Efeito covid-19: espaço liso e Bem Viver

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Por: Guilherme Tenher Rodrigues | 28 Agosto 2020

A hiperconectividade e os demais arranjos tecnológicos e informacionais de nossa época proporcionaram um desenvolvimento mercantil global sem precedentes. O projeto neoliberal de atomização dos indivíduos, do hiperconsumo, da aguda financeirização, do papel insignificante e até estorvante do Estado, da exploração indiscriminada de mão de obra barata e de recursos naturais jamais preveria, nem mesmo através de seus complexos sistemas algorítmicos, que nos últimos meses a humanidade enfrentaria uma pandemia que se alastraria tão rápido quanto as mercadorias.

O “inimigo invisível”, como chamado por alguns, se fez bastante perceptível em vários aspectos (banais e essenciais) da vida das pessoas e até mesmo o irreprochável Capitalismo foi posto à prova. A covid-19, nome apropriado do nosso inimigo microscópico, exigiu da sociedade desaceleração em épocas de velocidade; provocou queda simultânea da demanda e da oferta; acelerou processos de digitalização, sendo eles para trabalho, para estudo, para compras ou diversas outras formas de serviços; intensificou as desigualdades sociais; e reivindicou dos Estados medidas urgentes de manutenção da renda, bem como capacidade de planejamento de médio e longo prazo em assuntos pertinentes à proteção social.

É neste cenário que Wallace Antonio Dias Silva desenvolve seu estudo intitulado “Efeito covid-19: espaço liso e Bem Viver”, publicado nos Cadernos IHU Ideias número 299. “São estes novos paradigmas de um mundo globalmente conectado tanto virtual quando fisicamente, maculado pela destruição do meio ambiente e pela disparidade gritante de renda, que ensejaram a propagação planetária tão rápida e intensa de covid-19”, afirma.

Wallace busca desenhar possíveis futuros para a humanidade se valendo das percepções antagônicas de Slavoj Žižek e de Byung-Chul Han. Para o primeiro, a pandemia que enfrentamos “viabiliza o pensamento de alternativas para a sociedade, em ‘possibilidades para além do Estado-nação, e que se atualizam nas formas de cooperação e solidariedade globais’”, Já para o filósofo sul-coreano, “o mundo ocidental passa por um momento em que ‘impera um individualismo’ no qual há ‘excesso de positividade, que se expressa como excesso de rendimento, excesso de produção e excesso de comunicação’, características que, em vez de promoverem uma possível revolução ou implosão do sistema capitalista no momento pós-pandemia, possibilitam a instauração ainda mais intensa do neoliberalismo e de regimes de exceção com regimes policialescos”.

O leitor será conduzido a pensar na capacidade de adaptação ou axiomatização do capitalismo a partir do contexto pandêmico. Assim, Wallace avança seu ensaio na capacidade ou não de decodificação dos recentes acontecimentos no espaço capitalista e se há a possibilidade de superarmos este sistema. As perguntas centrais do texto são: a pandemia de covid-19 abriu um espaço (lê-se espaço liso) capaz de escamotear a fagocitose do capitalismo? Estaríamos em um "momento-realidade dialético, de fluxos orgânicos e interconectados" garantidores de ideias civilizatórias inovadoras?

Com o intuito de convidar o leitor a pensar no horizonte de possibilidades que se abre a partir dos recentes acontecimentos, Wallace apresenta o conceito de “espaço liso”, asseverado pelos estudiosos Gilles Deleuze e Félix Guattari, e o combina com a revolução informacional que se presencia nas recentes tentativas de (re)organizar a sociedade e seus variados processos.
“O espaço liso é uma noção de realidade na qual é possível a adoção e prática (experimentação) de pensamentos diversos dos presentes tidos como dados e imutáveis. É um momento-realidade dialético, de fluxos orgânicos e interconectados em constante mutação que possibilita o exercício e surgimento de ideias inovadoras. No espaço liso, por natureza, não se aplica a razão cartesiana e determinista presente no capitalismo tecnicista e racional surgido das Revoluções francesa, burguesa, industrial e do iluminismo: os acidentes se condicionam e se resolvem”, aponta.

Se de fato na pandemia se vislumbra a abertura de um espaço como descrito anteriormente, se torna imprescindível a superação do modelo neoliberal e a construção de novas cosmovisões, calcadas no “Bem Viver”. Conforme conclui o autor, “não se busca, evidentemente, a extinção imediata e instantânea do sistema capitalista. A proposta ofertada é que as brechas abertas no capitalismo pela pandemia da covid-19 – tanto pela crise sistêmica quanto pelas novas formas de comunicação – sejam abraçadas pelos atores sociais e utilizadas como verdadeiro espaço liso para difusão de novas ideias e formas de relações e vivências biocêntricas”.

 

 

O texto se organiza da seguinte forma:

Introdução
1. Futuros extremos - pensamento de Slavoj Žižek e de Byung-Chul Han
2. Axiomatização e espaço liso
3. Comunicação e conexão com as alternativas sistêmicas
4. Democracia neoliberal, responsabilidade e novas cosmovisões
5. O Bem Viver como possível alternativa sistêmica
Considerações finais


Wallace Antonio Dias Silva é advogado e pesquisador acadêmico. Especialista e Mestre em Direito do Trabalho (PUC-SP).


O texto integral pode ser acessado aqui.

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