27 Julho 2019
Você se lembra quando as pessoas diziam que nós tínhamos “12 anos para salvar o planeta”?
A reportagem é de Matt McGrath, publicada por BBC Brasil, 25-07-2019.
Agora, no entanto, há um consenso crescente de que os próximos 18 meses serão primordiais para lidar com a crise do aquecimento global e das mudanças climáticas, entre outros desafios ambientais.
No ano passado, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) informou que, para manter o aumento das temperaturas médias globais abaixo de 1,5ºC até o final deste século, as emissões de dióxido de carbono teriam que ser reduzidas em 45% até 2030.
Mas hoje, os cientistas reconhecem que os passos políticos decisivos para permitir que os cortes no carbono ocorram de fato terão de ser dados antes do final do próximo ano.
A ideia de que 2020 é um prazo importante foi abordada por um dos principais cientistas do clima do mundo, em 2017. “A matemática do clima é brutalmente clara: embora o mundo não possa ser curado nos próximos anos, pode ser fatalmente ferido por negligência até 2020”, disse Hans Joachim Schellnhuber, fundador e atual diretor emérito do Instituto Potsdam de Pesquisas sobre o Impacto Climático.
A sensação de que o final do próximo ano seria uma espécie de prazo de última chance para conter os efeitos devastadores das mudanças climáticas está ficando cada vez mais evidente.
“Acredito firmemente que os próximos 18 meses decidirão nossa capacidade de manter a mudança climática em níveis de sobrevivência e restaurar a natureza ao equilíbrio que precisamos para nossa sobrevivência”, disse o príncipe Charles, falando em uma recepção recente para ministros do Commonwealth, a comunidade que aglutina o Reino Unido e várias ex-colônias britânicas.
O príncipe Charles estava fazendo uma referência a importantes reuniões da ONU sobre o clima marcadas até o final de 2020. Desde que um acordo climático global foi assinado em Paris, em dezembro de 2015, negociadores tem se empenhado em fechar um conjunto de normas a serem seguidas pelos signatários do pacto.
Mas, sob os termos do acordo, os países também prometeram avançar seus planos de corte de emissões de carbono até o final de 2020.
Uma dos destaques do relatório do IPCC lançado no ano passado foi a estimativa de que as emissões globais de dióxido de carbono têm de atingir seu pico em 2020, para viabilizar o objetivo do teto de aumento de 1,5ºC até o final do século.
Os planos atuais não são suficientemente fortes para manter as temperaturas abaixo do chamado limite seguro. Neste momento, estamos nos encaminhando para 3ºC de aquecimento até 2100.
Como os países geralmente planejam seus programas de redução com prazos de cinco e dez anos, para se atingir a meta de corte de carbono de 45% até 2030, os planos realmente precisam estar na mesa até o final de 2020.
O primeiro grande evento será a Cúpula para Ação Climática, convocada pelo secretário-geral da ONU, Antonio Guterres. Ela será realizada em Nova York, em 23 de setembro.
Guterres tem deixado claro que a cúpula só fará sentido se os países que forem à ela levarem ofertas significativas para melhorar seus planos nacionais de corte de emissões.
Esse encontro será seguido pela COP25 em Santiago, no Chile, que terá a importância de manter o processo em andamento.
Mas o momento-chave deverá ser a COP26, provavelmente no Reino Unido, que será realizada no final de 2020.
O governo britânico acredita poder usar a oportunidade da COP26, em um eventual mundo pós-Brexit (após a saída do Reino Unido da União Europeia), para mostrar que a Grã-Bretanha tem força para construir a vontade política para os avanços necessários, da mesma forma que os franceses usaram sua força diplomática para fazer o acordo de Paris acontecer.
“Se obtivermos sucesso em nossa oferta (para sediar a COP26), garantiremos a construção do acordo de Paris e refletiremos as evidências científicas de que precisamos ir mais longe e mais rápido”, disse recentemente o ministro do Meio Ambiente do Reino Unido, Michael Gove – em sua provável última fala no cargo (ele terá outro cargo no gabinete do novo premiê, Boris Johnson, que assumiu na quarta-feira).
“E precisamos da COP26 para garantir que outros países levem a sério suas obrigações e isso significa liderar pelo exemplo. Juntos, devemos tomar todas as medidas necessárias para restringir o aquecimento global a pelo menos 1,5ºC.”
