23 Fevereiro 2021
Há anos, Rob Dunn, professor de Ecologia Aplicada na Universidade da Carolina do Norte, e sua equipe pesquisam as criaturas com as quais convivemos em casa: fungos, bactérias, insetos, seres minúsculos, a maioria benéficos para nós. Anjos da guarda.
Convivemos com mais tipos de bactérias do que mamíferos e espécies de aves que há na terra. A água com a qual tomamos banho está viva, o ar que respiramos está vivo. É o que explica graciosamente em “Solo en casa?” (Alianza), um canto à vida e a biodiversidade ainda a ser descoberta.
Até o momento, classificaram 200.000 espécies, e para continuar, pede a colaboração cidadã por meio da página web de seu laboratório: robdunnlab.com. “Abra as janelas, caminhe pelo campo, e não tente matar tudo, porque você também está se matando um pouquinho”.
A entrevista é de Ima Sanchís, publicada por La Vanguardia, 22-01-2021. A tradução é do Cepat.
Com quem vivo em casa?
Com todas as espécies que vivem nos humanos com quem convive. Temos centenas de micróbios que cobrem nossa pele.
O que você me diz?
São benéficos, e nós os trocamos. Também temos micróbios nas gengivas, que de fato têm muito mais células que o nosso próprio corpo. Muitas dessas espécies não só fazem parte de quem somos, como também dependemos delas, outras são inócuas e uma pequena porcentagem podem ser daninhas.
Entendo.
Descobrimos que coexistimos no mesmo espaço com muitos bichos: milhares de organismos rastejam, flutuam e saltam em nossas casas. Estão nas camas, sofás, lâmpadas, no ar que respiramos, estão em todas as partes. Dá no mesmo se vivemos em um apartamento na cidade, no campo ou na estação espacial internacional.
É preciso estarmos conscientes de que é impossível viver uma vida estéril. E, além disso, sem muitos desses organismos acabaríamos doentes.
Os detergentes querem acabar com eles.
Matá-los não é uma boa ideia. Se você olha os rótulos, dirão a quantidade de germes que aniquilam e, ao fazer isso, criamos um mundo em que sobrevive apenas 1% das espécies que costumam ser as que resistem a tudo, inclusive a uma bomba nuclear, e esses são os perigosos.
Entendo que estão aí por alguma causa...
A chave está no equilíbrio. Muitas espécies não provocam nenhum dano para nós, então, por que matá-las? Olhe essa aranhinha, não provoca nenhum dano, ao contrário: come outros bichinhos que, sim, prejudicam. Deixe-a aí. A grandeza da vida nos cerca, todas essas espécies incríveis sobre as quais sabemos muito pouco.
Onde está o limite entre a limpeza e deixar que a poeira se acumule?
Lavar as mãos com sabão oferece um equilíbrio: o que já estava permanece e o que acaba de chegar não. Tirar o pó está correto, mas lavar a casa e os alimentos com água sanitária ou usar inseticidas, a não ser que você tenha uma infestação, não é bom.
Quais são os benefícios dessas criaturas com as quais convivemos e não vemos?
As alergias, a asma e a doença de Crohn podem estar associadas à perda de exposição a estes organismos. Algumas espécies favorecem o funcionamento do sistema imunológico, outras contribuem para o controle de pragas e competem com elas ou são fontes potenciais de enzimas e novos remédios, e milhares delas realizam processos ecológicos muito valiosos, como manter a água da torneira livre de patógenos.
Melhor beber água engarrafada?
A água que tem muito cloro favorece os bichos que gostam de cloro. A água que produz menos problemas é a que possui menos tratamentos, a que vem de mananciais que não estejam contaminados, claro. Quer que eu diga a você quem vive na saída de seu chuveiro?
Sim, por favor.
Analisamos centenas de canos e saídas de chuveiro, neles milhões de bactérias criam um biofilme, ou seja, sujeira para que a água não as arraste, e proliferam mais em águas com maiores tratamentos químicos de depuração do que nas procedentes de poços ou aquíferos naturais.
Fale-me de criaturas que velem por mim.
Em quase todas as casas, há uma espécie de vespa minúscula que não faz nada aos humanos, mas que coloca seus ovos nas baratas e as matam. Há todo um ecossistema de espécies que nos ajudam diariamente.
Ofereça-me mais exemplos.
Nas almofadas, temos ácaros da poeira, mas também ácaros leopardo que comem os ácaros da poeira, é todo um ecossistema amplo e prodigioso.
Quantas espécies já classificaram?
200.000 espécies só na América do Norte e na Europa, mas há muitas ainda desconhecidas. Calcula-se que exista um trilhão de bactérias no mundo e a porcentagem nociva é muito baixa.
Como nos afeta passar a maior parte do nosso tempo em lugares fechados?
No passado, pelo simples fato de viver expostos a espécies que habitam a terra e as árvores, conseguíamos ter uma população de micróbios adequada, mas como agora vivemos vidas muito limpas, às vezes, esse equilíbrio não é correto. Nos Estados Unidos, as pessoas passam 90% do tempo em interiores, e isso não é saudável.
Muito isolados do exterior?
Sim, quanto mais fechado é o espaço, quanto mais vedamos os edifícios, maior é a complicação. A melhor coisa que podemos fazer é ter uma boa ventilação para que os micróbios da terra e das árvores entrem em casa.
O que os animais de estimação trazem para nossas casas?
Os cachorros trazem terra e com ela seus micróbios benéficos. As crianças que têm cachorros não costumam apresentar tantos casos de alergias.
O que mais lhe fascina, agora?
A biologia dos alimentos. Estamos descobrindo que as bactérias de quem faz o pão afetam a massa fermentada e vice-versa. Estamos descobrindo que há uma conexão física, todos fazemos parte de uma comunidade, e para mim isso é interessantíssimo.
Na biodiversidade está a salvação?
É chave para a sobrevivência humana. Estas criaturas minúsculas têm um imenso valor.
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“Convivemos com milhares de bichos em nossa casa”. Entrevista com Rob Dunn - Instituto Humanitas Unisinos - IHU