentadas por alguns observadores sobre a disponibilidade da Igreja de endossar o envio de armas à Ucrânia ou outras iniciativas semelhantes. Em vez disso, as palavras de Francisco são claras: “Acho que para aquelas entre vocês que pertencem à minha geração seja insuportável ver o que aconteceu e está acontecendo na Ucrânia. Mas infelizmente isso é fruto da velha lógica do poder que ainda domina a chamada geopolítica”.

A mentalidade distinta é, por outro lado, encontrada num conjunto de posições diferentes que têm o traço d'união da paz a todo custo: “Esta mudança de mentalidade diz respeito a todos e depende de cada um. É a escola de Jesus, que nos ensinou como o Reino de Deus sempre se desenvolve a partir da pequena semente. É a escola de Gandhi, que conduziu um povo à liberdade pelo caminho da não-violência. É a escola dos santos e das santas de todos os tempos, que fazem crescer a humanidade com o testemunho de uma vida passada ao serviço de Deus e do próximo. Mas é também – diria sobretudo – a escola de inúmeras mulheres que cultivaram e salvaguardaram a vida”.

De Jesus a Gandhi e aos santos, obviamente, em plena doutrina católica. A paz como pode desenhá-la um pensamento cristão, que está se colocando neste momento como a única alternativa global ao ritmo da guerra que é tocado por Moscou, é claro, mas também pelos países ocidentais.

Poucas vozes se associam a Francisco, especialmente da esquerda, como os Verdes e a Esquerda Italiana. Mas há também setores do M5S, com Giuseppe Conte, que voltou a atacar ontem a meta de 2% do PIB, opondo-se a Draghi, e com o senador Gianluca Ferrara, membro do Comissão de Assuntos Exteriores do Senado, que assumiu plenamente aquele "loucos" pronunciado pelo Papa Bergoglio. Contudo, do Partido Democrata, chega uma declaração burocrática e constrangida, feita em nome da secretaria por Francesco Boccia, que diz que o partido tem "uma responsabilidade institucional" e, portanto, se com o coração apoia as palavras do Papa, com o cérebro deve aprovar o aumento dos gastos militares.

O que é mais importante, Francisco parece encerrar a arrepiante controvérsia que o viu, não sabemos quão intencionalmente, distinto do secretário de Estado do Vaticano, Pietro Parolin, que por sua vez havia falado de um triste direito à resistência por parte dos ucranianos, abrindo à entrega de armas. Entrega ontem excluída pela CEI, que se expressou através das palavras de D. Stefano Russo: “Dever-se-ia chegar a um desarmamento total e geral, mas neste momento, infelizmente, não está acontecendo”.

Aliás, de fato, “o mercado de armas alimenta as guerras, como o Papa Francisco ressaltou várias vezes”. A bússola pacifista está, portanto, nas mãos do Vaticano, e isso constitui um poderoso fator em nível internacional, mas também uma limitação da política, pelo menos italiana. Talvez pensando nisso também, a Tavola della Pace lançou uma edição extraordinária, no dia 24 de abril, da marcha Perugia-Assis. Como disse Flavio Lotti, histórico coordenador da Tavola, “nosso governo, como outros, não está fazendo o suficiente para apoiar o esforço necessário para a negociação. Devemos sair da lógica da guerra e agir para que Putin volte à mesa de negociações. A única pessoa que está realmente trabalhando nessa direção é o Pontífice”.

 

Nota do Instituto Humanitas Unisinos - IHU

 

1.- A íntegra do discurso do Papa Francisco, em italiano, pode ser lida aqui.

 

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