Nos últimos anos, talvez pelas onde extremas de frio e calor, ou pela atividade de ativistas como a adolescente sueca Greta Thunberg e o grupo britânico Extinction Rebellion (que paralisou Londres por uma semana em abril), parece haver um nítido aumento no interesse público por mudanças climáticas e outros problemas relativos à natureza e por ideias que as pessoas possam colocar em prática em suas próprias vidas.
As demandas por ação estão ficando mais vigorosas, e os sinais são de que políticos em muitos países acordaram para essas mudanças.
Ideias como o New Green Deal, (o Novo Plano Verde, com ações como a “descarbonização” da economia americana), proposto por políticos democratas, que pareciam inviáveis há alguns anos, ganharam força real recentemente.
A percepção do príncipe Charles de que os próximos 18 meses são críticos é compartilhada por alguns representantes de países nas negociações sobre clima.
“Nosso grupo de pequenos estados insulares em desenvolvimento compartilha do sentimento do príncipe Charles da profunda urgência por uma ação climática ambiciosa”, disse a embaixadora Janine Felson, de Belize, estrategista-chefe do grupo da Aliança dos Pequenos Estados Insulares da ONU.
“De uma só vez, somos testemunhas de uma convergência coletiva da mobilização pública. Os impactos climáticos estão piorando e há fortes alertas científicos que dão pedem uma liderança climática decisiva”.
“Sem dúvida, 2020 é um prazo importante para que a liderança finalmente se manifeste.”
A provável COP no Reino Unido em 2020 também poderia ser o momento em que os EUA finalmente deixariam o acordo de Paris, conforme Donald Trump anunciou em 2017.
Mas se Trump não vencer nas eleições americanas do próximo ano, a posição do país pode mudar. Um presidente democrata, por exemplo, provavelmente reverteria a decisão.
Qualquer passo pode ter enormes consequências para a luta pelo clima.
Neste momento, vários países parecem dispostos a desacelerar as mudanças propostas. Em dezembro passado, os EUA, a Arábia Saudita, o Kuwait e a Rússia bloquearam um relatório especial do IPCC que estabelecia a necessidade de se manter o teto dos 1,5ºC de aumento.
Algumas semanas atrás, em Bonn, na Alemanha, novas objeções da Arábia Saudita impediram que o tema entrasse em negociações da ONU.
Haverá pressão significativa sobre o país anfitrião da COP26 em 2020 para que este garanta um progresso substancial. Mas, se houver um tumulto político em torno do Brexit (a saída do Reino Unido da União Europeia), o governo britânico pode não ter cacife necessário para lidar com os múltiplos desafios globais que a mudança climática apresenta.
“Se não pudermos usar esse momento para acelerar nossas ambições, não teremos chance de chegar a um limite de 1,5 ou 2ºC (de aumento da temperatura)”, disse o professor Michael Jacobs, da Universidade de Sheffield, ex-assessor para Clima do ex-primeiro-ministro do Reino Unido Gordon Brown.
Embora as decisões tomadas sobre a mudança climática no próximo ano sejam críticas, há uma série de outras reuniões importantes sobre o meio ambiente que moldarão as ações para preservação de espécies e a proteção dos oceanos nas próximas décadas.
No início deste ano, um grande estudo sobre as perdas de espécies na natureza e resultados mais amplos do impacto humano causou uma grande agitação entre governos.
O relatório da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos mostrou que até um milhão de espécies poderiam ser perdidas nas próximas décadas.
Por causa disso, os governos se reunirão na China no próximo ano para tentar chegar a um acordo que proteja animais de todos os tipos.
A Convenção sobre Diversidade Biológica é o órgão da ONU encarregado de elaborar um plano para proteger a natureza até 2030.
A reunião do próximo ano poderia levar a uma espécie de “acordo de Paris” para o mundo natural. Se houver acordo, é provável que haja ênfase na agricultura e pesca sustentáveis. Ele deverá pedir maior proteção às espécies e impor limites ao desmatamento.
No próximo ano, a Convenção das Nações Unidas sobre as Leis do Mar também se reunirá para negociar um novo tratado global sobre os oceanos.
Se tudo isso acontecer, o mundo pode ter uma chance de preservar o meio ambiente.
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Por que cientistas dizem que próximos 18 meses serão cruciais para salvar o planeta - Instituto Humanitas Unisinos - IHU