12 Abril 2016
O documento pós-sinodal abre caminho à aceitação da diversidade! O Papa encerra a época da Igreja fundada sobre a normatividade e abre caminho à aceitação da diversidade. É este o dado explosivo do documento pós-sinodal Amoris laetitia, apresentado sexta-feira no Vaticano.
A reportagem é de Francisco Peloso, publicada pelo jornal L'Unità, 09-04-2016. A tradução é de Benno Dischinger.
A superação da Igreja aduana, cuja imagem vinha sendo transmitida pelos doutores da lei e da insistência sobre as proibições e os preceitos a seguir com precisão milimétrica, foi de resto, desde o início de seu pontificado, um dos principais objetivos que o Papa se havia prefixado de atingir, mesmo abrindo um difícil debate interno. Com a Exortação apostólica pós-sinodal, encerra-se a fase da desconstrução de um modelo fundado sobre a norma, sobre a lei canônica, sobre documentos da Congregação da doutrina da fé, e se inicia a fase mais profunda e interessante da reforma da Igreja, aquela da integração e da acolhida.
Francisco proclamou bem dois sínodos sobre a família, conclamando de fato o amplo componente conservador do episcopado mundial a sair do entrincheiramento integralista do conflito com a modernidade, do bunker bio ético - princípio retomado também em Amoris Laetitia – de um árido rigorismo e de uma aliança política com os poderosos do mundo em condições de garantir posições de privilégio a uma Igreja que viva um lento declínio.
Os sínodos reabriram uma discussão verdadeira e articulada entre bispos e cardeais, não só sem os golpes baixos dos setores mais extremistas, mas no final, também aqui prevaleceu o método já prospectado pelo Concílio Vaticano II, ou seja, a ‘sinodalidade’, a discussão aberta e real – portanto às vezes áspera – para atingir pontos de entendimento comum. E então, um pouco de cada vez, veio à luz – primeiro temerosa, depois sempre mais segura – uma Igreja que ‘esperava’ um Papa como Francisco; bispos de diversa formação e nacionalidade tomaram a palavra para defender as mudanças propostas por Bergoglio. Entre eles despontou por autoridade, capacidade de ter conjuntamente as várias sensibilidades e a escuta dos sinais dos tempos, o cardeal Christoph Schönborn, arcebispo de Viena, ao qual também foi confiada a apresentação do documento no Vaticano.
No mérito, o texto substitui a uma norma conservadora uma norma liberal, mas realmente muda, como se dizia, completamente o método: a norma torna-se uma referência à qual olhar para orientar-se, para construir um caminho que não é mais o absoluto ideológico. E é precisamente a ausência de uma normativa nova sobre os divorciados redesposados – neste caso que estabeleça a admissão generalizada à eucaristia – o fato novo.
Trata-se, concretamente, da possibilidade, da chance, dada aos casais, a cada fiel, da novidade, com consciência e responsabilidade, do reconhecimento de um caminho pessoal. Se este é o elemento de novidade importante, isso vem coligado ao outro aspecto fundamental, ou seja, ao papel do pastor, do sacerdote, do bispo, chamado a confrontar-se com a complexidade da experiência humana e a distinguir os vários casos, a “discernir” cada situação num diálogo real com as pessoas. O que requer à Igreja um enorme salto de qualidade, pois se trata de uma reforma potencialmente de grande alcance, mas necessitará ver até que ponto o desalinhado corpo eclesial saberá digerir e depois aplicar de modo inovador esta indicação que revolve todo um mundo, e assigna ao pastor responsabilidades às quais jamais esteve habituado.
Enfim, o documento toca temas relevantes, trazendo um pouco de ar fresco na Igreja: o erotismo e a sexualidade tornam-se um tema do qual se fala livremente e se lhe reconhece a importância na experiência afetiva (não é mais um mal necessário para a procriação), enfrenta-se a questão da educação sexual dos filhos, vista como um aspecto significativo e a cuidar da formação, da violência sobre as mulheres (e num documento sobre a família a coisa adquire particular valor), da igualdade entre os sexos, das famílias dos migrantes, das pobres e da felicidade, porque o matrimônio ou uma vida afetiva não podem e não devem ser marcados pela rigidez da norma, de um uso consumista do outro ou da subjugação.
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“Amoris laetitia” [Alegria do amor], Bergoglio volta a desafiar os conservadorismos da Igreja - Instituto Humanitas Unisinos - IHU