Por: Ricardo Machado | 25 Novembro 2016
Dentro da difícil tarefa de compreender o Brasil contemporâneo, saber o que são as poltícias públicas e qual a importância da participação da sociedade nos processos de construção de cidadania se tornou uma necessidade mais que urgente, sobretudo levando em conta as investidas contra direitos garantidos na Constituição de 1988. Para discutir esse tema, o Instituto Humanitas Unisinos – IHU recebeu na tarde da quinta-feira, 24-11-2016, a professora pesquisadora Monika Weronika Dowbor que apresentou a conferência Políticas Públicas e o protagonismo da sociedade civil. O Evento marcou a última edição do IHU Ideias em 2016.
Ao analisar a participação social nas políticas públicas, a professora assevera. “A influência política depende diretamente de educação e nível de renda. Isso parece além de óbvio é comprovado por inúmeras pesquisas. As políticas públicas sempre têm cara de homem branco, de renda alta e morador do Sul/Sudeste. Se a voz de negros, pobres e mulheres não aparecem nas políticas públicas, elas nunca vão refletir os anseios dessa população. O desafio é inserir essas pessoas no protagonismo da sociedade civil”, avalia Monika.
Embora a ideia de política pública seja um termo de amplo alcance social, nem sempre, sua compreensão é absolutamente clara. “O cenrne da ideia de política pública é a da soma das atividades dos governos, que agem diretamente ou através de delegação, e que influenciam a vida dos cidadãos”, pontua a professora. “A política pública pode ser uma ação de governo ou uma política de Estado. O Sistema Único de Saúde - SUS, por exemplo, ainda permanece sendo uma política de Estado, porque trata-se de uma política garantida constitucionalmente”, demonstra.
Diferentemente dos modelos clássicos de análise, em que havia uma separação mais clara dos principios operadores do Mercado (lucro), do Estado (burocracia) e da sociedade (em termos ideais, solidariedade), a vida social contemporânea convive com o borramento total dessas fronteiras. “Essas esferas se interpenetram e com o neoliberalismo essa interseção foi mais forte, sobretudo porque o Estado passou a incorporar o princípio de competição, em que deve ser aferido pelo princípio da eficiência e agilidade. É nesse contexto, também, que a sociedade civil passa a operar na dinâmica das competições e por isso que as ONGs passam a competir umas com as outras, as mesmas que antes, em 1988, estavam juntas, mas não competem por lucro e sim por sobrevivência”, contextualiza.
Basicamente, as políticas públicas são construídas, conforme explica Monika, por cinco etapas: formulação de agenda do governo, identificacao das alternativas, decisão política, implementacao, avaliação e monitoramento. Para a pesquisadora, a construção de políticas públicas são determinadas, também, por dois fatores que estão relacionados aos aspectos técnicos de realização das ações e à visão de mundo aplicada à análise da realidade.
“Nem todas as questões sociais entram na agenda de governo. Vejam, temos milhares de problemas sociais que jamais ficam à luz das politicas do governo. Pensem, por exemplo, na questão quilombola que na década de 1980 jamais passava pela cabeça de alguém do governo. O casamento homoafetivo também”, analisa. “Atualmente o genocídio da população jovem e negra é uma questão social, mas não está na agenda dos governos. Isso porque esta agenda é restrita, ela tem limites”, sublinha.
Monika Dowbor em conferência na Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros - IHU (Foto: Ricardo Machado/IHU)
Há uma distinção importante a ser feita, distinção esta que muda radicalmente a maneira de encarar os problema sociais, trata-se de diferenciar a ideia de sociedade e sociedade civil organizada. “É preciso abandonar a ideia simples de sociedade, que consiste em um conjunto de cidadãos em que cada um leva sua vida, e pensar na sociedade civil organizada, que está acima simples sociedade e abaixo do Estado. Estas organizações podem ser ONGs, movimentos sociais, os próprios partidos etc. São estes os atores que podem influenciar a agenda das políticas públicas", considera.
As maneiras de pressionar os governos e o Estado a produzirem políticas públicas ocorrem de duas formas. “As manifestações de rua, as ocupações, as passeatas são formas de protestos capazes de mobilizar agendas das políticas públicas. O ano de 2013 nos lembrou que podemos ir às ruas e as ocupações são o fenômeno mais recente. É preciso mobilização”, sugere. “Outra maneira é por meio da ocupação de cargos. Por exemplo, um ativista social que passa a fazer parte do Estado. Ele não se torna exatamente um burocrata, mas um ativista institucional. É evidente que haverá constrangimentos legais, estatais, econômicos, mas mesmo assim é possível implementar uma série de ações que tenham a ver com as demandas sociais”, complementa.
O ponto central, sustenta Monika, é fugir da análise simplista dividindo os ativistas entre os cooptados e os não cooptados. “A questão é muito mais complexa porque a pesquisa empírica com ativistas institucionais mostra que uma série de políticas alinhadas com a sociedade civil são implementadas. O fato concreto é que demandas que nunca entraram na agenda do Estado passam a fazer parte, mesmo com os constrangimentos. É importante não ter um pensamento normativo a priori, é preciso investigar”, finaliza.
Possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (1999), mestrado em Sociologia pela USP (2006) e doutorado em Ciência Política pela mesma universidade (2012). Foi pós doutoranda do Centro de Estudos da Metrópole (2014-2015). Atualmente é docente do Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da Universidade do Vale do Rio dos Sinos e pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento. Desenvolve pesquisas no âmbito de ciência política e sociologia política, e, mais especificamente, nas Teorias de Movimentos Sociais e abordagens de políticas públicas.
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A permanente necessidade de participação social na construção de políticas públicas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU