19 Setembro 2016
Nas palavras de Zygmunt Bauman, o encontro pela paz que se inicia neste domingo em Assis nos diz isto: "É necessário confiar as esperanças do gênero humano não aos generais do choque de civilizações, mas a nós, soldados simples da vida cotidiana". Encontramo-lo no terraço com vista para a Cidade da Paz e, enquanto bebe um café, o mais afiado estudioso da sociedade pós-moderna reflete deste modo sobre as guerras e sobre o diálogo: "Nós não podemos nos isentar de viver juntos, e, se há uma palavra que deve ser repetida continuamente, é: diálogo".
A reportagem é de Stefania Falasca, publicada no jornal Avvenire, 18-09-2016. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
"Uma cultura que privilegie o diálogo e que deve ser parte da educação. O diálogo não é um café instantâneo, não dá efeitos imediatos. O diálogo é a paciência, a determinação e a profundidade. E a pessoa pública que pensa dessa maneira é o Papa Francisco", diz Bauman.
"Os políticos só dão um café instantâneo que é uma mentira. Não se pode negar que estamos em um estado de guerra, é verdade. Provavelmente, essa guerra também será longa, e os homens ‘fortes’ do panorama político não querem que isso ocorra. Mas, só com o diálogo, há vencedores, não perdedores."
Assis é cidade aberta, e a paz hoje é uma praça, nua e sem muros, onde é possível se olhar no rosto, perguntar e se interrogar, reconhecer-se como irmãos e cultivar juntos, perseverando nessa fraternidade. É a praça comum, não utópica, que o Santo Pobre de Assis percorreu, porque a paz é indivisível.
"Ou é um bem de todos ou não o é de ninguém", dissera João Paulo II há 30 anos, convocando para Assis os líderes de todas as fés religiosas para implorar a paz. E hoje ela é mais do que nunca necessária, como o pão.
Por isso, "não devemos permitir que as crenças religiosas sejam abusadas pela causa da violência ou da guerra", repete o Papa Francisco hoje insistentemente, continuando a agir concretamente e mostrando que não se trata de fábulas.
É possível, é um bem pessoal e que não pode ser derrogado, assim como é inderrogável "a necessidade de que os seguidores de diferentes religiões se encontrem, dialoguem, caminhem juntos e colaborem efetivamente pela paz, naquele ‘espírito de Assis’ que se refere ao luminoso testemunho evangélico de São Francisco".
Aliás, essa é a orientação do trabalho executado para realizar o atual encontro de três dias em Assis – por ocasião do 30º aniversário da jornada inter-religiosa desejada por João Paulo II – da diocese de Assis, das Famílias Franciscanas e da Comunidade de Santo Egídio, que, ao longo do tempo, optaram por dar vida e fazer crescer o "Espírito de Assis", pondo em campo iniciativas concretas, construindo, através da amizade, uma extensa rede de representantes de fés e culturas no horizonte da paz.
"A ideia de Assis é aquela que não vê mais uns contra os outros, mas uns ao lado dos outros. Por isso, aqui, não será encenado um ‘politicamente correto’ distante dos problemas e da história. Este não é um congresso para especialistas do diálogo", lembra Andrea Riccardi. A Europa, a África, o Oriente Médio, o Islã, a ecologia, o papel dos fiéis para conter a violência e o terrorismo, os refugiados chamam em causa cada um.
No dia 20 de setembro, o Papa Francisco chegará às 11 horas para o dia conclusivo. No Sacro Convento de São Francisco, ele irá se encontrar com cinco representantes das Igrejas e das religiões, e almoçará com eles, junto com um grupo de refugiados.
Em diversos lugares, para cada religião, se rezará pela paz, enquanto a oração ecumênica dos cristãos irá ocorrer na Basílica de São Francisco, para depois se concluir com um apelo, uma declaração e um gesto de paz.
O encontro iniciou nesse domingo. Três mil pessoas no Teatro Lyrick, para a assembleia de abertura. Mais de 500 são os líderes religiosos de nove línguas diferentes. Há também o presidente da República italiana, Sergio Mattarella. Entre eles, chegou também o rabino Avrham Steinberg.
"Construir a paz é uma das tarefas mais importantes para os líderes religiosos", diz Mohammad Sammak, conselheiro político do Grão-Mufti do Líbano, que não hesita em definir o papa como "líder espiritual para toda a humanidade".
E não podia faltar o Patriarca Ecumênico Bartolomeu, que, com o Papa Francisco, compartilha como irmão o "cuidado e a compaixão", a "força do diálogo e da ação ecumênicos", que "está em começar a ir além de nós mesmos e daquilo que é nosso, além das nossas comunidades e das nossas Igrejas, para a prioridade da solidariedade e do serviço".
O arcebispo de Ruen, Dominique Lebrun, lembrando o martírio do padre Jacques Hamel, também deu nesse domingo o seu testemunho. No sábado, depois de se encontrar com o papa em Roma, ele estava na fila em frente à Basílica Inferior de Assis para rezar no túmulo do Santo Pobre de Assis, com os 70 peregrinos da sua diocese. "Viemos para Assis para pedir a graça de purificar os nossos sentimentos – diz Lebrun –, de purificar o risco de confundir terrorismo e fé, também da dificuldade de perdoar. E a graça de um diálogo mais profundo com Ele."
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Encontro ecumênico em Assis: um chamado ao diálogo necessário - Instituto Humanitas Unisinos - IHU