11 Janeiro 2021
O Papa Francisco tem, mais uma vez, palavras para o silêncio. Como no passado, o Pontífice retoma assim um tema que lhe é caro, a necessidade de cultivar o silêncio durante o passar do dia, de viver no silêncio, para não sujar a imagem de Deus falando mal dos outros.
A reportagem é de Paolo Rodari, publicada por la Repubblica, 10-01-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
Jorge Mario Bergoglio faz isso em um prefácio escrito em “Non sparlare degli altri” (Não fale mal dos outros, Effatà Editrice), o último livro de Emiliano Antenucci, frade capuchinho apaixonado pela mística e pela espiritualidade.
O Papa explica: “O silêncio é também a linguagem de Deus e é também a linguagem do amor, como Santo Agostinho escreve: 'Se calas, calas por amor, se falas, falas por amor'". E ainda: “Não fale mal dos outros, não é apenas um ato moral, mas um gesto humano, porque quando 'falamos mal dos outros, sujamos a imagem de Deus que está em cada homem. O uso correto das palavras é importante”. E ainda: “Com a palavra podemos bem-dizer ou mal-dizer, as palavras podem ser muros fechados ou janelas abertas”.
Francisco recorda “o caminho simples de Madre Teresa de Calcutá e o caminho de santidade de cada cristão: 'O fruto do silêncio é a oração / O fruto da oração é a fé / O fruto da fé é o amor / O fruto do amor é o serviço / O fruto do serviço é a paz'. Parte-se do silêncio e se chega à caridade para com os outros. Que a Virgem do Silêncio nos ensine o uso correto da nossa língua, nos dê a força para abençoar a todos, a paz no coração e a alegria de viver".
A Virgem do Silêncio mencionada pelo Papa é um ícone que lhe foi dado pelo frei Emiliano e que quis fosse pendurada no Vaticano no lado de fora do elevador que leva do pátio de San Damaso ao palácio apostólico. Retrata Maria pedindo silêncio com o dedo indicador no nariz.
Os gestos do Papa que confirmam a importância que o silêncio tem para ele são múltiplos. Em junho passado, por exemplo, ele escreveu e conseguiu que os capuchinhos abrissem um santuário dedicado ao silêncio em Avezzano. Do lado de fora da porta de seu quarto em Santa Marta, pendurou uma placa com o pedido de não falar mal: "É proibido se lamuriar", diz. Ele mesmo reserva um tempo todas as manhãs antes da missa para rezar em silêncio.
O silêncio talvez seja o aspecto menos conhecido do pontificado de Francisco. É como o pano de fundo de sua ação. Está sempre lá, mas ninguém fala sobre isso. No entanto, já como arcebispo de Buenos Aires, ele havia dedicado palavras profundas ao silêncio. Sobre todos aqueles escritos em algumas reflexões de 1987 e dedicados à festa de Natal. “Se não há solidão, não há silêncio - escrevia ele - e sem ambos não há verdade”.
O então cardeal citou Diadoco de Fótice que explicava que como "mantendo as portas do banheiro abertas continuamente, se perde o calor do ambiente interno", assim, "quando a alma cede ao desejo de falar demais, mesmo que seja bom o que diz, dispersa a presença íntima de si mesma pela porta da voz”.
E mais ainda Santo Inácio que “quando se refere ao silêncio, fala de bom grado em 'tranquilidade' e 'modéstia' da alma”.
“O silêncio - concluía - é a expressão máxima e mais cotidiana da dignidade. Ainda mais nos momentos de provação e crucificação, quando a carne gostaria de se justificar e escapar da cruz. No momento supremo da injustiça, Jesus ficou em silêncio. Ele não respondeu àqueles que lhe diziam para descer da cruz. Toda a paciência de Deus, a paciência de séculos, e também o seu afeto, emergem aqui, neste silêncio do Cristo humilhado. Na história humana irrompem o silêncio eterno da Palavra, a ‘contemplatividade’ amorosa do Pai e do Filho e do Espírito Santo, toda a comunhão trinitária do silêncio dos séculos. É Palavra, mas Palavra que - na hora da anulação provocada pela injustiça - se faz silêncio. Jesus autem tacebat. Vamos contemplar toda a viagem da Palavra de Deus; como se transforma em ternura no seio de uma Mãe. Essa Mãe guardava todas essas coisas, ponderando-as em seu coração. A memória da Igreja tem sua sede no coração silencioso de Maria. O silêncio encarnado do Verbo se expressa naquele momento de injustiça, de humilhação, de anulação, na hora do poder das trevas. Essa é a dignidade de Jesus, e também a nossa".
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As palavras “podem ser beijos, carícias, remédios ou facas, espadas ou balas”, afirma o papa Francisco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU