A imagem de Maria Madalena mais conhecida no mundo é a da prostituta. Mas não há nada que diga isso nos evangelhos, e a Igreja Católica finalmente lhe dedicou um dia, declarando-a “apóstolo para os apóstolos”, em 2016. A Maria Madalena prostituta teria sido uma criação do papa Gregório, no século 7.º.
É dessa premissa que parte Maria Madalena, que estreia nesta quinta-feira, dia 15, primeiro filme sobre a misteriosa figura, dirigido por Garth Davis (Lion – Uma Jornada para Casa, indicado para seis Oscar).
O diretor australiano disse não temer a polêmica. “Acho mais controverso que a história não tenha sido contada até hoje. Vai haver controvérsia, claro. Mas só posso ter confiança de que uma celebração de amor e perdão vale a pena.”
A entrevista é de Mariane Morisawa, publicada por O Estado de S. Paulo. 14-03-2018.
Tanto Rooney Mara, que interpreta o papel-título, quanto Joaquin Phoenix, que faz Jesus Cristo, afirmaram ter hesitado em aceitar a tarefa. “Fiquei com muito medo”, contou a atriz. “Pensei: ‘Meu Deus, será que realmente quero fazer isso?’. Mas tinha muita vontade de trabalhar com Garth novamente e sabia que ele faria um filme bonito, íntegro, autêntico e verdadeiro.”
Joaquin Phoenix começou a ler o roteiro, desistiu e, sob insistência do seu agente, resolveu tentar de novo. “Achei muito emocionante e percebi algo que não tinha notado da primeira vez. Era uma nova perspectiva sobre esse movimento que não tinha sido explorada, e isso me pareceu interessante. Conversei com Garth Davis, ele falou sobre projeção astral e decidi que tinha de trabalhar com ele. Não sei explicar por quê.”
Mara, que foi criada católica, mas hoje não segue a religião, ficou surpresa ao saber que Maria Madalena não era prostituta como sempre lhe ensinaram. “Para mim é chocante. Maria foi parte essencial dessa jornada, foi escolhida para ser testemunha de Jesus. Estava lá quando ele foi crucificado, estava lá quando ressuscitou, e ainda assim é conhecida como prostituta, enquanto há igrejas no mundo todo com o nome de Pedro, Paulo e outros discípulos. As pessoas rezam para eles todos os dias, e Maria é uma p...”
Para contar essa história sobre a qual se sabe tão pouco, foram consultados padres, pastores e rabinos, além de pesquisadores de todas as religiões. Davis tinha como objetivo criar um mundo que parecesse o nosso. “Queria que as pessoas se identificassem com os personagens, que eles fossem humanos e não estivessem afastados de nós”, disse. Grande inspiração foi Malala Yousafzai, que foi atacada pelo Taleban por defender o direito de meninas como ela de ir à escola no Paquistão e que venceu o Nobel da Paz por sua luta. “Ela mostra como nossa atitude deveria ser na vida”, disse o diretor. “Malala perdoou o Taleban, o que achei incrível. Agradeceu a seu pai por tratá-la como pessoa e não como mulher ou filha. Ela fala em respeitar os outros como seres humanos, o que é muito corajoso. Achei o mesmo amor e respeito no roteiro, que para mim pareceu muito contemporâneo e atual.”
Por isso, para Rooney Mara, não é preciso ser religioso ou mesmo acreditar em Deus para apreciar Maria Madalena. “Fiquei preocupada, mas um ateu me disse que amou”, disse a atriz. “Eu não sou mais católica, mas respeito quem é e respeito que seja importante para outros. Me considero uma pessoa espiritual e acredito que não é preciso nem ser espiritual para tirar algo do filme.”
Eis a entrevista.
O filme contrapõe a visão de que uma revolução vai trazer à Terra o reino do céu e a de que o reino do céu está em cada um. Acredita em qual versão?
Na última. Muitas vezes, nas práticas religiosas ou espirituais, colocamos o esforço no lugar errado. O que vai acontecer no futuro, a ideia de ir para o céu ou encontrar iluminação. Vou me retirar por 5 anos, meditar e só depois serei iluminado. A verdade é que a cada momento de cada dia se tem a oportunidade. Ser iluminado é estar disposto a trabalhar na sua vida e tentar ser a pessoa mais amável e atenciosa possível. Não se trata de ficar zen e daí você consegue flutuar.
Como ator, você é capaz de atingir milhões de pessoas. É algo poderoso poder compartilhar esperança com o mundo. O que pensa disso?
Às vezes, quero dizer algo para as pessoas, mas outras é apenas uma jornada pessoal para mim. Eu não gosto muito dos filmes que ficam pregando sua mensagem. Normalmente, sigo minha inspiração e escolho algo que me emociona, esperando que outras pessoas também sejam afetadas. Mas não estou na posição de dizer a ninguém como viver sua vida. Não é meu papel ensinar nada. Mas tenho essas experiências, coisas que me interessam, e espero que elas inspirem outros a ver de maneira diferente algo que achavam saber ou conhecer.
Então, não tem a intenção de ser um profeta como aquele que interpreta no filme?