25 Abril 2017
"Em certo sentido, pode-se argumentar que o Papa Francisco está protegendo os ativistas e outros líderes cristãos para que eles possam se posicionar de maneira tão barulhenta e agressiva quanto quiserem, porque ninguém pode dizer que está acontecendo uma espécie de cruzada militante cristã se o Papa estiver à frente. Francisco deixa claro que o desejo da Igreja não é a conquista, mas o relacionamento – em suas palavras, agora familiares, construir pontes e não muros", escreve John L. Allen Jr, jornalista, em acrtigo publicado por Crux, 21-04-2017. A Tradução é de Luísa Flores Somavilla.
Eis o artigo.
A maioria dos ativistas na luta contra a perseguição global anticristã tende a ficar na ofensiva, desafiar os acusados, exigir sanções e, em geral, não levar desaforo para casa. O Papa Francisco parece preferir o reforço positivo a punições, mas é possível ver esse contraste como uma abordagem integrativa - por atingir as pessoas tão incessantemente, Francisco pode estar dando a chance de fazer resistência.
Que há uma onda crescente de perseguições anticristãs em todo o mundo no início do século XXI é fato empírico. Os cristãos não são os únicos que enfrentam ameaças, é claro, mas devido à quantidade e a suas zonas de maior crescimento, quantitativamente eles tendem a estar mais expostos do que praticamente qualquer outra minoria.
Em janeiro, a Missão Portas Abertas, uma organização não denominacional em favor dos cristãos perseguidos, lançou a Lista Mundial da Perseguição do ano. Mais uma vez, descobriu-se que mais de 200 milhões de cristãos enfrentam perseguição alta, muito alta ou extrema.
A questão não é se a perseguição anticristã é real, mas o que fazer a respeito e, nesse sentido, pessoas de bem não só podem como, de fato, discordam.
Uma ideia amplamente difundida entre a comunidade ativista é partir para a ofensiva - insistir em punições para os países infratores, denunciar os que arquitetaram a perseguição, apoiar fortes medidas militares e de segurança contra grupos terroristas e militantes cujos alvos são os cristãos e exigir que quando a fonte da perseguição for religiosa os líderes dessa religião intervenham.
Para dar um exemplo concreto, muitos ativistas gostariam que os Estados Unidos e outras nações ocidentais impusessem sanções a países como a China e a Índia, que têm um histórico duvidoso sobre a liberdade religiosa em geral e particularmente com suas minorias cristãs.
Os ativistas também insistem que tanto os governos ocidentais como os líderes religiosos ocidentais sejam mais duros com os líderes muçulmanos, insistindo que eles se posicionem em defesa dos cristãos, especialmente no Oriente Médio, e façam muito mais para promover um clima de tolerância - rejeitando os livros didáticos que fomentem o preconceito anticristão, por exemplo, eliminando leis de blasfêmia e exercendo uma vigilância mais rigorosa sobre a retórica usada em mesquitas e madrasas.
Diante do terrível sofrimento dos cristãos em muitas partes do mundo, muitas vezes exacerbado pela indiferença ou pura conivência por parte do governo e dos líderes religiosos, esses pedidos parecem muito razoáveis.
Outros, no entanto, estão igualmente preocupados com a liberdade religiosa e o bem-estar dos cristãos, mas preferem a abordagem do reforço positivo à da punição.
A resposta certa ao confronto, segundo eles, não é mais a confrontação, mas sim o diálogo. O segredo é abordar partidos responsáveis, construir relacionamentos e trabalhar para eliminar os equívocos e preconceitos que muitas vezes conduzem a perseguição.
Eles temem que a retórica da raiva e as medidas punitivas podem piorar as coisas, e que a única estratégia em longo prazo é a amizade. Sentem que quando atingirem a amizade, "demandas" em prol dos direitos cristãos vão parecer mais com gestos naturais entre amigos.
Tudo isso nos leva ao Papa Francisco, que está muito mais na área dos reforços positivos na luta contra a perseguição anticristã.
Certamente ninguém pode acusar o pontífice de falta de preocupação, pois o sofrimento cristão tornou-se o fundamento de seu discurso. Em dezembro passado, na festa de São Estevão, o mártir original do cristianismo, Francisco falou de modo caracteristicamente dramático.
"Também hoje a Igreja, para dar testemunho da luz da verdade, experimenta em diversos lugares duras perseguições, até a suprema prova do martírio", disse Francisco. "Quantos de nossos irmãos e irmãs na fé sofrem abusos, violências e são odiados por causa de Jesus!
“Digo-lhes uma coisa”, disse o Papa. "Há muito mais mártires hoje do que nos primeiros séculos. Quando lemos a história dos primeiros séculos, aqui, em Roma, lemos tanta crueldade com os cristãos. Hoje existe a mesma crueldade, em números ainda maiores".
No sábado, o Papa Francisco estará na Igreja de São Bartolomeu na Ilha do Tibre, em Roma, para visitar seu memorial aos mártires cristãos contemporâneos, em mais uma tentativa de garantir que seu legado e sacrifício não sejam esquecidos.
No entanto, Francisco geralmente evita conflitos em sua abordagem à questão - preferindo, em relação ao Islã, por exemplo, elogiá-lo como uma "religião de paz" e negar que exista um "terrorismo islâmico", ao invés de atacar o fato de os líderes muçulmanos não manterem a segurança dos cristãos.
Essa discrição muitas vezes leva algumas pessoas, incluindo algumas vítimas da opressão anticristã, a se distraírem. Recordo-me vividamente de sentar com um grupo de bispos católicos do Oriente Médio em agosto passado, pouco depois da fala de
Francisco sobre a "religião da paz" no voo papal, retornando da Jornada Mundial da Juventude na Polônia, e de ter perguntado o que achavam.
O que mais ouvi, para ser franco, não pode ser reproduzido aqui, mas digamos que não foi totalmente favorável.
No entanto, o catolicismo não é uma tradição do 'ou isso, ou aquilo', mas sim de 'isso e também aquilo'. Nessa perspectiva, é possível ver o contraste entre falcões e pombas em relação à perseguição anticristã não como algo contraditório, mas sim complementar.
Em certo sentido, pode-se argumentar que o Papa Francisco está protegendo os ativistas e outros líderes cristãos para que eles possam se posicionar de maneira tão barulhenta e agressiva quanto quiserem, porque ninguém pode dizer que está acontecendo uma espécie de cruzada militante cristã se o Papa estiver à frente. Francisco deixa claro que o desejo da Igreja não é a conquista, mas o relacionamento – em suas palavras, agora familiares, construir pontes e não muros.
Sem dúvida, esse será o espírito de sua viagem para o Egito no próximo fim de semana, cujo ponto alto deve ser um discurso em uma conferência sobre a paz em Al-Azhar, o centro mais importante de ensino no mundo muçulmano sunita, na companhia tanto do Patriarca Bartolomeu de Constantinopla quanto do Papa Tawadros II, líder da Igreja Ortodoxa Copta do Egito.
Certamente, também, o clima de convivência que provavelmente veremos no Cairo irritará alguns, que gostariam de ver Francisco usar essa plataforma para atacar o establishment clerical islâmico no Egito por não fazer mais para combater o preconceito anticristão.
Outra maneira de olhar para isso, no entanto, é que todos estão mais livres para fazer resistências devido ao Papa Francisco estar tão ocupado estendendo a mão.
Em qualquer caso, não parece provável que o Papa Francisco mude de rumo. Portanto, os envolvidos com a causa da defesa dos cristãos que estão sofrendo têm uma escolha a fazer - ou abraçar a campanha de construção de pontes do pontífice ou frustar-se com essa campanha por um período significativo. Fica difícil não pensar que a primeira seja a escolha mais construtiva.
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Francisco lança mão de abordagem integrativa para combater a perseguição anticristã - Instituto Humanitas Unisinos - IHU