08 Novembro 2019
Os saduceus afirmam que não existe ressurreição. Alguns deles se aproximaram de Jesus, e lhe propuseram este caso:
“Mestre, Moisés escreveu para nós: ‘Se alguém morrer, e deixar a esposa sem filhos, o irmão desse homem deve casar-se com a viúva, a fim de que possam ter filhos em nome do irmão que morreu’. Ora, havia sete irmãos. O primeiro casou e morreu, sem ter filhos. Também o segundo e o terceiro casaram-se com a viúva. E assim os sete. Todos morreram sem deixar filhos. Por fim, morreu também a mulher. E agora? Na ressurreição, de quem a mulher vai ser esposa? Todos os sete se casaram com ela!”.
Jesus respondeu: “Nesta vida, os homens e as mulheres se casam, mas os que Deus julgar dignos da ressurreição dos mortos e de participar da vida futura, não se casarão mais, porque não podem mais morrer, pois serão como os anjos. E serão filhos de Deus, porque ressuscitaram. E que os mortos ressuscitam, já Moisés indica na passagem da sarça, quando chama o Senhor de ‘o Deus de Abraão, o Deus de Isaac e o Deus de Jacó’. Deus não é Deus de mortos, mas de vivos, pois todos vivem para ele”.
Alguns doutores da Lei disseram a Jesus: “Foi uma boa resposta, Mestre”. E ninguém mais tinha coragem de perguntar coisa nenhuma a Jesus.
Leitura do Evangelho de Lucas capítulo 20,27-38. (Correspondente ao 32º Domingo do Tempo Comum, ciclo C do Ano Litúrgico).
O comentário é de Ana Maria Casarotti, Missionária de Cristo Ressuscitado.
Neste domingo a liturgia convida-nos a refletir sobre a pergunta que traspassa a história da humanidade: quais são os horizontes últimos da vida humana? Há uma vida que não acaba? Como é a vida depois da morte?
No evangelho de Lucas que lemos hoje, Jesus já está em Jerusalém e sabe que seu fim está próximo. Ele continua ensinando e comunicando a Boa Notícia do Reino aos ouvintes que desejam segui-lo e ser seus discípulos. Um grupo de saduceus se aproxima de Jesus com a intenção de ridicularizá-lo. O texto acrescenta que são os que “afirmam que não existe ressurreição”. Lembremos que os saduceus eram um grupo aristocrático, recrutado dos sacerdotes e leigos. Apesar de ser um pequeno número, tinham uma importante influência com as autoridades romanas pelo seu dinheiro e seus vínculos. Eles reconheciam somente a Lei escrita e rejeitavam a interpretação tradicional e seu desenvolvimento posterior. O Pentateuco era possivelmente o único texto que eles consideravam como canônico. Sua prática religiosa era muito conservadora. Para eles não existia nenhum tipo de sobrevivência após a morte, nem anjos nem espíritos, assim como não acreditam no juízo de Deus. O bem e o mal dependem da conduta de cada pessoa humana sem intervenção divina. A desgraça ou o bem-estar é obtido pelas atitudes do próprio ser humano e Deus não tem nada a ver com isso.
Este grupo de saduceus se dirige a Jesus chamando-o de Mestre, mas possivelmente sem acreditar no verdadeiro sentido dessa palavra. Difícil pensar que eles o considerassem Mestre, senão como uma forma de dirigir-se a Jesus ironicamente procurando ridicularizá-lo. Que significa essa expressão para este grupo de pessoas que não acredita em Jesus e que somente procura ironizá-lo e caçoar dele em alguma contradição?
Os saduceus se aproximam de Jesus e lhe propõem um caso que se refere à prática da Lei do Levirato. Com o objetivo de garantir a descendência, a lei explica o que deve fazer um homem depois da morte do seu irmão. A viúva deve casar-se com ele para continuar a descendência da sua família. No exemplo apresentado pelos saduceus a Jesus, aparentemente não negam a ressurreição, mas tentam entendê-la desde conceições humanas e assim deixar à vista o sem sentido desta crença. Eles procuram compreender a ressurreição desde perspectivas humanas, como uma prolongação da vida terrena e de muitas formas Jesus mostra que a vida depois da morte pode-se aceitar e entender somente desde a fé e alimentada pela esperança. Esta pergunta desenha um imaginário errôneo de ressurreição como repetição desta vida, anulando a novidade que a ressurreição cria, gera, não regida mais pelas leis físicas ou biológicas, senão pelo amor de Deus no qual a criatura ressuscitada participa.
A ressurreição é uma realidade que nos espera, mas que não pode ser compreendida desde nossa vida limitada e ainda menos com as categorias que marcam nossa existência finita e limitada deste mundo. A ressurreição é um mistério, que se alimenta pela fé. A esperança fortalece a construção desta nova existência como um horizonte que nos espera e acrescenta-se pela fé e a confiança em Deus.
Na sua resposta, Jesus convida-nos a levantar nosso olhar além do que está ao alcance do nosso cotidiano. Jesus veio a proclamar um Reino no qual a verdadeira filiação é aquela que nos liga a Deus. Esse é o vínculo que permanece. Deus é um ser em relação: Pai, Filho e Espírito Santo e também relação de Deus com o ser humano de todos os tempos: o Deus de Abraão, o Deus de Isaac, o Deus de Jacob. Assim apresenta-se uma relação que não conhece a morte. Deus permanece e o homem está chamado a ressuscitar e a aliança que estabelece com Deus não conhece o ocaso, não tem fim.
Tomando as palavras de Moisés, Jesus afirma sua crença num Deus que “não é Deus de mortos, mas de vivos, pois todos vivem para ele”. Ele conhece o amor de seu Pai por cada uma de suas criaturas e sabe também que esse amor criador, incondicional, é mais forte que a morte, a ponto de ele mesmo chegar a proclamar: “Eu sou a ressurreição e a vida, quem acredita em mim, mesmo que morra viverá” (Jo 11, 22).
O texto de hoje quer também esclarecer o conceito de ressurreição. Podemos fazer uma parada e nos perguntar qual é nossa ideia sobre a ressurreição dos mortos. Jesus, ao ressuscitar, alcança sua plenitude humana; seus irmãos e irmãs que morrem, ao ressuscitar, não perdem sua identidade, continuam sendo eles/as e seu mundo de relações que os/as definem, mas de uma maneira mais plena, total, que transcende as barreiras do tempo e do espaço.
Antes elas aludem à plenitude do novo modo de existência, em que o amor, porque estará livre do egoísmo, não se submeterá à rivalidade e à exclusão. Os vínculos e o amor se conservarão, mas já não se limitarão à vida e às relações, mas se expandirão para alegria de todos. Assim sendo, o evangelho de hoje é um convite a renovar nossa fé no Deus da vida, que fez de seu filho Jesus o primogênito dos que ressuscitam dos mortos, criando para nós o caminho da vida eterna.
Crer na ressurreição de Jesus nos leva a celebrar a vida nova de nossos mortos, e a esperar ativamente nos encontrar todos e todas no banquete eterno onde todos, sem exceção, nos sentaremos à mesma mesa dos filhos e filhas de Deus.
Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano
Vive uma louca chamada Esperança
E ela pensa que quando todas as sirenas
Todas as buzinas
Todos os reco-recos tocarem
Atira-se....E
— ó delicioso voo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,
Outra vez criança...
E em torno dela indagará o povo:
— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela lhes dirá
(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:
— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA...
Mario Quintana
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Um Deus de vivos, não de mortos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU