06 Agosto 2019
“Na última votação do conclave de 2013, um evento singular acontece. No momento do escrutínio, o nome “Bertoglio” é lido em uma cédula. Ao que os cardeais discutem para quem atribuir esse voto: "A Bertello, Bertone ou Bergoglio?". "A votação para o filhote e seus dois padrinhos", comenta um cardeal que confidencia que sempre votou em Scola ao longo do conclave.
Reprodução da capa do livro de Francesco Grana
No final, o voto para 'Bertoglio' não é atribuído a ninguém. Este é apenas uma das muitas histórias de bastidores, até agora inéditas, dos conclaves de 2005 e 2013 revelados por Francesco Antonio Grana, vaticanista de ilfattoquotidiano.it, em seu último livro intitulado Extra omnes (Elledici). O jornalista cobre todas as fases que levaram primeiro à eleição de Joseph Ratzinger e depois àquela de Jorge Mario Bergoglio revelando, em ambos os casos, o momento em que os dois cardeais perceberam que seriam eleitos Papa.
A reportagem é publicada por Il Fatto Quotidiano, 03-08-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
Sobre a Sede Vacante de 2005, Grana também relata sobre a sondagem feita por alguns cardeais eleitores, dois dias antes do início do conclave, para verificar se Ratzinger, caso fosse eleito, teria aceitado. A resposta do então cardeal decano foi eloquente, embora ignorada: "Não pensem em mim". Por outro lado, da Sede Vacante de 2013 o vaticanista repercorre todos os momentos da votação final. "Assim que foi eleito - escreve o autor - o arcebispo de Buenos Aires dirigiu-se primeiro ao seu desafiante Angelo Scola para abraçá-lo. E depois ao cardeal Ivan Dias, o único cardeal presente no conclave numa cadeira de rodas. Ele se inclina sobre seu coirmão indiano e o abraça. Imediatamente depois, o Papa entra na "sala das lágrimas", à esquerda, olhando para o altar da Capela Sistina, com o monsenhor Guido Marini e o mestre de cerimônias pontifício, dom Piero Stefanetti. Ele se recusa a vestir os sapatos vermelhos, a camisa com as abotoaduras, a capa bordada, a mozeta vermelha de arminho, a corrente de ouro com a cruz dourada e a estola vermelha papal".
Mas, continua relato ode Grana, "o tempo para se vestir demora mais do que o habitual, ao qual o cardeal Giovanni Battista Re, que liderou o conclave, pede ao mestre de cerimônias pontifício que havia permanecido na Capela Sistina para bater à porta da ‘sala de lágrimas’. O mestre de cerimônias bate, mas não recebe nenhum sinal de dentro. 'Monsenhor - exorta Re -, bata, bata mais forte. O mundo espera o novo papa’. Bergoglio sai vestido simplesmente com a veste branca e no pescoço tem a cruz peitoral, a mesma que sempre usou em Buenos Aires e que continua a usar ainda hoje. Ele simplesmente trocou a corrente cardinalícia, vermelha e dourada, e prendeu sua cruz à antiga corrente de metal. Ele a havia colocado em sua batina antes de deixar o quarto atribuído a ele Casa Santa Marta para embarcar na van que o levaria à Capela Sistina para as votações finais do conclave. Isso demonstra que Bergoglio, naquela tarde, estava ciente de que ele seria eleito papa. Os cardeais olham para ele intensamente e se alinham para o ato de obediência. Francisco permanece de pé, não se senta no trono colocado no centro, logo abaixo do Juízo Final de Michelangelo".
"Enquanto isso", escreve ainda o vaticanista, "um mestre de cerimônias pontifício abre as portas da Capela Sistina e dirigindo-se aos presentes que esperavam do lado de fora, na Sala Régia, e que ainda não sabiam quem havia sido eleito, sem revelar o nome do novo Papa, profeticamente afirma: ‘Não mudou um mundo. Mudou o mundo". O então vice-secretário de Estado, dom Giovanni Angelo Becciu, entra na Capela Sistina, mas não consegue ver do fundo o recém-eleito. Enquanto olha para os possíveis candidatos da véspera e os vê todos ainda vestidos de vermelho, ele se sente agarrado pelo braço. É o cardeal Antonio Maria Vegliò que lhe pergunta: 'Excelência, qual foi o resultado do Milan ontem à noite?' ‘Venceu, Eminência’, responde Becciu, que pergunta: ‘Mas quem vocês elegeram?’ 'Bergoglio'”.
Grande parte do volume também é dedicada ao tema sempre inflamado da questão da renúncia dos Papas, de Pio XII a Francisco. Pacelli, na verdade, temendo que pudesse ser preso por Hitler durante a Segunda Guerra Mundial, escreveu sua renúncia que só se tornaria efetiva se ele tivesse sido capturado pelos nazistas. Pio XII disse explicitamente que, em tal caso, ele voltaria a ser cardeal. Posição, como se sabe, não compartilhada por Bento XVI que, após sua renúncia, preferiu escolher o título inédito do Papa emérito, continuando a se vestir branco e morar no Vaticano. O caso de São Paulo VI é diferente: durante seu pontificado, ele repetidamente meditou sobre deixar o trono de Pedro e escreveu duas cartas de renúncia, caso tivesse ficado incapacitado e não pudesse continuar a governar a Igreja. São João Paulo II considerou longamente se iria fazer o mesmo, inclusive devido à progressão inexorável do mal de Parkinson do qual ele sofria. Mas no final, depois de ter consultado vários cardeais seus colaboradores na Cúria Romana, decidiu permanecer. Bergoglio nunca teve qualquer dificuldade em responder àqueles que lhe perguntaram o que teria feito se não se sentisse mais em condições de continuar: "Faria o mesmo que Bento! Eu rezaria muito, mas faria o mesmo”.
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Extra omnes, os bastidores inéditos dos conclaves de 2005 e 2013: do voto para “Bertoglio” à sondagem com Ratzinger até o interesse pelo futebol - Instituto Humanitas Unisinos - IHU