04 Novembro 2016
A próxima geração de católicos está lançando a ideia de “Crer, pertencer, tornar-se”.
“Para os nossos pais, sempre foi: ‘Creio, logo pertenço à Igreja”, disse uma jovem no congresso anual da organização católica La RED ocorrido em Seattle no último dia 22 de outubro.
A reportagem é de Soli Salgado, publicada por National Catholic Reporter, 03-11-2016. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
“A realidade agora é que os jovens católicos precisam se sentir como se pertencessem antes de acreditar”, disse a jovem, inicialmente refletindo sobre o tema dos católicos hispânicos, mas que acabou se valendo para o ministério jovem nos EUA em geral.
O futuro da Igreja Católica no país pode depender de ela prover este sentimento de pertença e, em particular, junto aos jovens hispânicos: 60% dos católicos americanos até 18 anos são hispânicos, de acordo com a Secretaria para a Diversidade na Igreja, órgão ligado à Conferência dos Bispos Católicos dos EUA. No entanto, apesar desta maioria, somente cerca de 1/4 das dioceses possuem um diretor para o ministério jovem voltado à comunidade hispânica, segundo dados de uma pesquisa feita pela Boston College.
La RED é uma organização nacional de entidades católicas e ministérios pastorais dedicada à juventude hispânica e jovens adultos. Realizada em Seattle, entre os dias 20 e 23 de outubro, a edição deste ano do congresso da rede reuniu mais de 100 membros para refletir e aprender com as experiências do passado, debater e analisar as atuais realidades compartilhadas e ponderar como poderá ser o futuro do ministério jovem hispânico.
O evento ocorre num momento em que a comunidade católica latina em todo os Estados Unidos está se organizando nas bases por meio do “V Encuentro” – diálogo estruturado em quatro anos entre os fiéis hispânicos, começando nas paróquias e terminando em nível nacional em 2018.
O denominador comum, tanto no processo do Encuentro quanto na rede, é uma comunidade latina “que ainda está no processo de definir quem devem ser e quem são em relação ao que Deus está convidando-os a ser aqui na Igreja americana”, disse Juan Pablo Padilla, coordenador da Pastoral Juvenil Hispana, da Arquidiocese de Chicago. “Este trabalho tem a ver com a maneira como estas pessoas se definem e como vão ajudar os bispos do país a compreenderem quem somos enquanto povo”.
Referindo-se ao Encontro como um processo para a vida toda, Padilla disse que abordar o ministério jovem é uma “continuação da caminhada da vida (...) O mais importante é ver como podemos ajudar os jovens a partir do nosso ponto de vista, como podemos nos conectar com Cristo, conectar com a causa de Cristo, e seguir a sua missão em vida”.
Mas o trabalho ministerial com este grupo demográfico deve estar envolvido com as suas necessidades: o que certa vez constituiu um grupo em grande maioria composto por imigrantes de primeira geração, hoje os jovens hispânicos são diversos inclusive entre si.
Entre eles estão imigrantes, filhos e netos de imigrantes vindos de 22 países latino-americanos. Alguns são bilíngues, enquanto outros falam somente inglês ou espanhol.
Assim, enquanto 93% dos hispânicos com menos de 18 anos nasceram nos EUA, de acordo com o Centro de Pesquisa Aplicada no Apostolado, aqueles que atuam no ministério jovem não podem deixar de prestar atenção a esse espectro, declarou Norma Velez de Garcia, coordenadora do ministério voltado aos jovens da Diocese de St. Augustine, na Flórida.
“Sempre temos de falar sobre uma primeira, segunda e terceira geração, mas temos também de prestar atenção aos que estão chegando, porque as ondas nunca param”, disse Velez de Garcia, membro da coordenação de La RED. “Continuamos tendo as primeiras gerações, e temos de estar disponíveis a elas. Temos de ter um trabalho social junto dessas pessoas, criar programas para elas. É preciso criar um programa para a Igreja nos EUA. Não é uma Igreja latina; é a Igreja dos Estados Unidos.
“É por isso que temos de prestar atenção e não esquecer ninguém. Quando chegam aqui, eles podem pensar: ‘Sou latino, mas não norte-americano, e ainda estou aprendo inglês’. Não é fácil. Essas pessoas podem não ter acesso aos campi universitários onde os programas se encontram. Portanto, temos de estar disponíveis”, contou ao National Catholic Reporter.
Empoderar os atuais líderes com recursos, para atuar com as novas gerações que buscam um espaço dentro da Igreja no país, deve ser uma prioridade do ministério jovem hispânico, acrescentou Walter Mena, assessor de La RED e diretor de formação no Instituto Fé e Vida.
“Temos de olhar para esta nova geração, ao mesmo tempo fortalecendo os jovens que já possuem formação e compreensão de seu próprio discipulado e vocação para servir os recém-chegados”, disse Mena. “Como disse o Papa Francisco, devemos ir onde as pessoas estão e acompanhá-las”.
