07 Novembro 2017
“Tem-se a impressão de que nessa nossa Igreja há pessoas importantes que se importam mais com a fidelidade ao Dogma, ao Direito e à Liturgia do que com a fidelidade ao Evangelho e ao ‘seguimento’ de Jesus”. A reflexão é de José María Castillo, teólogo espanhol, em artigo publicado por Religión Digital, 05-11-2017. A tradução é de André Langer.
Não é nenhum segredo que, na Igreja e fora dela, há pessoas que não suportam o Papa Francisco. Eu insisto que não se trata simplesmente de pessoas que não concordam com o que este papa faz e diz. Não é só isso. É que, além disso, eu falo de pessoas e grupos que rejeitam o Papa Bergoglio e dão a impressão de que eles não suportam o modelo de papado que ele representa.
A coisa mais estranha, neste desagradável assunto, é que estamos diante de um fenômeno que, em grande parte, é novo na Igreja. Pelo menos, do Iluminismo até hoje. É verdade que já no pontificado de João XXIII observaram-se alguns sintomas que apontavam nessa direção. Os grupos mais conservadores dessa época não concordavam com o Papa Roncalli em questões de certa importância.
Mas o que está acontecendo com o atual papa é diferente. Não só pelo fato de haver aqueles que se atrevem a dizer que Francisco é um "herege", mas por causa de algo que, na minha opinião, é mais significativo. Trata-se de que um grupo notável de personalidades do mundo eclesiástico é contra o papa, enquanto enormes massas do povo simples, mesmo entre pessoas que não são crentes, são aquelas que aclamam entusiasticamente este papa. O papa dos pobres, dos doentes e das crianças, dos idosos e dos ignorantes. O papa inclusive que seduz as pessoas sem crenças religiosas ou que pertencem a culturas, que têm pouco ou nada a ver com o catolicismo.
Qual é a explicação para isso? Por que aqueles que deveriam estar mais perto do papa são (muitos deles) contra ele? Como se pode explicar que as grandes massas, que durante séculos viveram longe do papado ou mesmo de costas para ele, são agora aquelas que mais apreciam e sintonizam com a figura papal e sua maneira de relacionar-se com as pessoas?
Se esses fatos forem pensados sem pressa, a resposta mais razoável para este assunto faz pensar. Por uma razão muito simples. O que faz pensar é que o Papa Francisco (e seu modo de viver e relacionar-se com as pessoas) nos leva a pensar ou suspeitar que a Igreja está mais longe do Evangelho do que poderíamos imaginar. Ou, dito com maior precisão: tem-se a impressão de que nessa nossa Igreja há pessoas importantes que se importam mais com a fidelidade ao Dogma, ao Direito e à Liturgia do que com a fidelidade ao Evangelho e ao "seguimento" de Jesus.
Basta pensar nestes dois fatos:
1º. O Papa Francisco é acolhido com entusiasmo pelas mesmas pessoas que acolhiam e seguiam Jesus: doentes, pobres, crianças, pessoas marginalizadas ou pessoas de conduta duvidosa.
2º. O Papa Francisco encontra resistência em grupos religiosos equivalentes aos que rejeitaram e perseguiram Jesus. Jesus foi rejeitado pelos sacerdotes, letrados e fariseus.
Se o que acabei de dizer é verdade, não se poderia pensar que Jesus foi rejeitado pelos representantes mais qualificados da religião, ao passo que o seguiram aqueles que melhor expressam a dor do sofrimento humano?
Penso que esta pergunta está correta. Não seria conveniente aplicá-la também ao que estamos vivendo agora na Igreja, especialmente no papado de Francisco? Às vezes, penso que posso estar desorientado. Mas também suspeito que talvez tenhamos medo de enfrentar seriamente uma pergunta que nos assusta responder.
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“Não é nenhum segredo que na Igreja há pessoas que não suportam o Papa”. Artigo de José María Castillo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU