20 Fevereiro 2021
"O governo estadual da época foi totalmente subserviente e submisso aos interesses especulativos dos “coronéis urbanos” (leia: donos das grandes imobiliárias). Só os adoradores do deus dinheiro - que consideram a propriedade privada um direito absoluto - são capazes de uma barbárie como essa", escreve Marcos Sassatelli, frade dominicano, doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP) e professor aposentado de Filosofia da UFG.
No artigo “Não à politicagem” (O Popular, 03/02/21, p. 3) o professor Jônathas Silva fez um relato de sua atuação no cargo de Secretário de Segurança Pública do Estado de Goiás, no período 2002/2006. Afirma: “Nunca fiz politicagem. Ao contrário, optei por fazer uma autêntica política de segurança pública, como previa o programa do governo, que foi legitimado no processo eleitoral pela maioria absoluta dos votos dos eleitores, que elegeram o governador (Marconi Perillo), no contexto de uma proposta social democrática”.
O artigo é uma auto-exaltação. O professor apresenta-se como um modelo a ser seguido. “Não fiz política com segurança pública, mas uma política de segurança pública”.
Infelizmente, Jônathas Silva esqueceu um “detalhe”: o despejo da Ocupação “Sonho Real” do Parque Oeste Industrial, que foi um verdadeiro massacre. No dia 16 do mês corrente completam-se 16 anos desse lamentável acontecimento: a pior barbárie praticada em toda a história de Goiânia e uma das piores do Brasil. Cada ano fazemos a memória da data - lembrada também pelo Livro-Agenda Latino-americana Mundial - para que nunca mais se repita uma iniquidade humana como essa.
O despejo da Ocupação “Sonho Real” do Parque Oeste Industrial, foi uma operação militar de guerra do governo Marconi Perillo - comandada pelo então Secretário de Segurança Pública Jônathas Silva - chamada, fria e cinicamente, “Operação triunfo”. Como se não bastasse, para que o requinte da brutalidade e da crueldade humana fosse ainda maior, ela foi precedida da “Operação inquietação”: 10 dias - de 0 a 6 horas - assustando os moradores e provocando traumas nas crianças com as chamadas bombas de efeito moral (que de “moral” não tem nada).
Em resumo, a história da “Operação Triunfo” consistiu no seguinte: em uma hora e quarenta e cinco minutos, cerca de 14 mil pessoas (reparem: 14 mil pessoas) foram despejadas de suas moradias de maneira violenta, truculenta, sem nenhum respeito pela dignidade da pessoa humana e jogadas na rua. A Operação produziu duas vítimas fatais (Pedro e Vagner), 16 feridos à bala, tornando-se um desses paraplégico (Marcelo Henrique) e 800 pessoas detidas (suspeita-se com razão que o número dos mortos e feridos seja bem maior).
Essa história, professor Jônathas, o senhor não conta no seu artigo. Trata-se de um crime cruel, perverso e totalmente desumano cometido pelo senhor - então Secretário de Segurança Pública - e por Marconi Perillo - então governador do Estado de Goiás, com a conivência de Iris Rezende - então prefeito de Goiânia. Infelizmente, o crime - que clama por justiça - continua impune até hoje. Lembre-se, professor Jônathas, que a (In)Justiça humana falha, mas a Justiça de Deus nunca falha.
O governo estadual da época foi totalmente subserviente e submisso aos interesses especulativos dos “coronéis urbanos” (leia: donos das grandes imobiliárias). Só os adoradores do deus dinheiro - que consideram a propriedade privada um direito absoluto - são capazes de uma barbárie como essa.
No caso da Ocupação “Sonho Real” do Parque Oeste Industrial, mesmo do ponto de vista meramente jurídico - sem precisar recorrer à questão da justiça e da ética - existiam todos os argumentos legais e constitucionais para a desapropriação da área. Inclusive, o governador Marconi Perillo - poucos dias antes do despejo - afirmou em entrevista coletiva que estava decidida a desapropriação. Lembro que o povo fez até festa.
Poucos dias depois, cedendo à pressão dos “coronéis urbanos” - que não queriam dar a vitória ao povo para não criar um precedente - o governador, covardemente e demostrando ser um homem sem palavra, voltou atrás e aconteceu o que todos nós sabemos.
Termino com as palavras do papa Francisco: “A Bíblia lembra-nos que Deus escuta o clamor do seu povo e também eu quero voltar a unir a minha voz à voz de vocês: terra, teto e trabalho (os três “T”) para todos os nossos irmãos e irmãs. Disse-o e repito: são direitos sagrados. Vale a pena, vale a pena lutar por eles. Que o clamor dos excluídos seja escutado na América Latina e em toda a terra” (2º Encontro Mundial dos Movimentos Populares. Santa Cruz de la Sierra - Bolívia, julho de 2015).
Que a voz dos Movimentos Populares e do nosso irmão o papa Francisco seja também a nossa voz!
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Jônathas Silva esqueceu um “detalhe”: o despejo da Ocupação “Sonho Real” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU