25 Agosto 2018
"Como foi amplamente divulgado, todos os grupos pró-LGBT que solicitaram um estande na sala de exposições do Encontro Mundial de Famílias foram rejeitados. A maioria não recebeu sequer a dignidade de ser informada de que foi rejeitada. Eles simplesmente não receberam uma resposta dos organizadores do congresso", escreve Jamie Manson, colunista do NCR e editora de livros, em artigo publicado por National Catholic Reporter, 24-08-2018. A tradução é de Victor D. Thiesen.
Se os organizadores do Encontro Mundial das Famílias tiveram alguma esperança de abafar as questões LGBTQ na igreja, essas aspirações foram rápida e habilmente frustradas por ativistas católicos LGBTQ e seus aliados em Dublin nesta semana.
Como Sarah Mac Donald relatou, a campanha começou um dia antes da abertura do Encontro Mundial das Famílias com o lançamento de um novo projeto de pesquisa acadêmico, patrocinado pelo Wijngaards Institute, sobre a teologia da sexualidade e gênero.
A ex-presidente da Irlanda, Mary McAleese, que liderou o lançamento, falou poderosamente sobre a necessidade da Igreja ser responsabilidade pelos danos que seus ensinamentos infligiram às pessoas LGBT, particularmente aos jovens. Ela se referiu a um Relatório LGBT da Irlanda de 2016 que concluiu que um terço dos jovens LGBT tentou o suicídio.
O evento também incluiu um depoimento comovente de Marianne Duddy-Burke, diretora executiva da DignityUSA, que relatou as dificuldades que ela e sua esposa, Becky, tiveram ao tentar adotar seus dois filhos, Emily e Finn, de uma agência católica.
Uma das crianças nasceu viciada em heroína e a outra foi tão maltratada que ficou muda por dois anos. As crianças sofreram esses abusos nas mãos de pais heterossexuais. E, no entanto, Marianne e Becky foram informados de que, na condição de casal do mesmo sexo, não eram capazes de ser pais.
Duddy-Burke, Becky, Emily e Finn são a única família abertamente do arco-íris (referência à bandeira do movimento LGBT) a ser registrada no Encontro Mundial das Famílias deste ano.
Como foi amplamente divulgado, todos os grupos pró-LGBT que solicitaram um estande na sala de exposições do Encontro Mundial de Famílias foram rejeitados. A maioria não recebeu sequer a dignidade de ser informada de que foi rejeitada. Eles simplesmente não receberam uma resposta dos organizadores do congresso.
Quando a Global Network of Rainbow Catholics (Rede Global de Católicos Arco-Íris, em tradução livre), ou GNRC, pressionou por uma resposta do Encontro Mundial das Famílias, eles acabaram sendo informados que lhes foi negado um estande por causa de "incertezas sobre a quantidade de espaço que teremos disponível para exposições por causa de outras considerações logísticas".
Em minhas caminhadas pelo salão de exposições, notei muitas tendas vazias. Frank DeBernardo, do New Ways Ministry, também notou e postou fotos dos espaços vagos na manhã de quarta-feira.
Deve-se notar também que organizações que não tinham nada a ver com o ministério católico receberam um amplo espaço, incluindo uma sala inteira dedicada a empresas de tecnologia (algumas das quais nem se deram ao trabalho de aparecer), bem como empresas singulares como a Big Boy Bean Bag, especializada em pufes de luxo. Ideal para relaxar na sua próxima reunião do conselho paroquial?
Na tarde de quarta-feira, quando as primeiras sessões do Encontro Mundial das Famílias foram encerradas na Royal Dublin Society (ou, como é conhecido em Dublin, RDS), uma nova campanha chamada Equal Future 2018 (Futuro Igualitário 2018, em tradução livre) organizou uma coletiva de imprensa em um pub do outro lado da rua.
Chamando-se "a maior iniciativa global de grupos LGBT e grupos religiosos de todos os tempos", o Equal Future 2018 é um movimento para "aumentar a conscientização sobre os danos causados às crianças quando elas crescem sentindo que ser LGBT é errado".
O catalisador deste novo projeto é o próximo Sínodo dos Bispos da Igreja Católica sobre os jovens, a fé e o discernimento vocacional que será realizado em Roma na primeira semana de outubro.
"O sínodo dos jovens é um momento único em uma geração para que possamos esclarecer a maneira que o estigma contra as pessoas LGBT, em suas várias formas, afeta a saúde mental das crianças e jovens", disse Tiernan Brady, porta-voz da campanha.
"É importante que a igreja olhe para isso como parte de seu desejo declarado de considerar as situações em que os jovens enfrentam a exclusão por razões sociais ou religiosas", acrescentou. "O sínodo terá um profundo impacto sobre os jovens de todo o mundo nas próximas décadas".
A Equal Future criou um site que permitirá que as pessoas contem suas histórias diretamente ao delegado designado de sua região no sínodo. Eles poderão compartilhar cartas, bem como gravações de voz e vídeo.
Juntando-se a Brady na conferência de imprensa estiveram três membros adultos jovens da comunidade LGBT, Xorje Olivares, que cresceu ao longo da fronteira Texas-México, Emily Dever, recém-formada pela Marquette University, cuja irmã é transgênero e cujo pai é um diácono católico solidário, e Carlos Velaquez, que cresceu na Venezuela, mas foi forçado a se mudar para a Irlanda por causa de sua identidade LGBT.
Outro jovem adulto da China, que usou o pseudônimo Eros Shaw, apareceu por meio de uma gravação de voz, temendo que ele pudesse enfrentar severas repercussões legais em sua terra natal se tivesse filmado sua declaração.
