04 Agosto 2017
Ao lado dos senadores republicanos David Purdue, da Geórgia, e Tom Cotton, do Arkansas, o presidente Trump lançou seu apoio a um plano de imigração que acabaria com as políticas de reintegração familiar de longa data em prol de um sistema "meritocrático" para quem souber falar bem inglês. A proposta também inclui um corte substancial na quantidade de imigrantes legais autorizados por ano nos Estados Unidos, visando reduzir a imigração legal dos atuais 1,1 milhão para cerca de meio milhão ao longo de 10 anos.
A reportagem é de Kevin Clarke, publicada na revista dos jesuítas norte-americanos América, 02-08-2017. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.
O presidente Trump disse que a medida causaria "redução da pobreza, aumento de salários e uma economia de bilhões de dólares para quem paga imposto". Ele afirmou que o sistema atual "não foi justo com o nosso povo, nossos cidadãos, nossos trabalhadores".
De acordo com o presidente, a proposta que ele está apoiando, que representa a primeira vez que a política de imigração dos EUA é reescrita de forma significativa desde a Lei de Imigração e Nacionalidade de 1965, favoreceria os candidatos "que sabem falar inglês, sustentam a si próprios e a suas famílias e demonstram habilidades que contribuirão com a nossa economia". Ele acrescentou que as propostas impedirão que os recém chegados ao país venham para obter bem-estar para eles próprios e rapidamente levaria a novas oportunidades de emprego para cidadãos americanos não qualificados.
J. Kevin Appleby, diretor de políticas de migração internacional do Centro de Estudos e Migração e da Scalabrini International Migration Network, não ficou surpreso com a apresentação do presidente. "Tudo isso é parte de sua agenda nativista", disse ele.
"O padrão é claro: deportar latinos, impedir a entrada de muçulmanos e agora este projeto de lei impediria a entrada de asiáticos e africanos no país". Appleby explicou que, nas últimas décadas, em uma tentativa de corrigir a discriminação do passado, a quantidade de imigrações advindas da Ásia aumentou significativamente sob as políticas de reintegração familiar em vigor, e os africanos que têm Green Card foram os que mais se beneficiaram da loteria que distribui 50.000 vistos por ano para residentes de países que não têm um número expressivo de imigrantes para os Estados Unidos.
"Eles estão tentando criar um sistema de imigração à sua própria imagem. Fica fácil entender que basicamente eles querem um sistema que favoreça os que são mais qualificados e mais europeus", disse ele. Não se sabe quantos europeus ocidentais com altas habilidades em língua inglesa realmente querem imigrar para os Estados Unidos, apontou Appleby.
O projeto Reforma da Imigração Americana para uma Empregabilidade Forte (Reforming American Immigration for Strong Employment - Raise Act) acabaria com a preferência de green cards para pais adultos, irmãos ou filhos de cidadãos estadunidenses, mantendo-a apenas para cônjuges e filhos menores. Também eliminaria a loteria de vistos diversos e limitaria o número de refugiados com residência permanente no país em 50 mil por ano. As quotas de refugiados são alocadas anualmente, mas historicamente corriam na casa de 70.000 por ano, chegando a 230 mil nas últimas décadas.
"Basicamente, o projeto de lei desmantelaria a imigração em família, que tem sido a pedra angular do nosso sistema ao longo de gerações e tem sido benéfica ao nosso país", declarou. "As famílias são atores econômicos, fortalecem a coesão social das comunidades de imigrantes e protegem os membros da [necessidade de] assistência governamental." Ele acrescentou que as conexões familiares também agem para proteger as pessoas fugindo da perseguição em seus países de origem.
"Se aliarmos essa questão à redução no programa de refugiados e os objetivos declarados do [presidente] de sua remoção rápida de todo o país, basicamente não há regime algum de proteção dos EUA [para refugiados]", acrescentou.
Em uma declaração emitida em nome da Conferência dos Bispos Católicos dos Estados Unidos nesta tarde, o Reverendo Joe Vásquez, bispo de Austin e presidente do Comitê de Migração dos Bispos, expressou "forte oposição" ao projeto, insistindo para que o Senado rejeite a lei e, em vez disso, retome as negociações de um pacote de reforma imigratória abrangente.
"Se essa legislação discriminatória estivesse em vigor gerações atrás", disse ele, "muitas pessoas que construíram e defenderam esse país estariam excluídas".
Dom Vásquez disse que o projeto significaria que os Estados Unidos estavam dando as costas para pessoas que estariam "se preparando para construir uma vida melhor".
"Como Igreja", disse o bispo Vásquez, "acreditamos que quanto mais fortes os laços de família, mais chances tem a pessoa de ter sucesso na vida. O Raise Act impõe uma definição de família que enfraqueceria esses laços." Ele ainda acrescentou que a medida prejudicaria a capacidade da nação de responder às pessoas em crise.
Se parte do objetivo do plano era reduzir a imigração ilegal para os Estados Unidos, Appleby tem convicção de que as novas propostas teriam o efeito contrário. O baixo desemprego e a demanda por mão-de-obra não qualificada do país apenas continuarão sendo um ímã para a migração, argumenta ele. "Ao cortar a imigração legal, as pessoas não terão outro recurso" a não ser tentar entrar nos Estados Unidos ilegalmente.
"A reintegração familiar tem sido um dos princípios da política de imigração dos EUA há muito tempo", disse Patricia Zapor, diretora de comunicação da Catholic Legal Immigration Network Inc., ou CLINIC, ao América por e-mail. "Sim, o sistema de imigração precisa ser revisto. Mas isso não deve acontecer sacrificando o princípio básico estadunidense e humanitário de que as famílias devem ficar unidas. As famílias já ficam muitos anos esperando para se reunirem no sistema atual. Tornar isso ainda mais difícil não representa quem nós somos como estadunidenses."
Mesmo com o apoio do presidente, o Raise Act enfrenta um futuro duvidoso no Congresso. A proposta foi amplamente ignorada no Senado desde seu lançamento, em fevereiro. O apoio de Trump daria impulso legislativo ao plano, mas até agora nenhum outro legislador assinou a proposta em Washington e líderes republicanos não demonstraram pré-disposição alguma para votar a respeito de imigração este ano.
Alguns defensores de imigrantes e empresários criticaram a proposta, dizendo que cortar a imigração legal prejudicaria a economia e indústrias como a agricultura.
"Nosso sistema está quebrado, mas a resposta é a modernização, e não a destruição a marteladas", disse Jeremy Robbins, diretor executivo da New American Economy, um grupo de líderes empresariais, prefeitos e outros, apoiados pelo ex-prefeito de Nova York, Michael Bloomberg, que defende uma reforma da imigração abrangente, à Associated Press.
Appleby também acredita que o momento, do ponto de vista econômico e demográfico, é completamente inapropriado para essa proposta.
"Vai de encontro às tendências atuais", disse ele. "Estamos em taxa de reposição de natalidade [nativa]; nossa população está envelhecendo. Haverá espaços para mão-de-obra [pouco qualificadas] logo à frente. Chegará um ponto em que vamos querer trabalhadores imigrantes.
Caso o plano seja implementado, segundo Appleby, haverá um "enorme custo social".
"Temos a economia mais diversificada e robusta do mundo, que necessita de todos os níveis de habilidades", disse ele.
E o corte a políticas de reintegração familiar, acusou, "levará a outra geração de crianças estadunidenses separadas de seus pais, o que ataca a unidade familiar, que é o que mantém a sociedade unida".
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Trump apoia plano para restringir drasticamente a imigração legal - Instituto Humanitas Unisinos - IHU