08 Dezembro 2018
O tribunal eleitoral boliviano (TSE) deu sinal verde para a admissão de um quarto mandato ao presidente Evo Morales, em meio a protestos que demandam a inabilitação da candidatura do mandatário. No entanto, após escutar as críticas da oposição, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da OEA afirmou que precisa de tempo para examinar a reeleição definida na Bolívia. “Daremos a devida consideração aos argumentos de cada parte”, disse a presidente da CIDH, Margarette May Macaulay, ao final de uma hora de audiência pública em Washington, sem apresentar datas de quando se pronunciará. “É necessário tempo para chegar a uma conclusão”, afirmou.
A reportagem é publicada por Página/12, 07-12-2018. A tradução é do Cepat.
A Sala Plena do Tribunal Superior Eleitoral aprovou, na terça-feira, a habilitação de oito candidaturas às primárias em janeiro, entre as quais está a do binômio Evo Morales – Álvaro García. A Igreja Católica, opositora ao Movimento ao Socialismo (MAS), foi uma das primeiras a reagir à decisão do TSE. “O tribunal não atuou como poder autônomo, colocando em dúvida as bases da democracia e abrindo um futuro incerto para os bolivianos”, advertiu em um comunicado. A decisão do tribunal desencadeou, além disso, protestos no país e uma paralisação nacional no dia de ontem.
Em 2016, Morales convocou um referendo sobre a possibilidade de uma nova candidatura, no qual majoritariamente venceu o não. Segundo o presidente da Bolívia, a eleição foi condicionada por uma falsa notícia que afirmava que ele tinha um filho não reconhecido. Depois disso, em 2017, o Tribunal Constitucional autorizou sua candidatura para o período 2020 e 2025, sendo confirmada esta semana pelo TSE. No entanto, a oposição ao dirigente de esquerda se ampara no resultado negativo do referendo para tentar proibir sua candidatura.
Ontem, grupos de ativistas bloquearam as ruas com bandeiras bolivianas e cartazes com a legenda “Bolívia disse Não”. Nas primeiras horas da manhã, a convocação para os protestos havia cumprido seu objetivo de impedir o trânsito normal de carros, cortando as principais ruas e avenidas das cidades. Apesar da contundência da medida, especialmente em bairros de classe média e alta de La Paz, sede dos poderes Executivo, Legislativo e Eleitoral, a participação cidadã não foi massiva.
Milhares de pessoas, entre empregados e estudantes, fizeram filas na estação de teleférico da exclusiva zona sul para se transportar ao centro de La Paz, porque outros meios, como o serviço municipal de coletivos, estavam paralisados. Imagens de televisão mostraram que os protestos foram mais massivos em Santa Cruz, no leste do país, cujo governador Rubén Costas lidera a oposição a Morales. A jornada de protesto foi menor nas cidades de El Alto, a vizinha de La Paz, e Oruro (sul), um setor ligado ao governo atual.
Diante do quadro de protestos, a presidente da Câmara dos Deputados, Gabriela Montaño, acusou a oposição de pretender criar mecanismos de convulsão social. Morales, por sua parte, recordou ontem com vários tuítes as conquistas de seus 12 anos de governo. “Queremos render homenagens ao povo boliviano que em um dia como hoje, em 2009, bolivianos e bolivianas disseram, mediante seu voto e com profundo sentimento democrático, sepultar os partidos neoliberais e dar um contundente apoio à Revolução Democrática e Cultural”, tuitou. Também homenageou a soberania alcançada após a expulsão da embaixada dos Estados Unidos em seu país: “como hoje, 2001, recordou que Manuel Rocha, embaixador dos Estados Unidos, disse que indígenas e cocaleiros, a quem chamou “talibãs”, eram o grande problema do país, porque combatiam o modelo imposto pelo império a Tuto Quiroga. Agora, somos soberanos, mas é bom recordar esses tempos”.
A oposição se organiza, principalmente, por trás de dois políticos: o ex-presidente Carlos Mesa, a quem as pesquisas colocam como o principal rival de Morales nas eleições gerais de outubro de 2019, e Samuel Doria Medina, derrotado três vezes nas urnas por Morales. Após a decisão do TSE sobre a candidatura, Mesa expressou: “a ação submissa diante deste governo autoritário é expressa pelo TSE, que como quem lê uma instrução intranscendente, deu um golpe de morte em nossa democracia, habilitando como candidato o dono de todos os poderes, Evo Morales”, tuitou.
Por sua parte, Medina também lançou suas críticas. “Esta é a mais grave afronta à democracia, desde sua reconquista em 1982”, tuitou. Além disso, o opositor convocou para a formação de uma frente unida: “a oposição deve rejeitar de maneira contundente essa decisão e, por sua vez, deve se unificar em um só projeto para frear a ditadura”. Por sua parte, o prefeito opositor de La Paz, Luis Revilla, afirmou que “o que resta agora é resistir a esta decisão, é voltarmos às mobilizações, para evitar que esta decisão se consuma”. Oscar Ortiz, outro dos políticos opositores, convidou para se mobilizar sob a consigna: “lutar pelo respeito à Constituição e ao voto de 21F (21 de fevereiro de 2016)”. Não conformado com a decisão do Tribunal, Ortiz viajou, na última terça-feira, à sede da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em Washington, para advertir sobre o que ele considera uma admissão inconstitucional.
A greve de ontem foi formada por três marchas que chegaram a La Paz de três regiões: os Andes, os vales subtropicais e a planície. De imediato, o ministro de Governo (Interior), Carlos Romero, expressou que a paralisação cívica de 24 horas não seria objeto de interferências. Segundo o ministro, as mobilizações do dia de ontem não passaram de 5.000 pessoas. “As manifestações de observação, de rejeição e posicionamento político (contra o governo) merecem todo o nosso respeito e garantias”, acrescentou. No entanto, em outros lugares de La Paz, como nas redondezas do TSE, aconteceram protestos de ativistas, alguns dos quais amarraram seus braços estendidos em madeiras que assemelham a uma cruz.
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Bolívia. Evo comemorou a sentença que permite sua reeleição - Instituto Humanitas Unisinos - IHU