01 Dezembro 2017
“Sabemos que uma guerra nuclear em escala global destruiria a Terra e que essa ameaça existencial é supostamente o que mantém as potências nucleares sob controle. Porém, de acordo com um estudo publicado na revista American Geophysical Union em 2014, até mesmo uma "guerra nuclear limitada e regional", com 100 "armas nucleares pequenas" teria um efeito catastrófico sobre todo o globo”, constata o editorial da revista National Catholic Reporter, 30-11-2017. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.
Segundo o editorial, “estamos à beira de uma corrida armamentista irracional, e o governo atual vê pouco ou nenhum valor na diplomacia internacional. Que estranha sensação de déjà vu — é 1984 de novo, e o palco parece pronto para o Relógio do Apocalipse chegar ainda mais perto da meia-noite. Exceto pelo fato de que Francisco subiu no palco e está nos chamando de volta à sanidade”.
Desfile na Coreia do Norte exibe o arsenal de armas nucleares (Foto: Agência de Notícias da Coreia do Norte)
A condenação do Papa Francisco às armas nucleares, "a ameaça de sua utilização, bem como sua própria posse", chegou em um momento crucial, talvez em cima da hora. A possibilidade de armas nucleares serem realmente usadas e o cataclismo que seu uso poderia causar no planeta nunca foi tão grande.
Poucos dias depois de Donald Trump ter se tornado presidente, o Bulletin of the Atomic Scientists mudou os ponteiros de seu Relógio do Apocalipse para dois minutos e meio para a meia-noite. Entre as razões citadas para isso estavam o fato de a Coreia do Norte estar testando armas nucleares, as tensões entre os Estados Unidos e a Rússia, "um aumento do nacionalismo estridente em todo o mundo... bem como numa campanha presidencial dos EUA", e os comentários perturbadores de Trump sobre o uso e a proliferação de armas nucleares. Sabemos muito bem como estas tendências se aprofundaram e escureceram ao longo deste ano.
A única vez em que o relógio do juízo final esteve mais perto da meia-noite foi em 1953, depois que os Estados Unidos e a União Soviética começaram a testar bombas de hidrogênio e a corrida armamentista aumentou. Em 1984, quando as relações entre os EUA e os soviéticos estavam em um impasse e os EUA estavam ameaçando uma nova corrida armamentista, buscando um sistema de mísseis antibalísticos espacial, o relógio foi acertado para três para a meia-noite.
O arsenal nuclear mundial agora totaliza cerca de 15.000 armas: A Coreia do Norte deve ter 30 a 60 e manifestou claramente que está disposta a usá-las. O Paquistão e a Índia, cujas relações bilaterais parecem eternamente tensas, entrando em conflito por quatro vezes desde 1947, têm entre 120 e 140 armas nucleares cada. Israel deve ter 80. O Reino Unido tem 120 armas nucleares instaladas e 95 estocadas. A França, 290 implantadas e 10 estocadas. A China tem 270. A Rússia tem 7.000 armas nucleares — 1.910 implantadas, 2.390 estocadas e 2.700 inativas, esperando para ser desmanteladas. Os Estados Unidos têm 6.800 armas nucleares — 1.800 implantadas, 2.200 estocadas e 2.800 esperando para ser desmanteladas.
Sabemos que uma guerra nuclear em escala global destruiria a Terra e que essa ameaça existencial é supostamente o que mantém as potências nucleares sob controle. Porém, de acordo com um estudo publicado na revista American Geophysical Union em 2014, até mesmo uma "guerra nuclear limitada e regional", com 100 "armas nucleares pequenas" teria um efeito catastrófico sobre todo o globo.
As configurações iniciais de um ataque nuclear limitado eliminaria a camada de ozônio da Terra "em uma escala jamais observada", segundo o estudo, expondo as pessoas, os animais e as plantas a doses de radiação ultravioleta capazes de alterar os genes. Ao mesmo tempo, poeira e fuligem suspensas na atmosfera fariam temperaturas globais despencarem, encurtando ciclos germinativos, reduzindo drasticamente a produção de alimentos e causando uma "fome global nuclear".
Considerando tal cenário, a avaliação de Francisco está correta: "As armas de destruição em massa, principalmente as armas nucleares, criam apenas uma falsa sensação de segurança".
No entanto, muitos líderes mundiais enganam-se e enganam seu povo com conversas e planos de uma guerra nuclear. Sabemos as intenções da Coreia do Norte. Trump afirmou que ele quer o arsenal nuclear dos EUA em "boa forma" e "no topo".
O governo Trump tem abraçado totalmente uma modernização das forças nucleares, que começou com o Presidente Barack Obama e construiria cinco submarinos estratégicos, 72 bombardeiros estratégicos e 240 mísseis balísticos intercontinentais a um custo de US$ 1,2 trilhões ao longo de 30 anos, de acordo com o Escritório de Orçamento do Congresso (CBO, na sigla em inglês).
Enquanto isso, o governo Trump se recusou a recertificar o acordo nuclear do Irã e envia sinais contraditórios sobre o novo Tratado de Redução de Armas Estratégicas (novo START) com a Rússia. O acordo, de 2010, dá a ambos os países o prazo de até fevereiro de 2018 para reduzir as ogivas nucleares estratégicas implantadas para não mais do que 1.550. Ele também limita mísseis implantados em terra e em submarinos e bombardeiros com capacidade nuclear.
Propostas de orçamento apresentadas na Câmara do Congresso dos EUA interromperiam o financiamento do novo START em 2021, restringiria o financiamento para a organização do Organização do Tratado de Proibição Completa de Testes Nucleares e reduziria o financiamento do trabalho com a Rússia sobre segurança nuclear.
Estamos à beira de uma corrida armamentista irracional, e o governo atual vê pouco ou nenhum valor na diplomacia internacional. Que estranha sensação de déjà vu — é 1984 de novo, e o palco parece pronto para o Relógio do Apocalipse chegar ainda mais perto da meia-noite. Exceto pelo fato de que Francisco subiu no palco e está nos chamando de volta à sanidade.
É bom recordar que, em 1988, o Bulletin of the Atomic Scientists redefiniu o Relógio do Apocalipse para seis para a meia-noite. Nessa altura, Reagan e o líder soviético Mikhail Gorbachev tinham quebrado o gelo das relações bilaterais e colocado as duas nações em um curso de redução de armas, mas estavam sofrendo muita pressão da opinião pública. Grandes demonstrações de armas antinucleares em toda a Europa Ocidental e a América do Norte, sem dúvida, influenciaram líderes políticos.
No entanto, muitos líderes mundiais enganam-se e enganam seu povo com conversas e planos de uma guerra nuclear. Sabemos as intenções da Coreia do Norte. Trump afirmou que ele quer o arsenal nuclear dos EUA em "boa forma" e "no topo". "Quero modernização e reabilitação total."
Hoje, os Estados-membros da ONU estão assinando e ratificando o Tratado de Proibição de Armas Nucleares. Os nove Estados nucleares e alguns de seus aliados rejeitaram o Tratado, mas grande parte do resto da comunidade global apoia a iniciativa.
Assim como com os tratados internacionais que proibiram as minas terrestres e as armas químicas, será necessária ação cidadã global. A liderança de Francisco dá esperança de que se a comunidade mundial atuar em conjunto é possível influenciar a história novamente.
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Estamos à beira de uma corrida armamentista irracional, denuncia revista americana - Instituto Humanitas Unisinos - IHU