Remendos contra o tráfico humano

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05 Dezembro 2018

Em geral, as instituições internacionais que se se mobilizam contra o tráfico (incluindo a Igreja Católica) se movem a partir do topo, elaboram programas, documentos, estabelecem contatos com os governos e com os líderes religiosos mais importantes. As irmãs, organizadas na União Internacional de Superioras Gerais (UISG), fazem parte da rede Talitha Kum – composta, por sua vez, por 22 redes em 76 países - trabalham de uma forma muito diferente, a partir de baixo.

O comentário é de Lucetta Scaraffia, historiadora italiana e membro do Comitê Italiano de Bioética e professora da Universidade de Roma “La Sapienza”, publicado por L'Osservatore Romano, 04/05-12-2018. A tradução é de Luisa Rabolini.

As redes que conectam suas iniciativas são compostas por pequenos grupos de religiosas que trabalham no campo e compartilham um objetivo comum - acabar com a escravidão moderna - mas sobre os métodos de intervenção diferem muito. Cada grupo inventa o modo de ação mais eficaz para aquele território específico, cria alianças com as pessoas que contam, que estão próximas e que conhecem pessoalmente. Reconstroem métodos e objetivos do tráfico ouvindo as vítimas que as procuram em busca de ajuda e aconselhamento: não produzem levantamentos estatísticos, não coletam dados, mas sabem explicar perfeitamente o que acontece e por quê. Um trabalho que é muito semelhante à atividade tipicamente feminina de remendar: paciência, habilidade, confiança para poder renovar uma situação deteriorada.

Isso foi o que emergiu de um encontro dedicado à África realizado em 3 de dezembro na sede da UISG sobre as religiosas protagonistas contra a escravidão. A coordenadora Gabriella Bottani ilustrou a situação com grande clareza: 50% das pessoas são vítimas de tráfico dentro dos próprios países, as outras são destinadas a países vizinhos ou à Europa. Há também uma corrente de migração da Ásia para a África, que é destinada, como a da África, à exploração nos países do Oriente Médio. Os tipos de trabalho forçado são vários, nas minas, na pesca, no serviço doméstico, no sexo. As crianças são as vítimas mais vulneráveis e mais solicitadas: são exploradas para mendigar, para o sexo, para a guerra e para a venda de órgãos. As crianças representam 64% das vítimas do tráfico e contribuem para reduzir a idade média, que se situa entre os 16 e os 28 anos.

Aqueles que conseguem fugir dos traficantes, muitas vezes com o corpo e a alma marcados por violências e torturas, correm o risco de recair em suas mãos, se não receberem ajuda, quem sobrevive precisa de muita ajuda para reintegrar-se na vida normal. As irmãs criam abrigos, tentam ativar redes de ajuda para garantir a fuga ou o tratamento, para disseminar na população a consciência do que está acontecendo.

É difícil tornar conhecido esse trabalho, fazer o mundo entender o que está acontecendo: a irmã Gabriella diz que a notícias são demasiado trágicas, ninguém na mídia quer ouvi-las. Mas, felizmente, elas foram ouvidas pelos embaixadores junto à Santa Sé da Grã-Bretanha, Sally Axworthy, e da Irlanda, Derek Hannon, envolvidos com os seus países em um forte combate ao tráfico humano e que já começaram a ajudá-las, dando confiança justamente a elas, a esse método simples, mas eficaz, se realizado com coragem e determinação.

Sally Axworthy lembrou como o compromisso britânico tenha nascido a partir da descoberta de casos de exploração de emigrados dentro do país, e como o empenho nos locais de origem deva ser sempre combinado com uma atenção dos europeus para as várias maneiras pelas quais eles usufruem da exploração dos outros para obter mais pagando menos. Ela lembrou que a Igreja Anglicana publicou um folheto no qual convida cada pessoa a verificar, por exemplo, se o lugar onde está levando o carro para lavar emprega mão de obra imigrada ilegalmente, com salários de fome. E essa mesma atenção à forma como bens comerciais e agrícolas são produzidos, que depois compramos a baixo custo, também foi invocada por uma religiosa africana presente à conferência.

Esse encontro foi um grito de alarme, uma indicação do quanto cada um de nós possa fazer para combater o tráfico. E é mais uma vez a prova de quanto a criatividade feminina pode fazer quando se move livremente dentro da Igreja.

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