02 Novembro 2018
Publicamos aqui o comentário do Ir. Luciano, monge da Comunidade de Bose, sobre o Evangelho desta solenidade de Todos os Santos, 4 de novembro (Mc 5, 1-12a). A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A festa de Todos os Santos é a celebração da vitória da misericórdia de Deus sobre o pecado e sobre a fraqueza do ser humano. Santidade, aliás, é um caminho, não um estado: seguimento do Cordeiro, tensão dinâmica entre o que somos e o que seremos, caminho cotidiano em que se experimenta a comunhão com Cristo e, assim, a bem-aventurança, mesmo nas dificuldades.
A comunhão dos santos celebrada hoje lembra aos cristãos que a santidade tem uma dimensão de comunhão e de comunidade. No Novo Testamento, “santos” é o nome dos cristãos chamados a formar um só corpo em Cristo, separando-se da mundanidade, e é, portanto, como corpo que eles devem narrar e testemunhar a santidade.
Ou seja: é na qualidade das relações que atravessam a comunidade cristã e que ela vive com todas as pessoas e as realidades históricas que deve emergir a luz da santidade que se reflete na comunhão.
Isso é ainda mais importante se pensarmos que a tradição ocidental individualizou e moralizou a santidade. Para a revelação cristã, em vez disso, o santo é a pessoa que, por graça, reflete na sua vida e nas suas relações a luz de Deus que brilha no rosto de Cristo e que lhe é comunicada pelo Espírito Santo.
“Na vida dos nossos companheiros de humanidade mais perfeitamente transformados à imagem de Cristo, Deus revela aos homens, de maneira mais viva, a sua presença e o seu rosto. Neles, o próprio Deus nos fala, nos dá um sinal do seu Reino, para o qual somos fortemente atraídos” (Lumen gentium, n. 50).
Os santos são nossos irmãos em humanidade, também eles marcados, como nós, por fragilidades e vulnerabilidades: não são “sem pecado”, mas pessoas que creem na misericórdia de Deus mais forte do que a sua fraqueza, embora poderosa.
Portanto, trata-se de ser humanamente santos, semelhantes àquele que, na sua humanidade, narrou plenamente o rosto de Deus. Não silhuetas espirituais ou almas devotas, mas homens e mulheres que, com humilde resolução que brota da consciente acolhida do dom da graça, vivem a sua humanidade em Cristo: esses são os santos e os santos.
E, se o texto do Evangelho sugere conjugar a santidade como bem-aventurança, a bem-aventurança não elimina o sofrimento e a tribulação, mas as pressupõe. Afligidos, perseguidos, atribulados, os santos não são apenas vulneráveis, mas também realmente vulnerados, feridos e, mesmo assim, “encontraram força na sua própria fraqueza” (Hb 11, 34).
Um obstáculo à santidade não é a fraqueza como tal, mas o fato de negá-la: assumindo-a diante do Senhor santo e misericordioso, ela pode se tornar fortaleza. E a fortaleza cristã pressupõe a vulnerabilidade. No centro dessa transfiguração da fraqueza em força, está a fé que leva a viver contradições e provações como ocasião de seguimento do Cordeiro.
O primeiro nível das bem-aventuranças é cristológico: aquilo que as bem-aventuranças atribuem aos homens e às mulheres é o que foi vivido por Cristo e, por ele, graças ao Espírito que age na pessoa que crê, é comunicado aos seres humanos.
Elas, portanto, não pregam resignação, mas suscitam uma esperança: as situações de aflição e de perseguição não têm a última palavra, não encerram inexoravelmente o ser humano no seu presente de miséria, mas lhe abrem a perspectiva de um futuro que incide profundamente hoje.
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