Os objetivos do ministério hispânico não têm mais a ver com “bater à porta para conseguir entrar nas estruturas”, declarou Padilla, pois, conforme evidenciado no congresso, um grande número de hispânicos já está trabalhando como profissionais para suas dioceses, promovendo um ministério hispânico tanto para os jovens como para os adultos.
“Já estamos dentro da estrutura, mas agora com a grande responsabilidade de trazer os dons do nosso ministério para toda a Igreja”, falou. “Não quero necessariamente assimilar o ministério hispânico à Igreja em geral, porque ele sempre vai continuar a ter a sua própria identidade e ter a sua maneira própria de expressar a fé – isso deverá ser sempre respeitado. A questão é: como integrar os dons e todas as grandes coisas que desenvolvemos ao longo dos anos, incluindo as lideranças? Seria errado de nossa parte pensar que as nossas lideranças são líderes somente para a comunidade latina.
Como damos continuidade à nossa relação com a Conferência dos Bispos dos EUA e outras organizações não tradicionalmente ligadas ao ministério hispânico, mas que podem estar interessadas e tirarem um bom proveito? Nas palavras do Papa Francisco: como podemos continuar sendo construtores de pontes?
Além da importância da autoidentificação e do trabalho social interno junto à comunidade latina, muitas das inquietações que os ministros jovens hispânicos partilharam no fim de semana podem soar familiares aos demais agentes pastorais dos EUA:
• A falta de lideranças jovens nas dioceses, e os ministérios que perdem o contato com os jovens depois que saem para cursar a faculdade, onde os estudos e a vida social tendem a substituir a vida eclesial.
• Podemos falar entre si em espanhol, mas isso não está nos isolando das segunda e terceira gerações de latinos? Será que as pessoas não estão se unindo por se sentirem inseguras com o idioma inglês ou espanhol?
• Uma necessidade de eventos bilíngues – não somente inglês ou espanhol – para promover a integração. Não tem a ver somente com hispânicos irem a eventos em língua inglesa, mas também jovens nativos de inglês se sentirem confortáveis em ambientes hispânicos.
• Uma falta de espiritualidade com essa geração; se eles não sentem a Deus, que motivos teriam para se unir a um grupo?
• Os católicos jovens estão interessados em se tornar líderes e protagonistas, mas se os pastores não prestam atenção às suas necessidades, a juventude raramente toma a iniciativa.
Segundo Padilla, além de trabalhar junto aos hispânicos com passados e experiências diversas, o ministério jovem igualmente deve apelar a este grupo demográfico tentando responder a perguntas mais complexas.
“Cada vez mais, os latinos de minha idade ou mais jovem não necessariamente estão satisfeitos com o catolicismo entendido como uma coisa cultural. Ele é mais que isso: precisa significar algo, precisa dar um propósito à minha vida. Se eles estão fazendo estas perguntas sobre o propósito e o significado, e as respostas não estão sendo dadas pela religião ou comunidades religiosas onde participam, estas serão encontradas em outros lugares, e assim pessoas vão se afastando da Igreja e dos sacramentos caso não conectarmos o significado de ter uma vida de fé como católicos”.
Enquanto o restante do mundo vê uma população católica a envelhecer, os EUA veem uma população jovem surgindo em sua comunidade hispânica. Isso, diz Padilla, nos coloca numa “posição privilegiada” e deveria ser tomado como “um sinal poderoso de esperança”.
Para a felicidade dos membros mais antigos de La RED, mais de 25 participantes do congresso deste ano tinham menos de 30 anos. E a rede está ficando maior e mais jovem: Velez de Garcia contou ao National Catholic Reporter que foram acrescidos recentemente 25 novos membros vindos desde organizações nacionais a representantes diocesanos.
Veronica Mendez, jovem de 23 anos que trabalha no ministério jovem hispânico para a Arquidiocese de Seattle, disse que “a integridade de toda a comunidade é a minha grande preocupação neste momento. Como conectar os latinos com os demais americanos, e como fazer com que as comunidades anglo-saxônicas cheguem até nós também, vendo como resolvemos as coisas de um modo diferenciado”.
O fato de outros estarem passando pelo mesmo problema – tentando unir as comunidades ao mesmo tempo ministrando de acordo com as necessidades específicas dos hispânicos – foi uma revelação bem-vinda, acrescentou.
Francisco, quem fora constantemente invocado e citado ao longo do final de semana, provou ser um modelo para o grupo em Seattle. Vários participantes disseram que o papa demonstra a maneira como os latinos católicos – não “católicos latinos”, como um participante observou – deveriam agir para com o restante da Igreja nos EUA.
Assim como o pontificado não pertence exclusivamente à Argentina ou à América Latina, mas a toda a Igreja, também os frutos do ministério jovem hispânicos nos EUA pertencem a todos os americanos católicos.
“Isso tem a ver com os jovens católicos, não somente com a realidade latina”, concluiu Mena. “Abordar a realidade latina irá nos trazer algumas respostas sobre como abordar toda a população católica jovem no país”.
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Congresso em Seattle vê o futuro da Igreja americana na juventude hispânica - Instituto Humanitas Unisinos - IHU