09 Agosto 2016
O jornalista e ensaísta britânico Sam Kriss baixou e jogou Pokémon Go e não achou divertido. Na revista Jacobin, ele publicou uma crítica urgindo as pessoas a resistirem ao fenômeno. O argumento é de que o objetivo do jogo é obedecer e não criar. As pessoas são direcionadas a pontos já específicos, não há espaço para trilhar o próprio caminho. A ZH, ele comentou o texto por mensagens diretas no Twitter.
A reportagem foi publicada por Zero Hora, 09-08-2016.
– Eu discordo da ideia de que tudo tem de ser útil o tempo todo, há importância genuína em achar coisas a fazer que não estão sujeitas à produtividade. Meu argumento não é que Pokémon Go é estúpido e distrai as pessoas do trabalho e da política, mas ao contrário: não é divertido e reproduz algumas estruturas do próprio trabalho em vez da brincadeira – escreveu.
Para Ieda Rhoden, doutora em ócio e potencial humano, o tipo de sociedade em que vivemos, que valoriza muito o trabalho produtivo, leva às críticas ao estilo “sempre há coisa melhor para fazer” ou “vá trabalhar”. Os que admitem que querem um tempo para si, por exemplo, fora do trabalho produtivo são muitas vezes censurados, afirma a psicóloga.
Para ela, a preocupação deve recair sobre o tempo e a diversidade de atividades de quem gosta de jogar. O limite é que vai definir o quão nociva é a atividade. Se a diversão recai apenas em jogar, o alerta vermelho deve ser acionado.
– Para mim, que sou uma pessoa que gosta de sair e estar com pessoas, talvez não tenha muitos ganhos. Mas para um autista, ou uma pessoa com depressão, se o jogo fizer ela sair de casa, isso é muito bom – avalia.
Estigma em torno de quem é jogador
As comparações não param por aí. O psicólogo e professor da Unisinos Daniel Abs comenta que há um certo estigma em torno dos jogadores, que não são vistos com seriedade por quem não gosta de jogos eletrônicos. Treinadores de Pokémon Go são muitas vezes, nas redes sociais, sugeridos a adotarem a leitura em vez de jogarem. Pesquisa do Ibope encomendada pelo Instituto Pró-Livro e divulgada em março deste ano revelou que 44% dos brasileiros não leem e 74% revelam que não compraram algum livro nos últimos três meses – seja impresso ou em formato digital.
– Ler e jogar são atividades distintas, com propostas diferentes, de produção e de lazer. A criança tem de potencializar diversos espaços, a leitura é muito importante, ainda mais em um país onde se lê pouco, mas a ordem de pensamento feita no jogo também é interessante – defende Abs.
Mitos e verdades
Desde que foi lançado no início de julho (no Brasil foi no começo de agosto), o game de realidade aumentada vem provocando muita polêmica sobre privacidade de dados, acidentes, gasto de bateria, entre outras questões. Confira o que é verdade ou não.
Consome muitos dados
Mito. O Pokémon Go gasta menos dados do que o aplicativo do Facebook, por exemplo. De acordo com o site App Quest, que coleta informações de usuários sobre aplicativos para o sistema Android, o jogo consome uma média de 2,59 Mb por dia. No Facebook, usuários gastam em média 19,4 Mb. A P3, empresa americana que analisa dados, estima que cada sessão de Pokémon Go dura três minutos e consome 290 Kb de dados. Ou seja, isso seria menos de 1 Mb em 10 minutos jogando. Um usuário do Reddit afirmou que para pegar 568 Pokémons durante cerca de uma semana e meia gastou no total 86,6 Mb. O uso de dados depende do modelo e também dos ajustes de cada celular, mas, até agora, é consenso que Pokémon Go não vai usar todo o seu plano de 3G.
Gasta muita bateria
Verdade. Carregadores e baterias-extra são itens essenciais para os treinadores saírem às ruas. De acordo com a P3, Pokémon Go consome cerca de 50% mais bateria do que o aplicativo do YouTube ou do Facebook. Em média, o game gasta 30% de bateria por hora. Os números variam de acordo com o modelo e os ajustes do celular.
Fez o número de acidentes e assaltos aumentarem
Não há o que comprove. Depois do lançamento de Pokémon Go, as notícias sobre assaltos e acidentes envolvendo caçadores de bichinhos tomaram as timelines do Facebook. Autoridades policiais pelo mundo fazem um apelo para que os jogadores não brinquem enquanto estão dirigindo ou atravessando a rua. Um morador de Rio Grande, no Sul do Estado, registrou ocorrência na polícia, no fim de semana, alegando ter sido roubado enquanto caçava Pokémons. De acordo com o major Euclides Neto, chefe da assessoria de comunicação da Brigada Militar, os jogadores estão seguindo as instruções de segurança e cuidando os arredores. Não há como dizer se o número de assaltos aumentou por causa do jogo.
De acordo com Juranês Castro, coordenador de educação da EPTC, ainda é cedo para afirmar se o jogo causou impacto no número de acidentes.
– O relato que temos é de que as pessoas estão indo mais para praças, parques, centros universitários, e não jogando em vias. Não constatamos nada ainda – diz Castro.
O uso do celular é um fator de risco independentemente da atividade que faz o motorista tirar os olhos da rua, seja digitar uma mensagem de texto ou caçar Pokémons. Nos Estados Unidos, os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês) estimam que, em 2013, 424 mil pessoas foram feridas em acidentes de carro que envolviam um motorista distraído – o que inclui o uso de celular –, e 18% das ocorrências foram resultantes de distrações cometidas ao volante.
Pessoas já morreram e se machucaram enquanto jogavam
Verdade. O último caso foi de um jovem de 20 anos em um parque em San Francisco, nos Estados Unidos. Ele estaria jogando com os amigos quando levou um tiro. O jogo não está diretamente ligado à morte, mas o jovem poderia estar distraído olhando para o celular quando o atirador se aproximou. Na Califórnia, dois homens caíram de um penhasco jogando. Assim como qualquer outra atividade feita no smartphone, os jogadores devem manter a atenção ao ambiente durante todos os momentos e verificar se as áreas com Pokéstops são seguras. Jamais vá a um local sem ignorar a segurança daquela região.
Pokémon Go coleta dados de usuários
Verdade. O jogo coleta e guarda informações sobre a sua localização, o seu endereço de e-mail usado para fazer o login, endereço de IP, tipo de navegador usado, sistema operacional e até mesmo último site visitado antes de acessar os serviços do Pokémon Go. Para evitar colocar em risco qualquer informação da sua conta no Google, no caso de eventuais roubos de dados, crie uma conta exclusiva para jogar e não use seu nome ou informações que remetam diretamente a você. Você pode, também, revogar o acesso de certos recursos ao aplicativo nas configurações. É possível jogar sem o uso da câmera, se preferir. Mas o Pokémon Go está longe de ser o único aplicativo que coleta dados. O Facebook, por exemplo, recolhe informações desde a sua atividade a qualidade do sinal que seu celular recebe, a duração da bateria e também a geolocalização. Na política de privacidade, a empresa também afirma que recebe informações relacionadas ao comportamento dos usuários de outras empresas parceiras do Facebook.
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“Ler e jogar são atividades distintas”, diz psicólogo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU