14 Novembro 2018
A Lei Maria da Penha num cordel declamado por uma linda menina.
"Por mais que se fala em financiamento externo ou fake news, isso é absolutamente irrelevante. O fato de que um pequeno grupo folclórico, até então, de extrema direita conseguiu, por uma espécie de sexto sentido, enxergar alguma coisa ante de si e, pelo simples faro, dizer 'é a nossa hora' e contornar um sistema político e de financiamento de campanha, contornar os grandes partidos políticos, golpear a mídia e fazer quase 60 milhões de votos. Em cinco anos. Exatamente de 2013 a 2018. Essa é a novidade.(...) se existe alguma política leninista no Brasil neste momento, ela foi feita pela extrema direita. Havia uma vanguarda informal. Eles se organizaram, interpretaram um movimento de rebelião de massas que foi 2013, disseram para aqueles que foram às ruas qual era o programa deles (que eles não sabiam ao certo qual era, não era apenas corrupção), por que eles buscando, por que eles estavam indignados, por que a corrupção os deixava naquele estado, o que significava os megaeventos…"
Não dá para não ler uma entrevista em que Paulo Arantes fale da conjuntura política. É um dos pensadores mais originais entre os que refletem sobre o Brasil hoje. Há várias conclusões aqui que são essenciais e algumas outras com as quais tenho ligeiro desacordo. O que mais gostei:
- Política leninista hoje quem faz é a extrema-direita. Foi ela quem soube dizer a uma multidão que estava nas ruas o que era exatamente que aquela multidão queria.
- Na esquerda, foi desaparecendo a política entendida como luta, substituída agora pela gestão, pelo negócio, pela administração do Estado. Política de esquerda nos últimos 20 anos passou a ser gestão estatal. O nome disso? Petismo.
- Pode se falar de fake news e de financiamento estrangeiro o quanto se queira, mas a pergunta fundamental não é essa. É outra: o que estamos entendendo por democracia quando nós entendemos essa grande vitória política da extrema-direita como uma ameaça à democracia? Que democracia existia antes que nos estão ameaçando?
Há também várias previsões, que a gente pode anotar para cobrar depois. É a melhor leitura que há por aí do pós-eleições, com certeza.
O melhor cenário institucional para o médio prazo é que haja uma oposição a despeito do PT, isolando o partido e incluindo-o, posteriormente, como sócio minoritário do bloco de oposição. Quem esperneia que o PT tem 56 deputados talvez devesse tentar imaginar outras formas de inclusão que não a entrega da hegemonia da oposição ao PT. Os parlamentares petistas são bem-vindos. O controle da cúpula, não. É uma estratégia simples e da qual o próprio PT usou e abusou na última década e meia: com a posição de força dentro do bloco, contou com a força gravitacional da ideologia para arrastar a todos os demais partidos de oposição. Quem não se dobrava, era de direita. Cabe repetí-la com o petismo caso necessário até a desmoralização (outro grande hit do hegemonismo lulista).
Isso significa que Ciro Gomes seria o grande líder que precisamos? Não só não é, como tampouco é de um grande líder que precisamos, mas o personalismo cirista teria bases bastante frágeis. As vantagens seriam de duas ordens: em primeiro lugar, uma oposição liderada pelo PT é o sonho do governo Bolsonaro e portanto uma oposição que fosse organizada quebrando a hegemonia petista em primeiro lugar seria um grande acerto. Em segundo lugar, esse "cirismo parlamentar" teria bases muito mais frágeis que o lulismo (enquanto primeiro é apenas um personalismo, o segundo é um personalismo acoplado a um partido de massas que, por sua vez, controla sindicatos e movimentos sociais) e seria um cenário muito mais favorável à invenção de outras possibilidades organizativas. À sombra de Lula e do PT nada cresce (aliás, aos esperançosos na renovação haddadista, recomendo relembrarem as perguntas que faziam sobre Marina Silva, afinal o professor sumiu).
Agora, se alguém me perguntar se eu acho que isso vai acontecer e se vou me engajar nesse sentido, minha resposta é um duplo não. Não acho que as esquerdas vão ter a inteligência de dobrar o lulismo no parlamento e tampouco acredito que esse cenário depende de qualquer engajamento meu na sua construção. O fiel escudeiro do lulismo, o PSOL, já saiu a campo para declarar inadmissível uma oposição sem o PT. Pior ainda, ambos os partidos avaliaram publicamente que as eleições em que se elegeu Jair Bolsonaro presidente do Brasil foram um sucesso. É um forte sinal para quem imagina que ambos os partidos pensem a política de forma ampla. Não apenas não pensam, como sequer tem o pudor de assumir isso publicamente dias após a eleição de um presidente de extrema direita.
Toda vez que alguém questiona se o Bolsonaro não é burro demais para fazer firehosing ou demais táticas, eu me lembro que o presidente eleito do Brasil tem, por baixo, uns vinte pontos de QI sobre o presidente norte-americano. Trump fala como uma criança de 5 anos, Bolsonaro como um pré-adolescente de 13.
E há dois anos, Trump está dando um banho em todos os experts em mídia...
As trapalhadas são parte da tática. Afinal, é justamente uma tática que se vale das trapalhadas para desacreditarmos nas políticas ruins intencionais e de fato aplicadas.
Moro me veio a público dizer que quer que aumente o número de policiais infiltrados no crime organizado. Jênio!
Eu já posso até imaginar a cena: um policial se infiltra numa milícia e é descoberto pelo seu ex-comandante, agora chefe-da-milícia; outro policial se infiltra no tráfico de drogas para descobrir quem é o chefe e descobre que é o comandante do batalhão; uma mega-operação tenta investigar alguma coisa sobre tráfico de armas e descobre que o chefão é um general do exército.
Não precisa infiltrar ninguém, Moro. Basta grampear os celulares dos próprios policiais.
Não existe crime organizado sem corrupção das forças policiais e de segurança.
Hoje, terça, por volta do meio-dia, num vagão do metrô na Cinelândia, cheio de gente, um PM puxou a arma e ameaçou atirar, causando pânico generalizado.
Uma passageira contou o que aconteceu, segundo o Globo Online:
— O homem que estava armado pediu para o outro levantar e ceder o lugar para um idoso. O homem, mais alto e forte, resolveu encará-lo e, revoltado, o outro puxou a arma. Aí eu não vi mais nada porque as pessoas começaram a correr desesperadas.
É impressionante o despreparo dos PMs. Quando eles vão aprender que não se puxa uma arma de fogo num ambiente repleto de gente?
Lendo ontem a carta de São Paulo a Tito, encontrei a palavra-chave para definir esse amigo querido, Leonardo Boff, que completa 80 anos no dia 14 de dezembro. O texto fala em "amigo do bem". Acrescendo ainda outro termo, tirado da letra de Gilberto Gil em seu último CD: um homem de "alma nobre". Fico muito feliz de encontrar nele um amigo querido ao longo de minha caminhada. No próximo dia 28 de novembro, em Petrópolis, haverá o lançamento de dois livros fundamentais em torno de Leonardo. O primeiro com testemunhos de amigos queridos e o outro, onde Boff reage a questões lançadas por amigos e especialistas em torno de sua teologia. Livros preciosos. Já combinei com ele e a Márcia de fazermos também o lançamento do livro aqui em Juiz de Fora em março de 2019. Sempre gosto de dizer que Leonardo é um místico de olhos abertos e coração sedento. Alguém tomado pelo amor radical ao Mistério, que está por todo canto. Nos últimos anos de sua vida, nesses tempos sombrios, tem se ocupado muito com a reflexão sobre a Terra, sobre a consciência da interligação de tudo, e também com a espiritualidade, que é a raiz que anima todo o seu trabalho. Dizia ele: "A esta altura da vida, mais e mais ocupa minha mente e abrasa o meu coração a questão de Deus". E conclui: "Deus-Trindade permanece para mim mistério insondável. Termino sempre no nobre silêncio. Mas é um mistério de ternura, de embaçamento e de inenarrável comunhão. Ao tombar como uma árvore, espero cair em seus braços e ser aconchegado em seu útero materno e paterno".
Viva Leonardo Boff! Iniciando a comemoração festiva de seus oitenta anos.
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