Ursula Halligan, ex-editora política da TV3, principal estação de TV independente da Irlanda, concluiu a conferência de imprensa contando a sua própria participação durante o referendo irlandês sobre igualdade matrimonial em 2015. Ela apelou aos padres LGBT que estão levando vidas duplas para que saiam do armário.
"Não apenas vocês se libertarão, mas também empoderarão os gays para que vivam livremente", disse ela.
Halligan continuou sua campanha na quinta-feira organizando um coral LGBT para cantar do lado de fora dos portões do Encontro Mundial das Famílias. O grupo, que vestiu camisetas que diziam "Hear Our Voices" (Ouçam nossas vozes, em tradução livre), tocou duas músicas, "Something So Strong Inside", um hino antiapartheid, e "We Are Family", do grupo Sister Sledge. Os participantes levantaram bandeiras de orgulho gay e orgulho trans ao longo dos portões da RDS, que voavam logo abaixo das bandeiras oficiais do Encontro Mundial das Famílias.
O coro foi quase superado em número por um grande contingente de imprensa religiosa e secular, que bloqueava uma faixa de tráfego em seu impulso ansioso para capturar a cena.
Antes que o coro chegasse, houve uma tempestade violenta que durou alguns minutos. Encontrei abrigo dentro do RDS e assisti ativistas enfrentando a natureza e hasteando suas bandeiras. Uma jovem de cabelos curtos da Europa Oriental estava ao meu lado, observando a cena. Ela foi uma das muitas pessoas jovens que notei naquele dia que decidiram se enrolar em grandes bandeiras da Cidade do Vaticano, usando-as como uma espécie de capa.
Ela se voltou para as amigas, que eram significativamente mais velhas do que ela, e disse que queria que os ativistas soubessem que eram bem-vindos.
"Eu vou ficar do lado deles", disse ela. Embora seu grupo a apoiasse, ela saiu sozinha. Ela permaneceu dentro dos portões do RDS observando as bandeiras do orgulho balançando ao vento enquanto os céus começavam a clarear. Ela parou por pelo menos um minuto, olhando através das altas cercas de ferro enquanto a mídia e o coral se reuniam, com a bandeira do Vaticano agora enrolada na cintura. Sem uma palavra, ela recuou lentamente para dentro do salão do EMF. Eu não a vi novamente.
No entanto, nem todos os eventos com temas LGBT foram realizados fora dos muros do Encontro Mundial das Famílias.
Na noite de quarta-feira, cerca de cinquenta participantes do Encontro Mundial de Famílias compareceram à apresentação do padre jesuíta Dominic Robinson sobre a Iniciativa Pastoral LGBT de Westminster em Londres.
O evento poderia ter tido um melhor comparecimento se não estivesse misteriosamente ausente do cronograma oficial do Encontro Mundial das Famílias, ou se a sua localização não tivesse sido movida no último minuto, trocando de local com a apresentação sobre a situação das famílias católicas na Rússia.
O programa também contou com depoimentos de dois homens gays (Nick O'Shea, que apareceu em pessoa, e um segundo paroquiano que apareceu via vídeo) que são membros da comunidade. Eles descreveram como foram acolhidos na paróquia jesuíta em 2013 e as formas pelas quais se integraram na vida litúrgica, espiritual e pastoral da igreja. Provavelmente foi a primeira vez na história do EMF que um homem abertamente gay (O'Shea) falou sem se declarar celibatário.
Um evento que não escapou à atenção foi a apresentação do padre jesuíta James Martin na manhã de quinta-feira: "Showing Welcome and Respect in our Parishes for 'LGBT' People and their Families" ("Mostrando receptividade e respeito por pessoas LGBT e suas famílias nas nossas paróquias", em tradução livre). (Essas citações em torno dos LGBT foram um editorial adicional de última hora, disse Frank DeBernardo. Sua extensa cobertura da palestra de Martin pode ser encontrada aqui.
Como foi amplamente divulgado na Irlanda e no Reino Unido, a apresentação de Martin foi repudiada por um grupo chamado American Society for the Defense of Tradition, Family and Property (Sociedade Americana para a Defesa da Tradição, da Família e da Propriedade, em tradução livre). A organização - que criou uma seção irlandesa no mês passado - afirma ter coletado mais de 16.000 assinaturas se opondo à apresentação de Martin, embora esta repórter ainda não tenha conseguido encontrar nenhum registro dos nomes dos signatários desta petição online.
O evento foi realizado no ponto mais afastado dentro do complexo da RDS, a cerca de 15 minutos a pé das portas de entrada. No final, mais de 1.000 pessoas fizeram a caminhada para ouvir Martin andando sobre uma linha tênue entre explicar como acolher e não causar danos às pessoas LGBT, mas sem realmente criticar o ensinamento da igreja que é a fonte de todo esse dano.
Se houve algum manifestante no evento de Martin, nenhum se fez notar. As únicas reclamações que ouvi vieram de uma fila de padres que tiveram sua entrada recusada devido a restrições de código de incêndio. Meu passe de imprensa permitiu que eu cortasse a fila de padres e fosse autorizada a entrar com um sorriso das mulheres que estavam bloqueando a entrada dos clérigos. O primeiro padre na fila bufou indignado. Pela primeira vez em minha vida, experimentei um privilégio negado a um homem em trajes clericais. Não tenho vergonha de dizer que apreciei o momento.
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Os LGBTs no Encontro Mundial das Famílias - Instituto Humanitas Unisinos - IHU