27 Outubro 2020
O arcebispo de Washington, Wilton Gregory, é um dos 13 novos purpurados anunciados pelo papa. Ele repreendeu Donald Trump pelo uso político da religião.
A reportagem é de Domenico Agasso Jr., publicada por La Stampa, 26-10-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Faltam nove dias para as eleições presidenciais dos Estados Unidos, e o Papa Francisco, no Ângelus, anuncia a nomeação do primeiro cardeal afro-americano da história: Wilton D. Gregory, arcebispo de Washington, que não hesitou em atacar publicamente Trump nos dias incandescentes dos protestos do Black Lives Matter.
O cargo de pastor da capital dos Estados Unidos é considerado o mais influente da Igreja estadunidense, nó crucial e imprescindível das relações com o poder político. Tradicionalmente, ele tem estreitas relações com os presidentes e os diplomatas, além de líderes culturais. Portanto, se continuar como inquilino da Casa Branca, o magnata terá como vizinho “incômodo” não mais “apenas” o chefe da diocese, mas também um novo purpurado da Igreja universal, potencial protagonista de um eventual conclave.
Wilton Daniel Gregory, 72, natural do South Side de Chicago (onde Michelle Obama cresceu), em Illinois, converteu-se ao catolicismo quando adolescente. É considerado um progressista, próximo às sensibilidades do pontificado argentino em questões como a ecologia, as migrações e a pastoral com as pessoas homossexuais.
“Mas consegue ser apreciado também por muitos católicos da galáxia oposta, os ‘guerreiros culturais’ das batalhas contra o aborto e em defesa da família ‘tradicional’”, disse um prelado de Roma, especialista em geopolítica eclesiástica.
Antes de se tornar arcebispo de Atlanta, Gregory foi vice-presidente e depois presidente dos bispos dos Estados Unidos por três anos. Exigiu veementemente uma virada no Vaticano para proteger as crianças vítimas dos abusos sexuais que emergiram do escândalo revelado pelo Boston Globe em 2002. E foi um dos promotores da “Carta de Dallas” voltada à proteção dos menores.
Bergoglio tem “muita estima por ele e por tudo o que ele representa”, disse o prelado da Santa Sé. E, de fato, Francisco escolheu Gregory como líder da Igreja de Washington no dia 4 de abril de 2019, aniversário do assassinato de Martin Luther King, morto em Memphis, Tennessee, em 1968.
Há quem interprete o papel confiado a Gregory como uma espécie de prólogo às reivindicações do movimento Black Lives Matter contra o racismo. Com ainda mais razão depois do dia 2 de junho passado, quando Trump e a primeira-dama, Melania, foram ao santuário nacional de Washington, que contém uma ampola com o sangue do Papa São João Paulo II. O presidente recebeu duras críticas do bispo “vizinho”, que denunciou o uso político da religião: é “desconcertante e repreensível” que um centro católico “se permita ser tão flagrantemente maltratado e manipulado de uma forma que viola os nossos princípios religiosos, que nos chamam a defender os direitos de todas as pessoas, mesmo daquelas de quem possamos discordar”.
O prelado aumentava a dose, lembrando o compromisso de Wojtyla com os direitos humanos e condenando “o uso de gás lacrimogêneo e de outros meios de dissuasão para silenciar, dispersar ou intimidar os manifestantes para uma oportunidade de foto”, uma referência à foto de Trump com a Bíblia nas mãos em frente à Igreja Episcopal de São João na Praça Lafayette.
Nesse domingo, as primeiras palavras do novo cardeal foram de agradecimento ao papa “por essa nomeação, que me permitirá trabalhar mais estreitamente com ele para cuidar da Igreja de Cristo”.
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Francisco desafia Trump com primeiro cardeal afro-americano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU