09 Agosto 2021
Queda de 5% no número de alertas apenas reflete dinâmica do crime ambiental, enquanto governo que enterrou plano de combate vende ação do Exército como cloroquina.
A reportagem é de Solange A. Barreira, publicada por Observatório do Clima, 06-08-2021.
O acumulado de alertas de desmatamento em 2021 foi de 8.712 km2, mostram dados divulgados nesta sexta-feira (6/8) pelo sistema Deter, do Inpe (até 30 de julho, faltando um dia para fechar o ciclo de apuração do desmatamento, que vai de agosto de um ano a julho do ano seguinte). É a segunda maior cifra da série iniciada em 2016, perdendo apenas para o ano passado. Os três recordes da série foram batidos no governo Bolsonaro, no qual os alertas são 69,8% maiores que a média dos anos anteriores.
Nem mesmo o general Hamilton Mourão, comandante do Conselho da Amazônia, conseguiu comemorar o recuo de 5,4% na área de alertas em relação a 2020. Há poucas semanas ele havia prometido à imprensa que o desmatamento cairia 10% e na segunda-feira (2/8) declarou que não cumpriria a meta. No ano passado, a embaixadores estrangeiros, foi ainda mais otimista: prometeu 15% de queda.
Até as árvores mortas da Amazônia sabem que nenhum número que o governo ponha na mesa tem credibilidade, já que falta ao Brasil o essencial: uma política de controle do desmatamento. Ao contrário, há dois anos e meio o regime de Jair Bolsonaro se dedica a desmontar a governança ambiental e a ativamente estimular o crime. “O destino da floresta está nas mãos das quadrilhas de grileiros, madeireiros ilegais e garimpeiros. Hoje, são eles que determinam qual será o dado oficial de desmatamento. Na Amazônia, o crime ambiental atua livremente, e conta com a parceria do atual governo”, afirma Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima.
O plano de controle do desmatamento criado em 2004 foi abandonado. No fim de junho, após dois anos e meio de governo, o ministro Ricardo Salles caiu sob acusação de montar um escritório do crime no ministério para favorecer madeireiros. A “foice no Ibama” ordenada por Bolsonaro no começo de seu mandato derrubou pela metade as multas por crimes contra a flora na Amazônia em relação a 2018, último ano antes do início da atual gestão. O governo ainda paralisou o Fundo Amazônia e travou a cobrança de multas ambientais do país. O novo ministro, Joaquim Leite, até agora não tomou nenhuma medida que contrarie as políticas de seu antecessor.
Ao contrário, o governo federal agora tem um apoio fundamental e ainda mais perigoso para o desmonte: o Centrão, comandado por Arthur Lira (PP-AL). O presidente da Câmara aprovou num intervalo de poucas semanas o fim do licenciamento ambiental e a anistia potencialmente eterna à grilagem de terras, principal motor do desmatamento na Amazônia. “A expectativa de anistia com a aprovação do PL da Grilagem é um estímulo para os desmatadores e tende a tornar muito mais difícil o controle da destruição. Os altos índices de desmatamento e o desmonte da legislação ambiental têm repercussão mundial e prejudicam imensamente a imagem do país. É neste cenário que o Brasil chegará, daqui a alguns meses, na conferência do clima da ONU”, prossegue Astrini.
As ações pontuais do Exército, como a fracassada Operação Verde Brasil e agora Operação Samaúma, que os satélites mostram também estar falhando, são vendidas como ação a governos estrangeiros preocupados com o impacto do desmatamento sobre a meta do Acordo de Paris de limitar o aquecimento da Terra a 1,5oC. Mas, na ausência de qualquer política pública para a floresta que não seja a pilhagem promovida por Bolsonaro, Mourão e Lira, têm tanta eficiência quanto cloroquina.
Os dados oficiais de desmatamento, do sistema Prodes, serão divulgados apenas no fim do ano, mas os alertas do Deter — monitoramento diário que deveria orientar a fiscalização do Ibama — ajudam a projetar o tamanho do problema. O resultado indica que o desmatamento anual deverá, pela terceira vez, ficar próximo de 10 mil km2, o que não ocorria desde 2008.
A análise por categorias de alertas indica que a mineração devastou 125 km2 em 2021, a maior marca desde o início da série histórica do Deter-B, em 2016. Houve alta de 62% em relação a 2018.
O registro coincide com a discussão no Congresso de projeto de lei apresentado por Bolsonaro no início de 2020 para liberar o garimpo em terras indígenas, além do boicote de várias operações contra garimpos ilegais. Em abril de 2020, a cúpula da fiscalização do Ibama foi exonerada após uma operação de combate a garimpos em terras indígenas no Pará.
A degradação florestal (quando é removida parte da vegetação) também atingiu nível recorde: 6.062 km2 em 2021, a maior marca desde 2017, início da série histórica disponível. Houve alta de 87% em relação a 2018. Apenas o corte seletivo, ou seja, a extração de madeira, quase triplicou em área de alertas em 2020 e 2021 em relação à média dos anos anteriores. O período coincide com as ações de Ricardo Salles e do presidente suspenso do Ibama, Eduardo Bim, para afrouxar o controle da exportação de madeira — pelas quais ambos respondem hoje na Justiça.
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Sem combate, desmatamento mantém alta em 2021 - Instituto Humanitas Unisinos - IHU